segunda-feira, 1 de março de 2010

JUSTA CAUSA - DESÍDIA - FALTAS INJUSTIFICADAS - VOTO DO RELATOR

PROCESSO TRT/SP nº 00094.2007.065.02.00-6

RECURSO ORDINÁRIO DA 65ª VARA DO TRABALHO DE SÃO PAULO

RECORRENTE : FÁBIO JÚNIOR DE SOUZA LISTA

RECORRIDO : BAR E RESTAURANTE MRB LTDA.



Ementa: JUSTA CAUSA. DESÍDIA COMPROVADA. REINCIDÊNCIA DE FALTAS INJUSTIFICADAS. É sabido que a justa causa é a pena máxima aplicada ao empregado e deve estar claramente demonstrada. Conforme se verifica dos elementos constantes dos autos, admitir-se a dispensa injusta "in casu" é o mesmo que premiar o empregado negligente e incentivar o descaso para com o trabalho e as responsabilidades dele inerentes, ainda mais considerando a situação caótica de desemprego no nosso país. Mais do que comprovada a justa causa, restou confessado o comportamento desidioso do reclamante, pelo que torna-se forçoso o reconhecimento da mesma, mantendo-se o decidido em 1ª instância quanto a isso.

Da r. sentença de fls. 140/144, cujo relatório adoto e que concluiu pela IMPROCEDÊNCIA da reclamação, recorre o reclamante às fls. 146/153, postulando a sua reforma.

Insurge-se o reclamante contra a descaracterização da sua dispensa sem justa causa e conseqüente indeferimento do pedido de pagamento das respectivas verbas rescisórias. Afirma fazer jus ao pagamento de horas extras, inclusive as referentes à supressão do intervalo intrajornada e ao trabalho realizado aos domingos e feriados sem folga compensatória, adicional noturno e respectivos reflexos, bem como à observância da hora noturna reduzida. Por fim, requer o deferimento do pedido de pagamento de diferenças salariais pelo desvio de função, no período compreendido entre 01/09/2002 e 01/09/2004 e integrações em férias + 1/3, 13ºs salários, DSRs, horas extras, recolhimentos previdenciários, FGTS + 40% e verbas rescisórias.
Contra-razões apresentadas às fls. 157/161.


É o relatório.


V O T O




Presentes os pressupostos legais de admissibilidade, conheço do recurso.


Da dispensa sem justa causa


Sustenta o recorrente que jamais cometeu qualquer ilícito, sendo certo que suas faltas foram todas justificadas mediante os atestados médicos apresentados. Conclui que a justa causa aplicada pela reclamada decorreu de má-fé, na tentativa de furtar-se ao pagamento dos seus direitos.


Razão não assiste ao recorrente.


Na inicial, o reclamante informou que, em razão das funções que exercia, adentrava diversas vezes ao dia na câmara frigorífica, restando freqüentemente acometido de doenças que o obrigavam a faltar ao trabalho. Entretanto, aduziu que as justificativas médicas não eram aceitas pela reclamada, tudo a culminar com o recebimento indevido de advertências disciplinares e aplicação indevida de suspensão (fl. 05).


Em contestação, a reclamada explicou que, em 23 de novembro de 2004, em decorrência de faltas injustificadas ao trabalho, o reclamante foi dispensado por justa causa (fl. 34). Acrescentou que, antes disso, ele já havia sido advertido pelas ausências injustificadas ocorridas nos dias 04/05/2003, 29/02/2004 e 21/03/2004, mas, mesmo assim, ele teria voltado a faltar no período compreendido entre 23 a 26 de outubro de 2004. Destarte, por já ter sido advertido três vezes e ter reiterado o comportamento desidioso, a reclamada o suspendeu por três dias (29 a 31 de outubro de 2004). Por fim, informou que o autor voltou a faltar no dia 21 de novembro de 2004, sem apresentar qualquer justificativa, fato este que deu ensejo à dispensa por justa causa. Consigna que o reclamante nunca apresentou atestado médico para justificar tais ausências, sendo que foram procedidos os respectivos descontos salariais (fl. 40). Destacou, outrossim, que o autor jamais adentrava a câmara frigorífica (fl. 41).


Em seu depoimento, o reclamante negou ter apresentado atestado médico em todas as vezes que faltou ao trabalho. Ademais, a testemunha da reclamada declarou que o autor nunca apresentou atestados quando faltou (fl. 29).


Os registros de jornada colacionados às fls. 71 (doc. 58), 73 (docs. 67/68) e 75 (docs. 75/76) comprovam as ausências do reclamante ao trabalho, constando às fls. 56/59 as respectivas advertências e suspensão disciplinares. O Termo de Rescisão do Contrato de Trabalho e holerites juntados às fls. 61, 65 (doc. 29) e 67 (docs. 39/40) registram os descontos efetuados sobre o salário do autor atinentes às mencionadas faltas.


A decisão de 1º grau considerou o autor confesso, quando afirmou, em seu depoimento, que nem todas as faltas foram justificadas.


É sabido que a justa causa é a pena máxima aplicada ao empregado e deve estar claramente demonstrada.


Valentin Carrion, em sua obra Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho, Saraiva, 1997, p. 370 (nota 8), ao comentar o art. 482, letra "e" conceitua a desídia da seguinte maneira:


"8. Desídia (e). É falta culposa, e não dolosa, ligada à negligência; costuma-se caracterizar pela prática ou omissão de vários atos (comparecimento impontual, ausências, produção imperfeita); excepcionalmente poderá estar configurada em um só ato culposo muito grave; se doloso ou querido, pertencerá a outra das justas causa."


Maria Inês Moura S. A. da Cunha, em sua obra Direito do Trabalho, Saraiva, 1995, p. 100 na mesma linha de entendimento define desídia:


"A desídia traduz-se pela negligência, imprudência, ou imperícia no desempenho das funções. A jurisprudência indica um sem número de comportamentos que caracterizam a desídia, como as faltas injustificadas e reiteradas ao serviço, o descumprimento habitual das tarefas afetas ao emprego, a falta de atenção com reflexos na produção e na qualidade do serviço, etc."


Conforme se verifica dos elementos constantes dos autos, admitir-se a dispensa injusta "in casu" é o mesmo que premiar o empregado negligente e incentivar o descaso para com o trabalho e as responsabilidades dele inerentes, ainda mais considerando a situação caótica de desemprego no nosso país.


A jurisprudência aponta no mesmo sentido:


"Faltas injustificadas. Rescisão contratual. A reincidência de ausências ao trabalho injustificadas ocasiona dispensa justa, seja enquadrando o procedimento como desidioso, seja como indisciplinado. O elemento material de falta reside na irregularidade do trabalho e o elemento subjetivo evidencia-se no desinteresse pelo trabalho." Ac. TRT 2ª Reg. 7ª T (Proc. 26084/90-6), Rel Juíza Lucy Mary Marx Gonçalves da Cunha, DO/SP 09/12/92, Ementário de Jusrisprudência Trabalhista do TRT da 2ª Reg., Ano XXXVIII, nº 06/93.


Mais do que comprovada a justa causa restou confessado o comportamento desidioso do reclamante, pelo que torna-se forçoso o reconhecimento da mesma, mantendo-se o decidido em 1ª instância quanto a isso.


Das horas extras (inclusive as decorrentes da redução do intervalo intrajornada), adicional noturno e reflexos


Aduz o recorrente que sempre laborou em sobrejornada e em horário noturno, sem o correspondente pagamento e sem as devidas integrações, bem como, sem a observância da hora noturna reduzida. Afirma fazer jus ao pagamento de horas extras também pela supressão do intervalo intrajornada. Acrescenta que o artigo 9º da Lei nº 605/49 determina que os feriados e DSRs trabalhados sem folga compensatória, deverão ser pagos com adicional de 100% e reflexos nas demais verbas.


Razão não lhe assiste.


Na petição inicial, o reclamante alega que, no período compreendido entre julho de 2002 e agosto de 2004, trabalhou das 08:00 às 16:20 horas, de segunda-feira a domingo, com uma folga semanal e sem intervalo intrajornada, laborando, ainda, uma vez por semana, até as 23:00 horas. Acrescentou que, no período compreendido entre setembro e novembro de 2004, cumpriu a jornada das 08:40 às 17:00 horas, também de segunda-feira a domingo, com uma folga semanal, sem intervalo intrajornada, trabalhando uma vez por semana até as 23:00 horas. A despeito do trabalho em sobrejornada, alega que não foram pagas as respectivas horas extras e integrações, inclusive quanto ao intervalo suprimido, nem tão pouco adicional noturno, e que não era observada a hora noturna reduzida, inclusive (fls. 05/06).


Em contestação (fls. 36/42), a reclamada sustentou que o autor sempre laborou 44 horas semanais, sendo indevido o pagamento de horas extras e integrações, bem como, que o reclamante gozava de uma hora de intervalo intrajornada, que o adicional noturno foi devidamente quitado, observando-se a hora noturna reduzida.


Devo destacar que a testemunha da reclamada confirmou que havia o gozo de uma hora de intervalo intrajornada (fl. 30) e que nada comprovou o reclamante em sentido contrário, encargo que lhe competia.


Os demonstrativos de diferenças colacionados pelo reclamante às fls. 126/127 e 137/138, não consideram o gozo efetivo do intervalo para refeição e descanso e, embora acusem a sobrejornada além da 8ª hora diária, não observam a compensação de horários dentro da mesma semana (limite das 44 horas semanais), destacando-se, ainda, que não restou demonstrado o sobrelabor até as 23:00 horas, uma vez por semana, conforme alegado na exordial, nem tão pouco o trabalho em horário noturno e respectivas diferenças de pagamento do adicional correspondente ou inobservância do cômputo da hora noturna reduzida.


Considerada a jornada descrita na exordial, desde que computado o gozo do intervalo intrajornada de uma hora e a ausência de trabalho até as 23:00 horas uma vez por semana, conclui-se pela ocorrência da compensação de jornada dentro da mesma semana, conforme o permissivo constitucional, a afastar o deferimento do pleito de pagamento de horas extras, até porque não foram demonstradas diferenças a partir do cômputo dos critérios supramencionados, inclusive no que concerne ao pagamento de adicional noturno e inobservância da hora noturna reduzida.


Por fim, no que concerne ao argumento expendido em sede recurso, alusivo ao pagamento de horas extras pelo trabalho realizado em domingos e feriados, sem folga compensatória, constituem verdadeira inovação recursal, eis que ausente da petição inicial qualquer pedido formulado no mesmo sentido, pelo que resta prejudicada a análise do mesmo. Entretanto, ainda que assim não fosse, observa-se, também quanto a este tema, que nada foi demonstrado pelo reclamante.


Das diferenças salariais pelo desvio de função


Sustenta fazer jus ao pagamento de diferenças salariais decorrentes da equiparação com os demais copeiros, no período compreendido entre 01/09/2002 e 01/09/2004, o que decorreu, inicialmente, da substituição de funcionário que se encontrava em gozo de férias, sem que, posteriormente, houvesse retorno ao desempenho de suas funções habituais.


Razão não lhe assiste.


Na exordial, o reclamante afirma que, a partir de 01/09/2002, passou a exercer a função de copeiro, substituindo um funcionário que se encontrava em férias, mas não teve o salário reajustado e nem retornou às suas funções anteriores (serviços gerais) quando referido funcionário voltou à ativa, tendo sido promovido oficialmente ao cargo de copeiro somente em 01/09/2004 (fl. 05).


Em contestação, a empresa nega a pretensão do autor (fl. 34), o que foi corroborado pela sua testemunha, que refutou o fato de que o reclamante tivesse exercido as funções de copeiro antes da sua promoção oficial ao cargo, nem mesmo em substituição pelo período de férias de funcionário que exercesse referida atividade (fl. 30).


A sentença destacou que a prova oral produzida pela reclamada confirmou os termos da contestação quanto a isto, nada havendo nos autos em socorro à tese sustentada pelo autor.


Como se vê, tratando-se de fato constitutivo de direito, o ônus probatório era encargo do autor, conforme disposição inserta no artigo 818 da CLT c/c artigo 333, I, do CPC, do qual não se desvencilhou, pelo que resta afastada a sua pretensão, conforme decidido em 1ª instância.




Isto posto, NEGO PROVIMENTO ao recurso, nos termos da fundamentação.








MARCELO FREIRE GONÇALVES

Desembargador Relator




AB

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