Superior Tribunal de Justiça
RECURSO ESPECIAL Nº 1.175.616 - MT (2010/0009028-7)
RECORRENTE : UNIMED NORTE DO MATO GROSSO COOPERATIVA DE
TRABALHO MÉDICO
ADVOGADO : CLÁUDIO ALVES PEREIRA E OUTRO(S)
RECORRIDO : MARIA INÊS CONEGLIAN
ADVOGADO : SANDRA SATOMI OKUNO DE AGUIAR E OUTRO(S)
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):
1. Maria Inês Coneglian Antunes ajuizou em desfavor de Unimed Norte
Mato Grosso - Cooperativa de Trabalho Médico, ação declaratória objetivando o
reconhecimento do dever da ré de suportar as despesas médico-hospitalares relativas a
procedimento cirúrgico conhecido como cirurgia bariátrica (ou gastroplastia),
recomendada por especialista para o tratamento de obesidade grau III/mórbida, refluxo
duodeno-gástrico e cólica biliar.
A autora obteve liminar em medida cautelar preparatória para que a ré
arcasse com as despesas mencionadas, em razão do que o procedimento cirúrgico foi
realizado às expensas do plano de saúde.
O Juízo de Direito da 2ª Vara Cível da Comarca de Sinop/MT julgou
procedentes os pedidos deduzidos na ação principal e na cautelar, tornando definitiva a
liminar outrora concedida (e-STJ, fls. 166/172).
Em grau de recurso, a sentença foi mantida nos termos da seguinte ementa:
RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DECLARATÓRIA - PEDIDO DE
AUTORIZAÇÃO PARA REALIZAÇÃO DE TRATAMENTO MÉDICO -
OBESIDADE MÓRBIDA - CIRURGIA DE GASTROPLASTIA - NEGATIVA DE
COBERTURA - CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE FIRMADO ANTES DA
LEI Nº 9.656/98 - INCIDÊNCIA DA NOVA LEGISLAÇÃO - RELAÇÃO DE
CONSUMO - INTERPRETAÇÃO DAS CLÁUSULAS DE MANEIRA MAIS
FAVORÁVEL AO CONSUMIDOR - EX VI DO ART. 47 DO CDC - RISCO DE
MORTE - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SOBRE O VALOR DA CAUSA -
APLICAÇÃO DO §4º DO ART. 20 DO CPC - SENTENÇA MANTIDA -
RECURSO IMPROVIDO.
Não pode a entidade prestadora dos serviços de saúde se recusar a autorizar
e arcar com as despesas relativas ao tratamento de obesidade mórbida, que
não possui fins estéticos, mas alerta para riscos à saúde da paciente, sob o
fundamento de negativa de cobertura contratual.
Nos termos do CDC, as cláusulas restritivas de cobertura do contrato devem
vir expressamente elencadas neste, devendo ainda ser interpretadas de
maneira mais favorável ao consumidor. (e-STJ, fl. 229)
Documento: 14177787 - RELATÓRIO, EMENTA E VOTO - Site certificado Página 1 de 8
Superior Tribunal de Justiça
Opostos embargos declaratórios, foram eles rejeitados (e-STJ, fls. 259/262).
Sobreveio recurso especial interposto pela Unimed com fundamento nas
alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional, no qual alega, além de dissídio
jurisprudencial, ofensa ao art. 331 do CPC, art. 5º, inciso LV, da Constituição Federal, e
art. 104 do Código Civil.
Assevera a recorrente ter havido cerceamento de defesa, na medida em
que não foi designada audiência preliminar, tampouco deferida a produção das provas
pleiteadas.
Por outro lado, tenta demonstrar a legalidade da cláusula contratual
limitativa da cobertura de despesas referentes a "emagrecimento e/ou ganho de peso".
Contra-arrazoado (e-STJ, fls. 335/348), o especial foi inadmitido (e-STJ, fls.
350/352), ascendendo os autos a esta e. Corte por força de decisão de minha lavra em
que dei provimento ao Ag. n.º 1.097.666/MT.
É o relatório.
Documento: 14177787 - RELATÓRIO, EMENTA E VOTO - Site certificado Página 2 de 8
Superior Tribunal de Justiça
RECURSO ESPECIAL Nº 1.175.616 - MT (2010/0009028-7)
RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
RECORRENTE : UNIMED NORTE DO MATO GROSSO COOPERATIVA DE
TRABALHO MÉDICO
ADVOGADO : CLÁUDIO ALVES PEREIRA E OUTRO(S)
RECORRIDO : MARIA INÊS CONEGLIAN
ADVOGADO : SANDRA SATOMI OKUNO DE AGUIAR E OUTRO(S)
EMENTA
PLANOS DE SAÚDE. GASTROPLASTIA. CIRURGIA INDICADA
PARA TRATAMENTO DE OBESIDADE MÓRBIDA. NECESSIDADE À
SOBREVIDA DA PACIENTE. COBERTURA.
1. No sistema de persuasão racional adotado pelo Código de
Processo Civil nos arts. 130 e 131, em regra, não cabe compelir o
magistrado a autorizar a produção desta ou daquela prova, se por
outros meios estiver convencido da verdade dos fatos, tendo em
vista que o juiz é o destinatário final da prova, a quem cabe a
análise da conveniência e necessidade da sua produção.
2. A gastroplastia, indicada como tratamento para obesidade
mórbida, longe de ser um procedimento estético ou mero
tratamento emagrecedor, revela-se como cirurgia essencial à
sobrevida do segurado, vocacionada, ademais, ao tratamento das
outras tantas co-morbidades que acompanham a obesidade em
grau severo. Nessa hipótese, mostra-se ilegítima a negativa do
plano de saúde em cobrir as despesas da intervenção cirúrgica.
3. Recurso especial a que se nega provimento.
Documento: 14177787 - RELATÓRIO, EMENTA E VOTO - Site certificado Página 3 de 8
Superior Tribunal de Justiça
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):
2. Afasto, de saída, o alegado cerceamento de defesa pelo fato de ter o
juízo de piso julgado antecipadamente o mérito da causa, nos moldes do art. 330 do
CPC.
Primeiramente porque o exame acerca da necessidade da realização de
audiência de instrução demandaria revolvimento da circunstâncias fáticas dos autos,
providência vedada pela Súmula 7/STJ (REsp 1216020/AL, Rel. Ministro HERMAN
BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 02/12/2010, DJe 04/02/2011).
Ademais, no sistema de persuasão racional adotado pelo Código de
Processo Civil nos arts. 130 e 131, em regra, não cabe compelir o magistrado a autorizar
a produção desta ou daquela prova, se por outros meios estiver convencido da verdade
dos fatos, tendo em vista que o juiz é o destinatário final da prova, a quem cabe a análise
da conveniência e necessidade da sua produção (AgRg no Ag 987.507/DF, Rel. Ministro
LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 14/12/2010).
3. Por outro lado, descabe a esta Corte admitir recurso especial com base
em alegada ofensa a artigo da Constituição Federal, incumbência restrita ao e. Supremo
Tribunal Federal, conforme maciça jurisprudência (dentre muitos, REsp 1220959/PR, Rel.
Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 14/12/2010,
DJe 08/02/2011).
4. Quanto ao mais, a celeuma cinge-se à alegada não-cobertura pelo plano
de saúde da autora, ora recorrida, de gastroplastia indicada ao tratamento de obesidade
mórbida, bem como outras complicações dela decorrentes.
Alega a recorrente - o que foi explicitamente confirmado pelo acórdão -
haver exclusão contratual concernente a procedimentos clínicos ou cirúrgicos relativos a
"emagrecimento e/ou ganho de peso".
Nesse passo, é a cláusula 10.1 que ora colho do voto condutor:
10.1 - Estão excluídas das coberturas deste contrato as despesas referentes
a:
M) Cirurgias plásticas exceto o previsto no item 9.1.1 da Cláusula IX deste
contrato; tratamentos clínicos e/ou cirúrgicos por motivo de senilidade, para
rejuvenecimento e/ou prevenção de envelhecimento, emagrecimento e/ou
ganho de peso; tratamento e/ou cirurgias para alterações somáticas e outros
com finalidade estética ou cosmética, ficando claro que a mamoplastia está
excluída, ainda que a hipertrofia mamária possa repercutir sobre a coluna
vertebral; medicina ortomolecular e mineralograma do cabelo. (e-STJ, fls.
235/236)
Documento: 14177787 - RELATÓRIO, EMENTA E VOTO - Site certificado Página 4 de 8
Superior Tribunal de Justiça
A autora, por sua vez, ancora-se na cláusula contratual mais genérica, nos
seguintes termos:
9.1 - A CONTRATADA assegura, aos usuários inscritos, após o cumprimento
dos períodos de carência, assistência médica nos consultórios dos médicos
cooperados, em hospitais e ambulatórios, dentro da rede própria ou
CONTRATADA, de acordo com o(s) Módulo(s) contratado(s), nas
especialidades clínicas e/ou cirúrgicas a seguir relacionadas: (...)
Endocrinologia; e Metabologia; Fisiatria; Gastroenterologia; (...)
O acórdão recorrido entendeu não ser aplicável à hipótese a cláusula
excludente, noticiando, ademais, que o tratamento pleiteado pela autora e indicado por
especialista "com a concordância de outros médicos de diversas especialidades, dentre
eles, psiquiatra, endócrino, pneumologista e cardiologista, não possuía fim estético,
considerando que a obesidade mórbida da autora (...) alertava para riscos à sua saúde,
como causa de hipertensão arterial, complicações e alterações cardiovasculares,
consoante se denota dos laudos anexados à exordial" (e-STJ, fl. 240).
4.1. Deveras, a obesidade mórbida - considerado como portador de tal
mazela o indivíduo cujo índice de massa corpórea (IMC) seja igual ou superior a 40
kg/m2 -, para além da criatividade plástica de Botero, é doença que compromete não
somente a condição e qualidade de vida atual da pessoa, mas também a sua expectativa
de sobrevida.
Nesse passo, a comunidade médica vem indicando diversas outras
patologias diretamente relacionadas com a obesidade, tais como: hipertensão arterial,
doenças cardíacas e coronarianas, diabetes, apnéia do sono, hiperlipidemia, doenças
articulares especialmente nos joelhos e tornozelos, doenças vasculares nos membros
inferiores, além de patologias de natureza psiquiátrica. Por outro lado, no caso de
obesidades mórbidas, os métodos convencionais não-cirúrgicos, isoladamente,
mostraram-se pouco efetivos.
Não por acaso, a Agência Nacional de Saúde editou a Resolução Normativa
n.º 167/08, reconhecendo a gravidade dessa patologia e indicando hipóteses em que a
cirurgia bariátrica é obrigatória:
Art. 8º O tratamento da obesidade mórbida, por sua gravidade e risco à
vida do paciente, demanda atendimento especial devendo ser assegurado e
realizado, preferencialmente, por equipe multiprofissional, em nível
ambulatorial.
Parágrafo único. Em caso de indicação médica, poderá ocorrer a internação
em estabelecimentos médicos, tais como, hospitais e clínicas para tratamento
médico, assim consideradas pelo Cadastro Nacional de Estabelecimento de
Saúde – CNES. (sem grifo no original)
Documento: 14177787 - RELATÓRIO, EMENTA E VOTO - Site certificado Página 5 de 8
Superior Tribunal de Justiça
No mesmo sentido, e de forma pormenorizada, dispõe o anxo II da
mencionada resolução, ao dispor sobre diretrizes de utilização para cobertura de
procedimentos de saúde suplementar:
Colocação de banda gástrica para cirurgia de obesidade mórbida
Cobertura obrigatória em casos de:
1. IMC igual ou maior do que 35 Kg/m2 com co-morbidade ou IMC igual ou
maior do que 40 Kg/m2 com ou sem co-morbidade.
2. Pacientes que não necessitem de perdas acentuadas (IMC menor do que
50 Kg/m2).
3. Falha do tratamento clínico realizado por, pelo menos, dois anos.
4. Obesidade mórbida instalada há mais de cinco anos.
5. Sem uso de álcool ou outras drogas nos últimos cinco anos.
(...)
Gastroplastia para obesidade mórbida (cirurgia bariátrica)
Cobertura obrigatória em casos de:
1. Portadores de obesidade mórbida com IMC (índice de massa corpórea)
igual ou maior do que 40 Kg/m2, sem co-morbidades e que não responderam
ao tratamento conservador (dieta, psicoterapia, atividade física, etc.),
realizado durante pelo menos dois anos.
2. Portadores de obesidade mórbida com IMC igual ou maior do que 40 Kg/
m2 com co-morbidades que ameaçam a vida.
3. Pacientes com IMC entre 35 e 39,9 Kg/ m2 portadores de doenças crônicas
desencadeadas ou agravadas pela obesidade (diabetes, apnéia do sono,
hipertensão arterial, dislipidemia, doença coronariana, osteo-artrites e outras).
4.2. No caso concreto, como sói acontecer, as instâncias ordinárias
indicaram que "a diversidade das consequências da doença apontada no laudo médico
trazido aos autos indica riscos iminentes à vida da paciente" (sentença, fl. 170),
considerada a cirurgia "indispensável à sobrevida" da autora (acórdão, fl. 241).
Realmente, a gastroplastia, indicada como tratamento para obesidade
mórbida, longe de ser um procedimento estético ou mero tratamento emagrecedor,
revela-se como cirurgia por vezes essencial à sobrevida do segurado, vocacionada,
ademais, ao tratamento das outras tantas co-morbidades que acompanham a obesidade
em grau severo.
Nessa hipótese, mostra-se ilegítima a negativa do plano de saúde em cobrir
as despesas da intervenção cirúrgica.
A doutrina vem sinalizando esse mesmo entendimento no que concerne às
limitações previstas no art. 10 da Lei n.º 9.656/98:
Tocante ao tratamento para redução de massa corporal ou para
emagrecimento, as dificuldades aparecem. É evidente que um paciente
acometido de obesidade mórbida, incontrolável senão com tratamentos
cirúrgicos, não se submeterá a uma cirurgia de alto risco apenas com
finalidade estética para seu emagrecimento possível de ser obtido com a
intervenção cirúrgica. Mas é inegável que a estética desse paciente será
Documento: 14177787 - RELATÓRIO, EMENTA E VOTO - Site certificado Página 6 de 8
Superior Tribunal de Justiça
bastante melhorada com o sucesso do tratamento. Em circunstâncias que
tais, possíveis de ser comprovadas com os laudos médicos, não se poderá
evitar a cobertura do tratamento, porque a finalidade estética aparece como
conseqüente. (BOTTESINI, Maury Ângelo. Lei dos planos e seguros de
saúde: comentada artigo por artigo, doutrina, jurisprudência . 2ª ed. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005, p. 83)
O próprio CONSU, desde 1998, regulamentou o art. 10 da Lei n.º 9.656/98,
no que concerne aos procedimentos que podem ser licitamente excluídos da cobertura
securitária.
É explícita a Resolução n.º 10/98, art. 5º, § único, alínea "a":
Parágrafo único. Para fins de aplicação do art. 10 da Lei n. 9.656/98,
consideram-se excluídos:
a) tratamentos em clínicas de emagrecimento (exceto para tratamentos da
obesidade mórbida), clínicas de repouso, estâncias hidrominerais, clínicas
para acolhimento de idosos e internações que não necessitem de cuidados
médicos em ambiente hospitalar;
4.3. A e. Terceira Turma também sufragou entendimento semelhante:
Civil. Recurso especial. Ação cominatória cumulada com pedido de
compensação por danos morais. Plano de saúde firmado em 1992. Recusa
de cobertura de gastroplastia redutora, conhecida como 'cirurgia de redução
de estômago', sob alegação de ausência de cobertura contratual. Operação
recomendada como tratamento médico para gravíssimo estado de saúde e
não com intuito estético. Técnica operatória que passou a ser reconhecida
nos meios médicos brasileiros em data posterior à realização do contrato.
Acórdão que julgou improcedentes os pedidos com base na necessidade de
manutenção da equivalência das prestações contratuais. Extensão da
cláusula genérica relativa à cobertura de 'cirurgias gastroenterológicas' para a
presente hipótese.
- O CDC é aplicável à controvérsia, ao contrário do quanto afirmado pelo
acórdão.
- A discussão sobre a equivalência das prestações deveria ter levado em
conta que a análise contratual correta, em termos econômicos, depende,
necessariamente, do estudo de dois momentos distintos no contrato de
seguro-saúde: o primeiro é relativo à definição das doenças cobertas, e o
segundo, às eventuais previsões de tratamentos específicos para tais
doenças.
- Se o contrato previa a cobertura para a doença, qualquer constatação de
desequilíbrio financeiro a partir da alteração do tratamento dependeria,
naturalmente, de uma comparação analítica entre os custos derivados das
duas prescrições – aquela prevista no momento da contratação e aquela
desenvolvida mais tarde.
- Sem tal comparação, a argumentação desenvolvida é meramente
hipotética, pois se presume, sem qualquer demonstração, que a nova técnica
é necessariamente mais custosa do que a anterior.
- Não se desconsidera, de forma apriorística, a importância do princípio da
equivalência das prestações nos contratos comutativos; porém, é de se
Documento: 14177787 - RELATÓRIO, EMENTA E VOTO - Site certificado Página 7 de 8
Superior Tribunal de Justiça
reconhecer que a aplicação desse cânone depende da verificação de um
substrato fático específico que aponte para uma real desproporção entre as
prestações, não se admitindo que a tutela constitucional dos direitos do
consumidor seja limitada com base em meras suposições.
- A ausência de adaptação do contrato às disposições da Lei nº 9.656/98 –
que prevê expressamente a cobertura para a cirurgia de redução de
estômago – é ponto irrelevante, pois a controvérsia, conforme visto, se
desenvolve unicamente na perspectiva da análise do contrato firmado em
data anterior a tal Lei.
- A jurisprudência do STJ se orienta no sentido de proporcionar ao
consumidor o tratamento mais moderno e adequado, em substituição ao
procedimento obsoleto previsto especificamente no contrato. A interpretação
das cláusulas contratuais deve favorecer a extensão dos direitos do
consumidor.
- É evidente o dano moral sofrido por aquele que, em momento delicado de
necessidade, vê negada a cobertura médica esperada.
Precedentes do STJ.
Recurso especial provido.
(REsp 1106789/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA,
julgado em 15/10/2009, DJe 18/11/2009)
Por outro lado, o Código de Defesa do Consumidor garante a "informação
adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de
quantidade, características, composição, qualidade e preço (...)", e que "as cláusulas que
implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque,
permitindo sua imediata e fácil compreensão" (arts. 6º, inciso III, e 54, § 4º, do CDC).
Vale dizer, os arts. 6º, inciso III, e 54, § 4º, do CDC, estabelecem que é
direito do consumidor a informação plena do objeto do contrato, garantindo-lhe, ademais,
não somente uma clareza física das cláusulas limitativas - o que é atingido pelo simples
destaque destas -, mas, sobretudo, clareza semântica, um significado unívoco dessas
cláusulas, que deverão estar infensas a duplo sentido.
5. No caso, havendo, por um lado, cláusula contratual excludente de
tratamento para "emagrecimento ou ganho de peso", e, por outro lado, cláusula de
cobertura de procedimentos cirúrgicos de endocrinologia e gastroenterologia, o conflito
interpretativo soluciona-se em benefício do consumidor, mercê do disposto do art. 49 do
CDC.
6. Diante do exposto, nego provimento ao recurso especial.
É como voto.
Documento: 14177787 - RELATÓRIO, EMENTA E VOTO - Site certificado Página 8 de 8
RECURSO ESPECIAL Nº 1.175.616 - MT (2010/0009028-7)
RECORRENTE : UNIMED NORTE DO MATO GROSSO COOPERATIVA DE
TRABALHO MÉDICO
ADVOGADO : CLÁUDIO ALVES PEREIRA E OUTRO(S)
RECORRIDO : MARIA INÊS CONEGLIAN
ADVOGADO : SANDRA SATOMI OKUNO DE AGUIAR E OUTRO(S)
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):
1. Maria Inês Coneglian Antunes ajuizou em desfavor de Unimed Norte
Mato Grosso - Cooperativa de Trabalho Médico, ação declaratória objetivando o
reconhecimento do dever da ré de suportar as despesas médico-hospitalares relativas a
procedimento cirúrgico conhecido como cirurgia bariátrica (ou gastroplastia),
recomendada por especialista para o tratamento de obesidade grau III/mórbida, refluxo
duodeno-gástrico e cólica biliar.
A autora obteve liminar em medida cautelar preparatória para que a ré
arcasse com as despesas mencionadas, em razão do que o procedimento cirúrgico foi
realizado às expensas do plano de saúde.
O Juízo de Direito da 2ª Vara Cível da Comarca de Sinop/MT julgou
procedentes os pedidos deduzidos na ação principal e na cautelar, tornando definitiva a
liminar outrora concedida (e-STJ, fls. 166/172).
Em grau de recurso, a sentença foi mantida nos termos da seguinte ementa:
RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DECLARATÓRIA - PEDIDO DE
AUTORIZAÇÃO PARA REALIZAÇÃO DE TRATAMENTO MÉDICO -
OBESIDADE MÓRBIDA - CIRURGIA DE GASTROPLASTIA - NEGATIVA DE
COBERTURA - CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE FIRMADO ANTES DA
LEI Nº 9.656/98 - INCIDÊNCIA DA NOVA LEGISLAÇÃO - RELAÇÃO DE
CONSUMO - INTERPRETAÇÃO DAS CLÁUSULAS DE MANEIRA MAIS
FAVORÁVEL AO CONSUMIDOR - EX VI DO ART. 47 DO CDC - RISCO DE
MORTE - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SOBRE O VALOR DA CAUSA -
APLICAÇÃO DO §4º DO ART. 20 DO CPC - SENTENÇA MANTIDA -
RECURSO IMPROVIDO.
Não pode a entidade prestadora dos serviços de saúde se recusar a autorizar
e arcar com as despesas relativas ao tratamento de obesidade mórbida, que
não possui fins estéticos, mas alerta para riscos à saúde da paciente, sob o
fundamento de negativa de cobertura contratual.
Nos termos do CDC, as cláusulas restritivas de cobertura do contrato devem
vir expressamente elencadas neste, devendo ainda ser interpretadas de
maneira mais favorável ao consumidor. (e-STJ, fl. 229)
Documento: 14177787 - RELATÓRIO, EMENTA E VOTO - Site certificado Página 1 de 8
Superior Tribunal de Justiça
Opostos embargos declaratórios, foram eles rejeitados (e-STJ, fls. 259/262).
Sobreveio recurso especial interposto pela Unimed com fundamento nas
alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional, no qual alega, além de dissídio
jurisprudencial, ofensa ao art. 331 do CPC, art. 5º, inciso LV, da Constituição Federal, e
art. 104 do Código Civil.
Assevera a recorrente ter havido cerceamento de defesa, na medida em
que não foi designada audiência preliminar, tampouco deferida a produção das provas
pleiteadas.
Por outro lado, tenta demonstrar a legalidade da cláusula contratual
limitativa da cobertura de despesas referentes a "emagrecimento e/ou ganho de peso".
Contra-arrazoado (e-STJ, fls. 335/348), o especial foi inadmitido (e-STJ, fls.
350/352), ascendendo os autos a esta e. Corte por força de decisão de minha lavra em
que dei provimento ao Ag. n.º 1.097.666/MT.
É o relatório.
Documento: 14177787 - RELATÓRIO, EMENTA E VOTO - Site certificado Página 2 de 8
Superior Tribunal de Justiça
RECURSO ESPECIAL Nº 1.175.616 - MT (2010/0009028-7)
RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
RECORRENTE : UNIMED NORTE DO MATO GROSSO COOPERATIVA DE
TRABALHO MÉDICO
ADVOGADO : CLÁUDIO ALVES PEREIRA E OUTRO(S)
RECORRIDO : MARIA INÊS CONEGLIAN
ADVOGADO : SANDRA SATOMI OKUNO DE AGUIAR E OUTRO(S)
EMENTA
PLANOS DE SAÚDE. GASTROPLASTIA. CIRURGIA INDICADA
PARA TRATAMENTO DE OBESIDADE MÓRBIDA. NECESSIDADE À
SOBREVIDA DA PACIENTE. COBERTURA.
1. No sistema de persuasão racional adotado pelo Código de
Processo Civil nos arts. 130 e 131, em regra, não cabe compelir o
magistrado a autorizar a produção desta ou daquela prova, se por
outros meios estiver convencido da verdade dos fatos, tendo em
vista que o juiz é o destinatário final da prova, a quem cabe a
análise da conveniência e necessidade da sua produção.
2. A gastroplastia, indicada como tratamento para obesidade
mórbida, longe de ser um procedimento estético ou mero
tratamento emagrecedor, revela-se como cirurgia essencial à
sobrevida do segurado, vocacionada, ademais, ao tratamento das
outras tantas co-morbidades que acompanham a obesidade em
grau severo. Nessa hipótese, mostra-se ilegítima a negativa do
plano de saúde em cobrir as despesas da intervenção cirúrgica.
3. Recurso especial a que se nega provimento.
Documento: 14177787 - RELATÓRIO, EMENTA E VOTO - Site certificado Página 3 de 8
Superior Tribunal de Justiça
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):
2. Afasto, de saída, o alegado cerceamento de defesa pelo fato de ter o
juízo de piso julgado antecipadamente o mérito da causa, nos moldes do art. 330 do
CPC.
Primeiramente porque o exame acerca da necessidade da realização de
audiência de instrução demandaria revolvimento da circunstâncias fáticas dos autos,
providência vedada pela Súmula 7/STJ (REsp 1216020/AL, Rel. Ministro HERMAN
BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 02/12/2010, DJe 04/02/2011).
Ademais, no sistema de persuasão racional adotado pelo Código de
Processo Civil nos arts. 130 e 131, em regra, não cabe compelir o magistrado a autorizar
a produção desta ou daquela prova, se por outros meios estiver convencido da verdade
dos fatos, tendo em vista que o juiz é o destinatário final da prova, a quem cabe a análise
da conveniência e necessidade da sua produção (AgRg no Ag 987.507/DF, Rel. Ministro
LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 14/12/2010).
3. Por outro lado, descabe a esta Corte admitir recurso especial com base
em alegada ofensa a artigo da Constituição Federal, incumbência restrita ao e. Supremo
Tribunal Federal, conforme maciça jurisprudência (dentre muitos, REsp 1220959/PR, Rel.
Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 14/12/2010,
DJe 08/02/2011).
4. Quanto ao mais, a celeuma cinge-se à alegada não-cobertura pelo plano
de saúde da autora, ora recorrida, de gastroplastia indicada ao tratamento de obesidade
mórbida, bem como outras complicações dela decorrentes.
Alega a recorrente - o que foi explicitamente confirmado pelo acórdão -
haver exclusão contratual concernente a procedimentos clínicos ou cirúrgicos relativos a
"emagrecimento e/ou ganho de peso".
Nesse passo, é a cláusula 10.1 que ora colho do voto condutor:
10.1 - Estão excluídas das coberturas deste contrato as despesas referentes
a:
M) Cirurgias plásticas exceto o previsto no item 9.1.1 da Cláusula IX deste
contrato; tratamentos clínicos e/ou cirúrgicos por motivo de senilidade, para
rejuvenecimento e/ou prevenção de envelhecimento, emagrecimento e/ou
ganho de peso; tratamento e/ou cirurgias para alterações somáticas e outros
com finalidade estética ou cosmética, ficando claro que a mamoplastia está
excluída, ainda que a hipertrofia mamária possa repercutir sobre a coluna
vertebral; medicina ortomolecular e mineralograma do cabelo. (e-STJ, fls.
235/236)
Documento: 14177787 - RELATÓRIO, EMENTA E VOTO - Site certificado Página 4 de 8
Superior Tribunal de Justiça
A autora, por sua vez, ancora-se na cláusula contratual mais genérica, nos
seguintes termos:
9.1 - A CONTRATADA assegura, aos usuários inscritos, após o cumprimento
dos períodos de carência, assistência médica nos consultórios dos médicos
cooperados, em hospitais e ambulatórios, dentro da rede própria ou
CONTRATADA, de acordo com o(s) Módulo(s) contratado(s), nas
especialidades clínicas e/ou cirúrgicas a seguir relacionadas: (...)
Endocrinologia; e Metabologia; Fisiatria; Gastroenterologia; (...)
O acórdão recorrido entendeu não ser aplicável à hipótese a cláusula
excludente, noticiando, ademais, que o tratamento pleiteado pela autora e indicado por
especialista "com a concordância de outros médicos de diversas especialidades, dentre
eles, psiquiatra, endócrino, pneumologista e cardiologista, não possuía fim estético,
considerando que a obesidade mórbida da autora (...) alertava para riscos à sua saúde,
como causa de hipertensão arterial, complicações e alterações cardiovasculares,
consoante se denota dos laudos anexados à exordial" (e-STJ, fl. 240).
4.1. Deveras, a obesidade mórbida - considerado como portador de tal
mazela o indivíduo cujo índice de massa corpórea (IMC) seja igual ou superior a 40
kg/m2 -, para além da criatividade plástica de Botero, é doença que compromete não
somente a condição e qualidade de vida atual da pessoa, mas também a sua expectativa
de sobrevida.
Nesse passo, a comunidade médica vem indicando diversas outras
patologias diretamente relacionadas com a obesidade, tais como: hipertensão arterial,
doenças cardíacas e coronarianas, diabetes, apnéia do sono, hiperlipidemia, doenças
articulares especialmente nos joelhos e tornozelos, doenças vasculares nos membros
inferiores, além de patologias de natureza psiquiátrica. Por outro lado, no caso de
obesidades mórbidas, os métodos convencionais não-cirúrgicos, isoladamente,
mostraram-se pouco efetivos.
Não por acaso, a Agência Nacional de Saúde editou a Resolução Normativa
n.º 167/08, reconhecendo a gravidade dessa patologia e indicando hipóteses em que a
cirurgia bariátrica é obrigatória:
Art. 8º O tratamento da obesidade mórbida, por sua gravidade e risco à
vida do paciente, demanda atendimento especial devendo ser assegurado e
realizado, preferencialmente, por equipe multiprofissional, em nível
ambulatorial.
Parágrafo único. Em caso de indicação médica, poderá ocorrer a internação
em estabelecimentos médicos, tais como, hospitais e clínicas para tratamento
médico, assim consideradas pelo Cadastro Nacional de Estabelecimento de
Saúde – CNES. (sem grifo no original)
Documento: 14177787 - RELATÓRIO, EMENTA E VOTO - Site certificado Página 5 de 8
Superior Tribunal de Justiça
No mesmo sentido, e de forma pormenorizada, dispõe o anxo II da
mencionada resolução, ao dispor sobre diretrizes de utilização para cobertura de
procedimentos de saúde suplementar:
Colocação de banda gástrica para cirurgia de obesidade mórbida
Cobertura obrigatória em casos de:
1. IMC igual ou maior do que 35 Kg/m2 com co-morbidade ou IMC igual ou
maior do que 40 Kg/m2 com ou sem co-morbidade.
2. Pacientes que não necessitem de perdas acentuadas (IMC menor do que
50 Kg/m2).
3. Falha do tratamento clínico realizado por, pelo menos, dois anos.
4. Obesidade mórbida instalada há mais de cinco anos.
5. Sem uso de álcool ou outras drogas nos últimos cinco anos.
(...)
Gastroplastia para obesidade mórbida (cirurgia bariátrica)
Cobertura obrigatória em casos de:
1. Portadores de obesidade mórbida com IMC (índice de massa corpórea)
igual ou maior do que 40 Kg/m2, sem co-morbidades e que não responderam
ao tratamento conservador (dieta, psicoterapia, atividade física, etc.),
realizado durante pelo menos dois anos.
2. Portadores de obesidade mórbida com IMC igual ou maior do que 40 Kg/
m2 com co-morbidades que ameaçam a vida.
3. Pacientes com IMC entre 35 e 39,9 Kg/ m2 portadores de doenças crônicas
desencadeadas ou agravadas pela obesidade (diabetes, apnéia do sono,
hipertensão arterial, dislipidemia, doença coronariana, osteo-artrites e outras).
4.2. No caso concreto, como sói acontecer, as instâncias ordinárias
indicaram que "a diversidade das consequências da doença apontada no laudo médico
trazido aos autos indica riscos iminentes à vida da paciente" (sentença, fl. 170),
considerada a cirurgia "indispensável à sobrevida" da autora (acórdão, fl. 241).
Realmente, a gastroplastia, indicada como tratamento para obesidade
mórbida, longe de ser um procedimento estético ou mero tratamento emagrecedor,
revela-se como cirurgia por vezes essencial à sobrevida do segurado, vocacionada,
ademais, ao tratamento das outras tantas co-morbidades que acompanham a obesidade
em grau severo.
Nessa hipótese, mostra-se ilegítima a negativa do plano de saúde em cobrir
as despesas da intervenção cirúrgica.
A doutrina vem sinalizando esse mesmo entendimento no que concerne às
limitações previstas no art. 10 da Lei n.º 9.656/98:
Tocante ao tratamento para redução de massa corporal ou para
emagrecimento, as dificuldades aparecem. É evidente que um paciente
acometido de obesidade mórbida, incontrolável senão com tratamentos
cirúrgicos, não se submeterá a uma cirurgia de alto risco apenas com
finalidade estética para seu emagrecimento possível de ser obtido com a
intervenção cirúrgica. Mas é inegável que a estética desse paciente será
Documento: 14177787 - RELATÓRIO, EMENTA E VOTO - Site certificado Página 6 de 8
Superior Tribunal de Justiça
bastante melhorada com o sucesso do tratamento. Em circunstâncias que
tais, possíveis de ser comprovadas com os laudos médicos, não se poderá
evitar a cobertura do tratamento, porque a finalidade estética aparece como
conseqüente. (BOTTESINI, Maury Ângelo. Lei dos planos e seguros de
saúde: comentada artigo por artigo, doutrina, jurisprudência . 2ª ed. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005, p. 83)
O próprio CONSU, desde 1998, regulamentou o art. 10 da Lei n.º 9.656/98,
no que concerne aos procedimentos que podem ser licitamente excluídos da cobertura
securitária.
É explícita a Resolução n.º 10/98, art. 5º, § único, alínea "a":
Parágrafo único. Para fins de aplicação do art. 10 da Lei n. 9.656/98,
consideram-se excluídos:
a) tratamentos em clínicas de emagrecimento (exceto para tratamentos da
obesidade mórbida), clínicas de repouso, estâncias hidrominerais, clínicas
para acolhimento de idosos e internações que não necessitem de cuidados
médicos em ambiente hospitalar;
4.3. A e. Terceira Turma também sufragou entendimento semelhante:
Civil. Recurso especial. Ação cominatória cumulada com pedido de
compensação por danos morais. Plano de saúde firmado em 1992. Recusa
de cobertura de gastroplastia redutora, conhecida como 'cirurgia de redução
de estômago', sob alegação de ausência de cobertura contratual. Operação
recomendada como tratamento médico para gravíssimo estado de saúde e
não com intuito estético. Técnica operatória que passou a ser reconhecida
nos meios médicos brasileiros em data posterior à realização do contrato.
Acórdão que julgou improcedentes os pedidos com base na necessidade de
manutenção da equivalência das prestações contratuais. Extensão da
cláusula genérica relativa à cobertura de 'cirurgias gastroenterológicas' para a
presente hipótese.
- O CDC é aplicável à controvérsia, ao contrário do quanto afirmado pelo
acórdão.
- A discussão sobre a equivalência das prestações deveria ter levado em
conta que a análise contratual correta, em termos econômicos, depende,
necessariamente, do estudo de dois momentos distintos no contrato de
seguro-saúde: o primeiro é relativo à definição das doenças cobertas, e o
segundo, às eventuais previsões de tratamentos específicos para tais
doenças.
- Se o contrato previa a cobertura para a doença, qualquer constatação de
desequilíbrio financeiro a partir da alteração do tratamento dependeria,
naturalmente, de uma comparação analítica entre os custos derivados das
duas prescrições – aquela prevista no momento da contratação e aquela
desenvolvida mais tarde.
- Sem tal comparação, a argumentação desenvolvida é meramente
hipotética, pois se presume, sem qualquer demonstração, que a nova técnica
é necessariamente mais custosa do que a anterior.
- Não se desconsidera, de forma apriorística, a importância do princípio da
equivalência das prestações nos contratos comutativos; porém, é de se
Documento: 14177787 - RELATÓRIO, EMENTA E VOTO - Site certificado Página 7 de 8
Superior Tribunal de Justiça
reconhecer que a aplicação desse cânone depende da verificação de um
substrato fático específico que aponte para uma real desproporção entre as
prestações, não se admitindo que a tutela constitucional dos direitos do
consumidor seja limitada com base em meras suposições.
- A ausência de adaptação do contrato às disposições da Lei nº 9.656/98 –
que prevê expressamente a cobertura para a cirurgia de redução de
estômago – é ponto irrelevante, pois a controvérsia, conforme visto, se
desenvolve unicamente na perspectiva da análise do contrato firmado em
data anterior a tal Lei.
- A jurisprudência do STJ se orienta no sentido de proporcionar ao
consumidor o tratamento mais moderno e adequado, em substituição ao
procedimento obsoleto previsto especificamente no contrato. A interpretação
das cláusulas contratuais deve favorecer a extensão dos direitos do
consumidor.
- É evidente o dano moral sofrido por aquele que, em momento delicado de
necessidade, vê negada a cobertura médica esperada.
Precedentes do STJ.
Recurso especial provido.
(REsp 1106789/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA,
julgado em 15/10/2009, DJe 18/11/2009)
Por outro lado, o Código de Defesa do Consumidor garante a "informação
adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de
quantidade, características, composição, qualidade e preço (...)", e que "as cláusulas que
implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque,
permitindo sua imediata e fácil compreensão" (arts. 6º, inciso III, e 54, § 4º, do CDC).
Vale dizer, os arts. 6º, inciso III, e 54, § 4º, do CDC, estabelecem que é
direito do consumidor a informação plena do objeto do contrato, garantindo-lhe, ademais,
não somente uma clareza física das cláusulas limitativas - o que é atingido pelo simples
destaque destas -, mas, sobretudo, clareza semântica, um significado unívoco dessas
cláusulas, que deverão estar infensas a duplo sentido.
5. No caso, havendo, por um lado, cláusula contratual excludente de
tratamento para "emagrecimento ou ganho de peso", e, por outro lado, cláusula de
cobertura de procedimentos cirúrgicos de endocrinologia e gastroenterologia, o conflito
interpretativo soluciona-se em benefício do consumidor, mercê do disposto do art. 49 do
CDC.
6. Diante do exposto, nego provimento ao recurso especial.
É como voto.
Documento: 14177787 - RELATÓRIO, EMENTA E VOTO - Site certificado Página 8 de 8