domingo, 26 de dezembro de 2010

STF - Conheça melhor o instituto da repercussão geral

STF - Conheça melhor o instituto da repercussão geral




O instituto da repercussão geral surgiu com a chegada da Reforma do Judiciário, pela Emenda Constitucional nº 45/2004, que colocou à disposição do Supremo Tribunal Federal (STF) novas ferramentas a fim de firmar seu papel de Corte Constitucional, além de contribuir para melhorar a organização e a racionalidade dos trabalhos do Tribunal.

Ao promulgar a emenda, o Congresso Nacional levou em consideração que no Poder Judiciário, especialmente no Supremo, tramita um número massivo de processos idênticos e analisados em sequência. Portanto, procurou-se evitar que os milhares de casos análogos fossem julgados um a um.

Efeito multiplicador

A repercussão geral apresenta o chamado efeito multiplicador, ou seja, o de possibilitar que o Supremo decida uma única vez e que, a partir dessa decisão, uma série de processos idênticos seja atingida. O Tribunal, dessa forma, delibera apenas uma vez e tal decisão é multiplicada para todas as causas iguais.

No entanto, o ex-secretário-geral da Presidência do STF Luciano Fuck observa que “há casos com repercussão geral que são únicos, não precisam se multiplicar, e nem por isso deixam de ter relevância constitucional, mas precisam ser analisados sob o âmbito da repercussão geral”.

Desde 2007, com a implantação do instituto, a distribuição de processos no STF diminuiu em 71%. Segundo Luciano Fuck, essa redução permite à Corte se dedicar a temas relevantes.

Dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), divulgados em 2009, indicaram que 80 milhões de processos tramitam no Judiciário brasileiro. Potencialmente, cada um deles pode chegar ao Supremo, fato que demonstra a importância de racionalizar o procedimento e a organização dos trabalhos em todo o país.

Plenário Virtual

O Plenário Virtual é um sistema tecnológico criado pelo STF para que os ministros deliberem se determinada matéria tem ou não repercussão geral. Um ministro suscita a questão e os outros têm 20 dias para votar, se não se manifestarem neste prazo, o sistema considera que o ministro votou pela existência de repercussão. O Plenário Virtual funciona 24 horas por dia e os ministros podem acessá-lo remotamente, o que contribui para evitar a sobrecarga do plenário físico.

Durante sessão administrativa realizada em novembro de 2008, os ministros do Supremo decidiram que os julgamentos sobre existência de repercussão geral seriam abertos ao público. A consulta ao sistema do Plenário Virtual está disponível na internet pelo site do Supremo. O usuário pode acompanhar, em tempo real, o voto de cada ministro no julgamento sobre a existência de repercussão geral.
Até o momento, foram submetidos pouco mais de 300 assuntos constitucionais ao Plenário Virtual. Apenas 92 deles tiveram ausência de repercussão geral. Em 241 temas, o Supremo entendeu que havia repercussão e que era preciso consolidar o entendimento. Dessas questões, mais de 30% já foram julgadas definitivamente. “O Supremo está se dedicando muito a julgar e pacificar de vez essas questões”, disse o ex-secretário-geral da Presidência do STF.

Sobrestamento

Assim que o processo é incluído no Plenário Virtual, os recursos localizados nas instâncias inferiores que tenham o mesmo tema ficam sobrestados, ou seja, o andamento desses processos é suspenso para aguardar a decisão do Supremo. Uma vez que o STF resolve o mérito da questão, dizendo se é constitucional ou não determinada lei, por exemplo, todos esses recursos são decididos à luz do que o Supremo julgou, garantindo isonomia às decisões.

Luciano Fuck ressalta que nem sempre as partes entendem por que os recursos delas não foram escolhidos como leading case, ou seja, para representar determinada questão. Tal fato, conforme ele, não implica que esta parte não possa se manifestar no STF, “que sempre teve uma política muito aberta e cada vez mais transparente de receber memoriais ou inclusive intervenção de amicie curiae [amigos da Corte], que venham a dar suporte e aumentar os argumentos”.

Segundo ele, é muito comum que os ministros se ocupem dos memoriais na hora de decidir a questão da forma mais completa possível. “O fato de o seu processo ficar sobrestado na origem não quer dizer que você não possa participar da decisão do Supremo”, diz Fuck, salientando que o memorial é entregue de forma eletrônica e tem sido muito eficiente, alertando os ministros sobre várias questões e problemas que podem surgir no julgamento de mérito da questão com repercussão geral.

Decisão irrecorrível

Alterado depois da EC 45, o Código de Processo Civil (CPC) diz que a decisão que reconhece ou afasta a repercussão geral é irrecorrível. Dessa forma, tanto o reconhecimento quanto o julgamento do mérito, pelo plenário do Supremo - última instância do Judiciário brasileiro - é definitivo, impedindo a interposição de recurso ordinário. Eventualmente, cabem embargos de declaração para esclarecer um ponto ou outro ou superar uma omissão que tenha ocorrido.

Boas práticas

Por fim, Luciano destaca que boas práticas em relação ao instituto da repercussão geral estão surgindo no país inteiro. Os tribunais de origem, assim como o Supremo, estão tendo de se adaptar a essa nova mecânica da repercussão geral. “Houve um salto qualitativo importante, tendo em vista que os tribunais de origem passaram a prestar mais atenção aos julgamentos do Supremo”, finaliza.

Fonte: Supremo Tribunal Federal

JORNAL VALOR ECONÔMICO: ISENÇÃO - TRIBUTOS FEDERAIS - INSUMOS PARA FABRIÇÃO DESTINADA AO EXTERIOR- DRAWBACK REPOSIÇÃO DE ESTOQUE

Novo benefício tributário para matéria-prima já vale em fevereiro

O setor industrial terá isenção no pagamento de tributos federais tanto na compra de insumos para fabricação destinada ao exterior quanto para venda no mercado interno. O benefício tributário foi instituído por meio do Drawback Reposição de Estoque e será válido para a importação de matérias-primas e itens intermediários e para as compras que forem feitas de fornecedores nacionais. As condições do incentivo foram publicadas ontem no Diário Oficial da União na Portaria nº 3, em ato conjunto da Receita Federal e da Secretaria de Comércio Exterior (Secex). O benefício entrará em vigor no fim do mês de fevereiro.
Para ter acesso à isenção tributária, a indústria terá, primeiramente, que comprovar a importação de matéria-prima, insumo ou produto usado na fabricação de item destinado ao exterior. A empresa terá, também, que ter recolhido os tributos federais referentes a essa operação de importação.
Executados esses procedimentos, o fabricante solicitará à Secex, por intermédio das agências do Banco do Brasil, a habilitação ao Drawback Reposição de Estoque. Para isso, terá que pedir a isenção de tributos para a importação ou para a compra no mercado interno do mesmo item importado anteriormente (ou item equivalente), com o mesmo padrão de qualidade observado na primeira operação. Obtida a autorização, o fabricante terá um ano para fazer a compra. Se for importação, o industrial não recolherá o Imposto de Importacao, que tem alíquota média de 10%, o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), cuja maior alíquota é 20% e também o PIS/Cofins Importação, que tem alíquota de 9,25%. Se a compra do item for no mercado interno, o fabricante não pagará o IPI e o PIS/Cofins.
A isenção também se aplica à aquisição, no mercado interno ou externo, de mercadorias empregadas em reparo, criação, cultivo ou atividade extrativista de produto já exportado. A avaliação do governo é que com essas modificações o regime tributário da modalidade drawback direcionado à reposição de estoque será acionado com maior frequência por parte do setor industrial e também pela agroindústria, já que esse regime tributário poderá ser usado não somente para a fabricação de itens destinados à exportação, mas, também, para a produção que é destinada à demanda doméstica. O Drawback Reposição de Estoque estará em vigor em 60 dias a contar da data de hoje. Segundo informou a Receita Federal, a Secretaria de Comércio Exterior solicitou um prazo para a efetiva operacionalização do regime tributário, porque é necessário preparar os formulários e o sistema a partir dos quais os industriais solicitarão a habilitação ao novo regime. 



O texto do Diário Oficial explica que, tendo em vista que, para fins de procedimentos de defesa comercial, a República Popular da China não é considerada um país de economia predominantemente de mercado, determinou-se o valor normal utilizando-se como terceiro país de economia de mercado os Estados Unidos da América.



O secretário de Comércio Exterior, Welber Barral, ressaltou a luta do Brasil contra todo o tipo de protecionismo, inclusive, por parte da indústria nacional. Para ele, a prática é perniciosa e não deve ser adotada de forma alguma pelos brasileiros uma vez que o país, atualmente, é extremamente competitivo em vários setores.



Permitindo medidas protecionistas [por parte dos brasileiros], isso quer dizer que alguém vai usar medidas contra nós. Para o Brasil, interessa que as regras do jogo sejam cumpridas e, por isso, reclamamos tanto na OMC [Organização Mundial do Comércio], disse.



Sobre a vitória do Brasil na OMC, que considerou ilegais as medidas antidumping aplicadas pelos Estados Unidos (EUA) ao suco de laranja brasileiro em decisão ainda preliminar, Barral lembrou que o Brasil é o país em desenvolvimento que mais reclama sobre esse tipo de prática, graças à experiência acumulada ao longo dos anos nesse tipo de disputa.



Esse caso é um avanço no sentido de garantir as regras do jogo. O Brasil é um ator cada vez mais importante no comércio internacional e nos interessa que as regras sejam cumpridas, destacou Barral.



As duas partes podem recorrer da decisão dos árbitros da OMC. Só em fevereiro de 2011, a organização dará a palavra final sobre o assunto e poderá estabelecer retaliações comerciais aos EUA.



O Ministério do Desenvolvimento estima que o ano fechará com um aumento de 43,9% nas importações, ante crescimento de 30,7% nas exportações. O saldo comercial previsto para o ano é de US$ 16 bilhões, ante saldo de US$ 25,3 bilhões em 2009.



Barral informou que 46% das importações feitas em 2010 são referentes a insumo para a indústria. O principal produto importado do ano é petróleo: foram US$ 9 bilhões de janeiro a novembro.



No entanto, foram exportados US$ 19,4 bilhões do produto nesse período. Em seguida, vem o setor de automóveis. Foram US$ 7,6 bilhões de carros importados e US$ 4,8 bilhões em autopeças até novembro. Depois medicamentos, total de US$ 5,2 bilhões importados.



Fonte: Valor Econômico

ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOS DO ESTADO DE GOIÁS: BRASIL TEM OITO MIL CRIANÇAS À ESPERA DE ADOÇÃO

De acordo com o último balanço do Cadastro Nacional de Adoção (CNA), realizado pela Corregedoria Nacional de Justiça, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), 7. 949 crianças brasileiras estão aptas a serem adotadas. Ou seja, se encontram destituídas do poder familiar. Os dados, referentes ao dia 3 de dezembro de 2010, indicam também que há 30.378 pretendentes à adoção, já cadastrados.
São Paulo permanece na liderança como o estado com maior número de pretendentes à adoção: 8.020 para 1.538 crianças e adolescentes cadastradas. Já o Espírito Santo lidera em número de crianças e adolescentes à espera de uma nova família: são 2.194 para 493 candidatos a pais, no estado. Já o Distrito Federal indica uma relação mais equilibrada: são 522 pretendentes para 209 crianças aptas à adoção.
O Cadastro Nacional de Adoção foi criado em abril de 2009 para facilitar as adoções. Por meio desse instrumento, os juízes das varas da infância e da juventude recebem informações unificadas sobre os procedimentos de adoção e podem dar agilidade ao processo de adoção. O Cadastro possibilita ainda a implantação de políticas públicas na área.

TRT 3ª REGIÃO: INSS - RECONHECIMENTO DE VINCULO - AVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO - LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO

Até dezembro de 2004, a competência da Justiça do Trabalho se restringia à apreciação de conflitos trabalhistas decorrentes da relação de emprego, ou seja, da relação entre empregador e empregado. Com a edição da Emenda Constitucional 45/2004, houve uma ampliação do alcance da competência da Justiça do Trabalho, que passou a abranger também controvérsias originadas das relações de trabalho, inclusive aquelas relacionadas a questões previdenciárias. Em razão disso, o juiz José Eduardo de Resende Chaves Júnior, titular da 21ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, entendeu que a Justiça do Trabalho é competente para determinar ao INSS o reconhecimento e a averbação do tempo de serviço do reclamante, para fins previdenciários. Em conseqüência, o magistrado chamou, de ofício, o INSS para integrar o processo. Protestando contra a condenação imposta em 1º grau, o INSS sustentou que não participou da lide e que o reclamante não solicitou a sua inclusão, motivo pelo qual não pode ser compelido a cumprir obrigação determinada em processo do qual não foi parte. Além disso, segundo a sua tese, a Justiça do Trabalho é incompetente para julgar questão previdenciária. Entretanto, o juiz sentenciante discordou desses argumentos. Em sua sentença, o magistrado explicou que a Constituição de 1988 conferiu à Justiça do Trabalho o poder atrativo especial e determinante em relação ao trabalho humano. Mas nem sempre foi assim. A ordem constitucional que vigorava durante o regime militar conferia essa mesma força atrativa à Justiça Militar. Comparando essas duas fases históricas de mudanças na ordem constitucional, o juiz concluiu que o constituinte democrático conferiu ao Judiciário Trabalhista poder jurisdicional especial de tutela de um dos fundamentos da República, que é o valor-trabalho humano. Depois disso, foi editada a Emenda Constitucional 20/1998, que atraiu também a questão previdenciária para a tutela judiciária do trabalho. Esse panorama ficou ainda mais aprofundado com a edição da Emenda Constitucional 45/2004, que ampliou a competência da Justiça do Trabalho, reiterando, inclusive, a competência previdenciária. Na visão do magistrado, essa evolução legislativa demonstra que: "A ampliação de competência da Justiça do Trabalho não deve ser examinada exclusivamente pelo critério quantitativo (quantidade de categorias de trabalho que devam ser submetidas à competência trabalhista), mas, sobretudo, a partir do critério qualitativo desse aumento de competência, concebido enquanto aumento de intensidade da proteção ao trabalho humano" .  A sentença traz, em seus fundamentos, a tese de que, nos casos em que se postula vínculo de emprego perante a justiça trabalhista, há litisconsórcio necessário por força de lei, sob pena de caracterizar-se o enriquecimento sem causa, já que o recolhimento previdenciário decorrente da sentença trabalhista corresponde ao reconhecimento, pelo INSS, da existência da relação jurídica de emprego declarada judicialmente. O conteúdo do artigo 47 do Código de Processo Civil, aplicado ao caso pelo juiz, define a figura do litisconsórcio necessário: "Há litisconsórcio necessário, quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo". Foi com base nesse dispositivo legal, aplicável como apoio ao processo trabalhista, que o magistrado decidiu citar, de ofício, o INSS para integrar a lide.
No caso analisado pelo juiz, o reclamante, que morava em uma instituição beneficente, foi contratado como ajudante de carregador por uma empresa do ramo de agenciamento de mudanças. Não houve anotação da sua carteira de trabalho, nem recolhimento dos depósitos em sua conta vinculada ou para fins previdenciários. Identificando a presença de todos os elementos caracterizadores da relação de emprego, o juiz de 1º grau reconheceu o vínculo entre as partes, acolheu o pedido de rescisão indireta do contrato de trabalho, devido ao descumprimento de obrigações contratuais por parte da empregadora e condenou o INSS a reconhecer e averbar o tempo de serviço do trabalhador para fins previdenciários. ( nº 01289-2008-021-03-00-4 )

INSTRUÇÃO NORMATIVA RFB Nº 1103/2010: DECLARAÇÃO SIMPLIFICADE DA PESSOA JURÍDICA INATIVA 2011

DSPJ - Inativa 2011- Aprovadas as normas para apresentação

Foram aprovadas as normas para a apresentação da Declaração Simplificada da Pessoa Jurídica (DSPJ) - Inativa 2011, pelas pessoas jurídicas que permaneceram inativas durante todo o ano-calendário de 2010, assim como por aquelas que forem extintas, cindidas parcial ou totalmente, fusionadas ou incorporadas durante o ano-calendário de 2011 e que permanecerem inativas de 1º.01.2011 até a data do evento.
Considera-se pessoa jurídica inativa aquela que não tenha efetuado qualquer atividade operacional, não operacional, patrimonial ou financeira, inclusive aplicação no mercado financeiro ou de capitais, durante todo o ano-calendário.O pagamento, no ano-calendário a que se referir a declaração, de tributo relativo a anos-calendário anteriores e de multa pelo descumprimento de obrigação acessória não descaracteriza a pessoa jurídica como inativa no ano-calendário.A DSPJ - Inativa 2011 deve ser entregue no período de 03.01 a 31.03.2011 (até as 23h59min59s) por meio do site da Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB) na Internet (www.receita.fazenda.gov.br). No entanto, a declaração relativa a evento de extinção, cisão parcial, cisão total, fusão ou incorporação, ocorrido no ano-calendário de 2011, deve ser entregue pela pessoa jurídica extinta, cindida, fusionada ou incorporada até o último dia útil do mês subsequente ao do evento.Com a apresentação da DSPJ - Inativa 2011, não serão aceitas, para o mesmo número de inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ), as seguintes declarações referentes ao ano-calendário de 2009:

a) Declaração do Imposto de Renda Retido na Fonte (Dirf);
b) Declaração de Informações Econômico-Fiscais da Pessoa Jurídica (DIPJ); e
c) Declaração de Serviços Médicos e de Saúde (Dmed).
As microempresas (ME) e as empresas de pequeno porte (EPP) optantes pelo Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Simples Nacional) que permaneceram inativas durante o período de 1º.01 a 31.12.2010 ficam dispensadas da apresentação da DSPJ - Inativa 2011. Nesse caso, a pessoa jurídica deve apresentar a Declaração Anual do Simples Nacional (DASN 2011), com a opção de inatividade assinalada.

STJ: PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA

Está mantida a prisão de um homem e uma mulher acusados de furtar 30 barras de chocolate (dez da Garoto, dez da Lacta e dez de Diamante Negro) e um isqueiro Bic. A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou habeas corpus à dupla porque os bens, ainda que devolvidos à vítima, alcançavam o valor de quase 50% do salário mínimo.O furto, ocorrido em 2008, na cidade de Passo Fundo (RS), só não foi consumado porque a dupla foi flagrada colocando alguns objetos na bolsa de uma e na cintura do outro.
A relatora do habeas corpus, ministra Maria Thereza de Assis Moura, destacou que o STJ e o Supremo Tribunal Federal (STF) têm jurisprudência de que a incidência do princípio diz respeito a fatos dotados de mínima ofensividade, desprovidos de periculosidade social, de reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e que a lesão jurídica provocada seja inexpressiva. Contudo, no caso em questão, apesar de a vítima ser um supermercado, não tendo ocorrido efetivo prejuízo, visto que a mercadoria foi recuperada, não se pode esquecer que à época do furto – fevereiro de 2008 – o valor dos bens furtados (R$ 178,40) era apenas um pouco inferior à metade do salário mínimo (R$ 360). HC 133991

RESOLUÇÃO NORMATIVA CNIg nº 92/2010: ESTRANGEIROS - CIENTISTA - PROFESSOR - PESQUISADOR - SOLICITAÇÃO DE VISTO

RESOLUÇÃO NORMATIVA CNIg nº 92/2010 - DOU: 23.12.2010

Altera dispositivo na Resolução Normativa nº 82, de 03 de dezembro de 2008.

O Conselho Nacional de Imigração, instituído pela Lei nº 6.815, de 19 de agosto de 1980 e organizado pela

Lei nº 10.683, de 28 de maio de 2003, no uso das atribuições que lhe confere o Decreto nº 840, de 22 de

junho de 1993,

Resolve:

Art. 1º O art. 3º da Resolução Normativa nº 82, de 03 de dezembro de 2008 passa a vigorar com a seguinte

redação:

"Art. 3º Quando se tratar de atividades de cooperação científico-tecnológica, de que trata o inciso II do art. 1º desta Resolução Normativa, desde que não associadas à bioprospecção, o pedido de autorização do início das atividades e da participação da equipe estrangeira deverá ser formulado junto ao Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), nos termos da legislação em vigor.

§ 1º Quando da solicitação de visto previsto no caput deste artigo, o interessado deverá apresentar, à
autoridade consular, cópia da Portaria do Ministro de Estado da Ciência e Tecnologia, que autorizou a
atividade de sua participação, publicada no Diário Oficial da União.

§ 2º A exigência de apresentação de cópia da Portaria poderá, a critério do Ministério da Ciência e
Tecnologia, ser substituída por ato de autorização específico, nos termos de regulamento. "

Art. 2º Esta Resolução Normativa entra em vigor na data de sua publicação.

PAULO SÉRGIO DE ALMEIDA

Presidente do Conselho

RESOLUÇÃO NORMATIVA CNGIg Nº 93/2010: ESTRANGEIROS - VÍTIMAS DE TRÁFICO DE PESSOAS - VISTO PERMANENTE - CONCESSÃO

RESOLUÇÃO NORMATIVA CNIg nº 93/2010 - DOU: 23.12.2010

Dispõe sobre a concessão de visto permanente ou permanência no Brasil a estrangeiro considerado

vítima do tráfico de pessoas.

O Conselho Nacional de Imigração, instituído pela Lei nº 6.815, de 19 de agosto de 1980 e organizado pela

Lei nº 10.683, de 28 de maio de 2003, no uso das atribuições que lhe confere o Decreto nº 840, de 22 de
junho de 1993,

Resolve:

Art. 1º Ao estrangeiro que esteja no Brasil em situação de vulnerabilidade, vítima do crime de tráfico de
pessoas, poderá ser concedido visto permanente ou permanência, nos termos do art. 16 da Lei nº 6.815, de 19de agosto de 1980, que será condicionado ao prazo de um ano.

§ 1º A partir da concessão do visto a que se refere o caput, o estrangeiro estará autorizado a permanecer no Brasil e poderá decidir se voluntariamente colaborará com eventual investigação ou processo criminal em curso.

§ 2º A concessão do visto permanente ou permanência poderá ser estendida ao cônjuge ou companheiro,
ascendentes, descendentes e dependentes que tenham comprovada convivência habitual com a vítima.

Art. 2º Para fins desta Resolução, será considerado tráfico de pessoas, conforme definido no Protocolo
Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em especial Mulheres e Crianças: "O recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra para fins de exploração".

Parágrafo único. Para fins do disposto no caput, o termo "exploração" incluirá, no mínimo, a exploração da
prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, escravatura
ou práticas similares à escravatura, a servidão ou a remoção de órgãos.

Art. 3º O pedido, objeto desta Resolução, oriundo das autoridades policial ou judicial ou do Ministério
Público que tenham a seu cargo uma persecução criminal em que o estrangeiro seja vítima, será
encaminhado ao Ministério da Justiça que poderá autorizar, de imediato, a permanência dos que estejam em situação migratória regular no País.

Parágrafo único. Na hipótese de o estrangeiro encontrar-se em situação migratória irregular, o Ministério da
Justiça diligenciará junto ao Ministério das Relações Exteriores para a concessão do respectivo visto no
Brasil, nos termos da Resolução Normativa nº 9, de 10 de novembro de 1997.

Art. 4º Até trinta dias antes do término do prazo de estada autorizado na forma do art. 1º, o estrangeiro
deverá manifestar, a uma das autoridades públicas envolvidas na persecução criminal, a intenção de
permanecer no Brasil e se está disposto a colaborar voluntária e efetivamente com eventual investigação ou
processo criminal em curso.

Parágrafo único. Na hipótese prevista no caput deste artigo, a respectiva autoridade informará a manifesta
vontade do estrangeiro ao Ministério da Justiça, que decidirá pela prorrogação, no limite do art. 18 da Lei nº6.815, de 1980.

Art. 5º Os órgãos públicos envolvidos no atendimento às vítimas de tráfico de pessoas poderão encaminhar
parecer técnico ao Ministério da Justiça recomendando a concessão de visto permanente ou permanência nos termos desta Resolução.

§ 1º Para fins do disposto no caput, serão aceitos os pareceres técnicos encaminhados por meio dos órgãos relacionados abaixo, de acordo com sua competência:

I - Secretaria Nacional de Justiça do Ministério da Justiça;

II - Núcleos de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas;

III - Postos Avançados de serviços de recepção a brasileiros(as) deportados(as) e não admitidos(as) nos
principais pontos de entrada e saída do País;

IV - Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República; e

V - Serviços que prestem atendimento a vítimas de violência e de tráfico de pessoas.

§ 2º O parecer técnico a que se refere o caput deste artigo deverá estar fundamentado à luz da Política
Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, aprovada pelo Decreto nº 5.948, de 26 de outubro de
2006, especificando os indícios de que o estrangeiro se enquadra na situação de vítima de tráfico de pessoas.

Art. 6º O pedido a que alude o art. 5º será encaminhado com brevidade ao Conselho Nacional de Imigração,que decidirá sobre a concessão de permanência ou visto permanente na forma do art. 1º desta Resolução.

Parágrafo único. O pedido a que se refere o caput será analisado à luz dos seguintes requisitos:

I - que o estrangeiro esteja numa situação de vulnerabilidade social ou econômica ou psicológica, dentre
outras, que, no seu país de origem, possibilite uma revitimização, independentemente de colaborar com a
investigação ou processo criminal; ou
II - que o estrangeiro, na condição de vítima do crime de tráfico de pessoas, esteja coagido ou exposto a
grave ameaça em razão de colaborar com a investigação ou processo criminal no Brasil ou em outro país; ou
III - que, em virtude da violência sofrida, necessita de assistência de um dos serviços prestados no Brasil,
independentemente de colaborar com a investigação ou processo criminal.

Art. 7º Para instrução do pedido na forma desta Resolução, deverão ser juntados os seguintes documentos,
além de outros que possam ser necessários à análise do pleito:

I - passaporte ou documento de viagem válido, podendo ser substituído por documento constante da Decisão CMC nº 18/2008, se nacional de qualquer dos Estados Parte ou Associados do MERCOSUL;

II - declaração sob as penas da lei de que não responde a processo nem possui condenação penal no Brasil nem no exterior; e

III - declaração de dependentes.

Art. 8º Esta Resolução Normativa entra em vigor na data de sua publicação.

PAULO SÉRGIO DE ALMEIDA

Presidente do Conselho

TRT3ª REGIÃO: RESCISÃO DO CONTRATO DE TRABALHO

Na Vara do Trabalho de Sabará ocorreu uma situação especial em que a juíza Rosemary de Oliveira Pires se viu diante de um impasse e precisou utilizar sua capacidade de análise e experiência como julgadora, a fim de buscar a verdade real do processo. É que, segundo as alegações do reclamante, o preposto da empresa teria fugido com o dinheiro da rescisão e teria dito que o trabalhador não receberia nada. Por sua vez, a empresa tentou convencer a juíza de que a rescisão foi baseada em pedido de demissão do reclamante, o qual, insatisfeito e arrependido, recusou-se a receber os valores devidos, danificou o patrimônio da reclamada e agrediu o preposto, que, por isso, teria fugido do local. O episódio não foi presenciado por ninguém. Diante da fragilidade das provas existentes, restou a palavra do empregado contra a palavra da empregadora. Então, a partir da análise dos indícios, a magistrada descobriu quem estava com a razão e encontrou uma solução para o problema.De acordo com a versão apresentada pelo reclamante, a sua intenção inicial era reivindicar a rescisão indireta do contrato de trabalho, em virtude de atraso salarial. Mas, no dia 27/08/2009, ele foi chamado pela empregadora para realizar um acerto amigável, no qual seria dispensado sem justa causa. O reclamante, que trabalhava como ajudante de caminhão, relatou que, após ter assinado todos os documentos referentes ao acordo amigável, o representante da empresa fugiu do local levando o dinheiro do trabalhador e dizendo que ele não receberia nada. A empresa afirmou que o ex-empregado pediu demissão, mas se arrependeu depois que teve ciência dos valores menores que receberia, ficando insatisfeito pelo fato de ter que indenizar o aviso prévio ao empregador, pois não seria trabalhado. Em razão disso, ele desrespeitou o representante da empresa, fazendo-lhe ameaças, e se recusou a receber os valores devidos. Acrescentou a reclamada que o ex-empregado, em acesso de raiva, causou muitos transtornos e prejuízos materiais à empresa e ainda acionou as polícias civil e militar para registrar boletim de ocorrência. Por esses motivos, a empresa aplicou justa causa ao trabalhador. Examinando as poucas provas existentes, a juíza estranhou o fato de o termo de rescisão do contrato de trabalho apresentar como data de afastamento o dia 26/08/2009, ou seja, um dia antes da data relatada nos depoimentos de ambas as partes. Por isso, ela considerou o documento inválido. Conforme observou a magistrada, tudo indica que havia interesse do reclamante em sair da empresa, já que ele mesmo afirmou que foi chamado para realizar um acerto amigável, no qual, entretanto, seria dispensado sem justa causa, ou seja, supunha que sua saída não lhe traria prejuízo em suas verbas rescisórias. A partir dessa observação, a magistrada identificou alguns erros no procedimento rescisório realizado pela empresa: se a saída do reclamante era pra ser na modalidade de demissão, a reclamada deveria ter esclarecido melhor a ele sobre os efeitos do pedido de demissão, inclusive em relação à necessidade de cumprimento de aviso prévio trabalhado, se ele quisesse. Portanto, a empresa não poderia impor ao ex-empregado o desconto imediato do valor integral do aviso, tirando dele o direito de trabalhar durante o período.

Outro detalhe que chamou a atenção da juíza foi o fato de haver empregados trabalhando na empresa no horário em que o acerto estava sendo realizado. "Desta forma, quando a reclamada fez a reunião de acerto com o autor em suas dependências deveria ter melhor se acautelado, seja esclarecendo ao autor as conseqüências da rescisão, seja, ao verificar sua discordância, suspender a rescisão ou, pelo menos, convocar outros empregados para participar como testemunhas do que ali estava ocorrendo para que todo o processo de rescisão ficasse absolutamente claro e transparente com relação à lisura dos atos da reclamada, demonstrando que esta não tinha qualquer intenção de lesar o autor em seus direitos, não se aproveitando da condição de hipossuficiente deste e do inegável desconhecimento e despreparo do obreiro em matéria de direitos trabalhistas, sabido que a empresa possui pelo menos um mínimo de conhecimento contábil e jurídico acerca da matéria", ponderou a magistrada. Assim, concluindo que não ficou comprovada a condição de demissionário do reclamante, a juíza de 1º grau afastou a justa causa aplicada ao trabalhador, condenando a empregadora a pagar-lhe as verbas rescisórias típicas da dispensa imotivada. ( nº 00930-2009-094-03-00-4 )

TJSP: VIAGENS DE MENORES - CRUZEIRO MARÍTIMOS - AUTORIZAÇÃO PARA VIAGEM NACIONAL - CRIANÇA

Coordenadoria da Infância e da Juventude


Coordenadoria da Infância e da Juventude

PROTOCOLO CIJ Nº 145944/10 – CRUZEIROS MARÍTIMOS –

AUTORIZAÇÃO PARA VIAGEM NACIONAL – CRIANÇA ACOMPANHADA

DE UM DOS PAIS, OU ADOLESCENTE – DESNECESSIDADE – FIEL

OBSERVÂNCIA DAS DISPOSIÇÕES DO ECA – SUFICIÊNCIA.

Incumbiu-nos Vossa Excelência a elaboração de parecer acerca do tema, que

trouxe séria preocupação a essa Coordenadoria e, em especial, aos Juízes da

Infância e da Juventude.

Trata-se de questão de relevância, especialmente pelo início da temporada de

cruzeiros marítimos e dos transtornos que poderão advir às crianças e

adolescentes, caso persista a exigência feita por determinada empresa de

navegação civil, no sentido de exigir, no rol dos documentos especificados, a

autorização de um dos pais quando a criança ou adolescente viajar somente na

companhia do outro e, a agravar, está a se exigir a autorização também para

adolescente, mesmo se tratando de viagem dentro do território nacional.

No caso concreto que chegou ao nosso conhecimento, a companhia de

navegação exige autorização paterna para uma adolescente viajar somente na

companhia da genitora, em cruzeiro com saída do Porto de Santos e destino a

Ilhabela, Búzios, Ilhabela e retorno a Santos, com duração de quatro dias.

Ab initio, mister consignar que na hipótese de cruzeiros destinados a outros

países, caracterizando viagem internacional, de se cumprir a Resolução n.

74, de 28 de abril de 2009, do Conselho Nacional de Justiça – CNJ.

No tocante às viagens nacionais, a exigência da companhia é absolutamente

ilegal e esbarra em conduta típica, esta a ser mais bem investigada, em sede

policial.

Isso porque a Lei n. 8069/90 – Estatuto da Criança e Adolescente (ECA), em

seu art. 83, regulamenta a viagem nacional, deixando claro, em primeiro lugar,

ser inexigível qualquer autorização a adolescente, assim definido como a

pessoa com doze anos completos e dezoito anos de idade incompletos (ECA,

art. 2º), vale dizer, dentro do território nacional, o adolescente pode viajar para

qualquer lugar e por qualquer meio de transporte, independentemente de

qualquer autorização, de modo que assente a ilegalidade da exigência feita

pela companhia de navegação civil.

Absurdo e ilegal, para se dizer o mínimo, exigir-se autorização de um dos pais,

quando, na companhia do outro, o filho

menor viajar, máxime em se tratando de adolescente.

Nesse diapasão, no respeitante a adolescente, em sendo a viagem dentro do

território nacional, nem a companhia dos pais ou responsável pode ser exigida

e, como corolário, não há de se falar em autorização destes ou judicial.

Em suma, dentro do território nacional, a lei autoriza o adolescente a viajar

sozinho. Tangentemente à criança (pessoa com até doze anos incompletos),

basta que esteja acompanhada de um dos pais, independentemente da

autorização do outro, ou do responsável legal, de maneira que, nessas

condições, igualmente, não há de se excogitar de autorização dos pais ou

judicial.

E mais, na conformidade da lei, viajando a criança na companhia de

ascendente ou colateral maior, até o 3º (terceiro) grau, comprovado

documentalmente, ou de pessoa maior, expressamente autorizada pelo pai,

mãe ou responsável, ex vi do art. 83, § 1º, alínea “b”, ns. 1 e 2, do ECA,

dispensável qualquer outra exigência para a viagem.

Note-se, para afastar átimo de dúvida, que a criança pode viajar até mesmo

com pessoa maior, não-parente, desde que o pai ou a mãe, bem assim o

responsável legal (entenda-se o guardião nomeado judicialmente ou o tutor)

expressamente (por escrito) autorize. É o quanto basta, por força de lei. Nada

mais!

Com efeito, nas situações supra mencionadas, toda e qualquer autorização de

viagem exigida deve ser reputada ilegal e, a persistir a exigência, em tese,

caracterizado o crime de constrangimento ilegal, na forma do art. 146 do

Código Penal.

Argumenta-se, de outra sorte, que o contrato de transporte marítimo tem

natureza híbrida, porquanto abarca o transporte e a hospedagem.

E, de fato, assim o é, todavia não se pode exigir nenhuma autorização, por

força do disposto em lei.

Explica-se. O ECA, ao regulamentar a prevenção especial de proteção à

violação de direitos e garantias da criança ou

adolescente (Título III, Capítulo II, Seção II), assim especifica, no tocante à

temática em comento:

Art. 82. É proibida a hospedagem de criança ou adolescente em hotel, motel,

pensão ou estabelecimento congênere, salvo se autorizado ou acompanhado

pelos pais ou responsável.

No dizer da lei, com autorização dos pais – expressamente, é claro – a criança

ou adolescente pode se hospedar desacompanhado.

O ponto relativo à hospedagem acompanhado dos pais ou responsável

reclama singela interpretação.

Quanto ao responsável (repete-se, guardião judicial ou tutor) a lei é clara,

dispensando outros comentários.

No particular aos pais, a despeito de a lei aparentar exigir a presença ou a

autorização de ambos, a vontade do legislador, a toda evidência, foi outra, no

sentido de vedar a hospedagem sem a companhia ou a autorização do pai ou

da mãe, máxime porque o poder familiar é exercido em igualdade de condições

pelo pai e pela mãe; dí-lo o art. 21 do ECA.

Nesse sentir, estando a criança ou adolescente autorizado por ou na

companhia de um dos detentores do poder familiar, não há empeço para a

hospedagem.

A lei parte da boa e saudável presunção de que os detentores do poder familiar

sempre agirão na proteção do filho menor (vide, verbi gratia, o art. 1.634 do

Código Civil), razão pela qual não cabe a terceiros estranhos à relação familiar

questionarem a idoneidade dos pais, id est, no que toca à temática vertente,

indevida a interferência de terceiros no exercício do poder familiar, quando a

criança ou adolescente se hospedar na companhia do pai ou da mãe.

Ademais, insta destacar, por relevante, que o escopo do legislador, ao editar a

citada norma, iniludivelmente, foi distinto do aqui comentado.

Sob esse enfoque, objetivou o legislador coibir a prática sexual por criança ou

adolescente e até mesmo a prostituição infantil em estabelecimentos

destinados a hospedagem, e não o controle do poder familiar.

Procura-se evitar, nestes tempos permissivos, a prostituição infanto-juvenil

(ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE COMENTADO – Munir

Cury, Coordenador – p. 350 – art. 82 – 10ª ed. – Malheiros), pois a espécie de

hospedagem que se quer evitar é aquela destinada a relacionamento sexual

(COMENTÁRIOS AO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE –

Roberto João Elias – p. 99 – art. 82 – 4ª ed. – Saraiva), de modo que há que se

restringir, sem dúvida, a hospedagem de criança ou adolescente em motéis,

locais, esses, destinados a encontro de casais, transformados em verdadeiras

casas de prostituição (COMENTÁRIOS AO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO

ADOLESCENTE – Wilson Donizeti Liberati – p. 63 – art. 82 – 10ª ed. –

Malheiros).

Destarte, conforme a doutrina, o objeto jurídico tutelado é a proteção da

atividade sexual da criança ou adolescente; logo, a norma não se destina a

limitar o exercício do poder familiar.

Diante do alinhavado, conclui-se que a exigência de autorização dos pais,

conjunta ou individualmente, ou judicial, suprindo o consentimento, para

permitir a viagem dentro do território nacional de criança acompanhada por

um dos pais ou por seu responsável legal, ou adolescente, sob qualquer

prisma, é manifestamente ilegal e, hipoteticamente, caracteriza fato típico.

Em remate, visando a apurar a origem dessa exigência, pesquisando na

internet, observamos que diversas agências de turismo invocam a norma

administrativa “DAC 107- 1002” (na verdade, IAC 107-1002), expedida pelo

Departamento de Aviação Civil do Ministério da Aeronáutica, cuja

inaplicabilidade é assente, já que, por óbvio, não guarda nenhuma pertinência

com transporte marítimo.

Não obstante isso, essa norma administrativa foi expressamente revogada pela

Resolução n. 54, de 04 de setembro de 2008, da Agência Nacional de Aviação

Civil – ANAC, que, de seu turno, foi revogada pela Resolução n. 130, de 08 de

dezembro de 2009, também da ANAC, ainda vigente, conforme resultou das

nossas pesquisas, que bem se adequou à legislação aplicável à espécie, não

se imiscuindo em questões externas à sua órbita de atuação, porquanto se

limita a especificar os procedimentos de identificação nos embarques

(nacionais ou internacionais) de brasileiros e estrangeiros, bem como o

tratamento especial a ser dispensado a criança ou adolescente e ao índio,

conforme, ao que interessa, dispõe seu art. 3º, § 4º, ns. I e II, in verbis: Art. 3º

Constituem documentos de identificação de passageiro de nacionalidade

brasileira:

§ 4º Em se tratando de criança ou adolescente:

I - no caso de viagem em território nacional e se tratando de criança, deve

ser apresentado um dos documentos previstos no caput ou certidão de

nascimento do menor – original ou cópia autenticada – e documento que

comprove a filiação ou parentesco com o responsável, observadas as demais

exigências estabelecidas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e

pela Vara da Infância e Juventude do local de embarque (grifamos).

Bem de ver que a ANAC, ao regulamentar a viagem em território nacional, por

via aérea, teve o cuidado de recomendar a observância das exigências legais

(ECA) e as eventuais do Juízo da Infância e da Juventude do local do

embarque, em se tratando de criança, não fazendo qualquer menção a

adolescente, por força do art. 83 do ECA (repetindo: dentro do território

nacional, a lei autoriza o adolescente a viajar sozinho, independentemente de

autorização dos pais, responsável ou judicial).

Do exposto, submetemos a Vossa Excelência o presente parecer e, se

aprovado, tomamos a liberdade de sugerir:

1. sua publicação no Diário Oficial da Justiça para conhecimento público e, em

especial, dos Juízos da Infância e da Juventude, com recomendação a estes

para, respeitada a livre convicção, autorizarem as viagens, a fim de não se

causar óbices aos jurisdicionados, mas requisitando a instauração de inquérito

policial, hipoteticamente pela prática do crime capitulado no art. 146 do Código

Penal, bem assim enviando cópias pertinentes a Promotoria de Justiça;

2. expedição de ofício ao Conselho Nacional de Justiça – CNJ para, nos

moldes da Resolução n. 74/2009, se assim se entender, regulamentar a

questão no âmbito nacional;

3. oficiar ao Centro de Apoio Operacional da Infância e Juventude (CAO da

Infância) do Ministério Público para as providências pertinentes às suas

atribuições legais.

Sub censura.

São Paulo, 15 de dezembro de 2010.

LUIZ CARLOS DITOMMASO

EDUARDO REZENDE MELO

Juízes da Coordenadoria da Infância e da Juventude

DECISÃO: De acordo: Data supra.

(a) Desembargador ANTONIO CARLOS MALHEIROS, COORDENADOR DA

INFÂNCIA E DA JUVENTUDE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE

SÃO PAULO

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

JORNAL VALOR ECONÔMICO: STF - MULTA ABUSIVAS - REPERCUSSÃO GERAL

VALOR ECONÔMICO - LEGISLAÇÃO & TRIBUTOS




Supremo definirá limite de multas





No início do ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) selecionou o processo de uma empresa de engenharia e mineração que contesta o pagamento de uma multa de 20% por atraso no recolhimento do ICMS - cobrada pela Secretaria da Fazenda de São Paulo - para repercussão geral. Isso quer dizer que o julgamento influenciará todos os outros que tenham o mesmo tema, podendo colocar um ponto final na polêmica do que seria multa confiscatória. Enquanto o processo não é julgado, tribunais de Estados como Goiás e Pernambuco vêm derrubando essas penalidades ao declará-las inconstitucionais.



O precedente mais citado nesses processos é um julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) relativo a uma multa mínima de 200%, pelo não-recolhimento de ICMS, aplicada pelo Estado do Rio de Janeiro. A ação foi ajuizada pelo governador do Rio contra a Assembleia Legislativa do Estado, que criou a multa. Os ministros a declararam inconstitucional. "A desproporção entre o desrespeito à norma tributária e sua consequência jurídica, a multa, evidencia o caráter confiscatório desta, atentando contra o patrimônio do contribuinte, em contrariedade ao texto constitucional federal", diz a decisão. A Constituição veda aos Estados usar tributos com efeito de confisco.



A Secretaria da Fazenda do Rio informou que suas multas chegam, no máximo, a 120%, no caso de crime contra a ordem tributária. Por nota, esclareceu ainda que incidem sobre o imposto, "portanto, jamais podendo caracterizar o confisco, que, em tese, materializa-se quando a multa supera o valor da operação".



A 2ª Turma da 6ª Câmara do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJ-GO), por exemplo, declarou inconstitucional o dispositivo do Código Tributário de Goiás que impunha multa de até 300%. Na prática, os desembargadores anularam autos de infração correspondentes a uma dívida de R$ 650 mil, cuja multa atingiu cerca de R$ 1,4 milhão.



Para o advogado responsável pela causa, Uarian Ferreira, do escritório Uarian Ferreira Advogados, o Judiciário começou a perceber que os controles sobre o pagamento de tributos cresceram, não cabendo mais essas medidas radicais. "Agora, os magistrados anulam a autuação. Antes, só excluiam o excesso da multa", afirma o advogado. A expectativa de Ferreira é que a nova leva de decisões mude a perspectiva de atuação dos agentes fiscais do Estado, evitando custos com processos judiciais.



Para a Procuradoria do Estado de Goiás, essa é uma interpretação equivocada do Judiciário. O procurador do Estado, Jorge Luís Pinchemel, defende que o princípio da vedação de confisco tem que ser aplicado em termos. "O objetivo da multa é de prevenção ou punitiva para que aquele que infringiu a norma não torne a infringir", explica. "Se você retira esse peso, acaba com o caráter coercitivo da multa, criando espaço para o aumento da sonegação", afirma o procurador.



Em Pernambuco, a 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado (TJ-PE) afastou multa aplicada à empresa por uso de créditos do ICMS considerados inexistentes. O Decreto nº 14.876, de 1991, impõe multa de 300% do valor do tributo, quando o débito, apurado em auto de infração, for de responsabilidade do contribuinte que o houver retido antecipadamente. A Fazenda aplicou tal multa, mas o TJ-PE caracterizou a penalidade como confiscatória. "São ações ajuizadas com base na decisão do Supremo referente ao Rio de Janeiro", diz a advogada Mary Elbe Queiroz, do escritório Queiroz Advogados.



Segundo o advogado Júlio de Oliveira, do escritório Machado Associados, um cliente do setor de comércio de eletrônico foi autuado pela Fazenda de São Paulo para pagar uma multa de 100% do valor de crédito de ICMS que teira sido indevidamente utilizado. "Entramos com recurso administrativo porque a multa é confiscatória", diz. Mas como o tribunal administrativo não pode julgar constitucionalidade, o Judiciário é que deverá definir se seria o caso de confisco. A Secretaria da Fazenda de São Paulo foi procurada pelo Valor, mas não deu retorno até o fechamento da edição.



Discussão vale para tributos federais



No Supremo Tribunal Federal (STF) também há casos a serem julgados sobre multas confiscatórias relativos a tributos federais, como o Imposto de Renda. Por esse motivo, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) pediu para ser "amicus curiae" ou parte interessada no processo de repercussão geral sobre confisco, no caso de cobrança do ICMS por São Paulo, que está para ser julgado pela Corte.



Em abril deste ano, por exemplo, a 2ª Turma do Supremo julgou um recurso da União contra uma indústria de calçados do Estado de Minas Gerais. A decisão foi favorável ao contribuinte. Em votação unânime, os ministros decidiram que "a mera alusão à mora, pontual e isoladamente considerada, é insuficiente para estabelecer a relação de calibração e ponderação necessárias entre a gravidade da conduta e o peso da punição".



No acórdão, os ministros lembraram que a Corte já teve a oportunidade de considerar adequada a redução de multa por atraso no pagamento de tributo, de 60% para 30% sobre o valor do débito.



O advogado Eduardo Botelho Kiralyhegy, do escritório Negreiro, Medeiros & Kiralyhegy Advogados, diz que hoje, 100% dos processos em trâmite no STF que tratam sobre confisco estão parados em razão da repercussão geral. Existe uma discussão, por exemplo, se é confiscatório cobrar a multa sobre o valor total do imposto, ao invés de só cobrar sobre a diferença não paga. "No caso de mero atraso, por erro, cabe uma multa de 60%? Isso pode ficar claro após o julgamento da repercussão geral", afirma.



Laura Ignacio - De São Paulo


COMENTÁRIO: HÁ MUITO QUE NOS PRECISAMOS DE UMA LEGISLAÇÃO NA ÁREA TRIBUTÁRIA, NO TOCANTE A MULTAS, POIS OS VALORES SÃO ABUSIVOS E CHEGAM MUITAS VEZES A LEVAREM EMPRESAS A FALÊNCIA. DEMONSTRANDO QUE TAL PRÁTICA É CONTRAPRODUCENTE POIS ACABAM DESTRUINDO UMA FONTE DE ARRECADAÇÃO TRIBUTÁRIA. QUABRANDO EMPRESAS E DEMOLINDO POSTOS DE TRABALHO. ASSIM HÁ NECESSIDADE DE UMA LEI DE ABRANGÊNCIA NACIONAL SOBRE A APLICAÇÃO DE MULTAS, JUROS E ATUALIZAÇÃO DE VALORES QUE SEJA COERENTE, PONDERADA, NÃO DESCAPITALIZE EMPRESAS E PRINCIPALMENTE QUE SEJA PAGÁVEL. DR. HERMES VITALI

JORNAL O GLOBO: CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - APROVAÇÃO NO SENADO

O GLOBO - PAÍS




Senado aprova Código de Processo Civil





O Senado aprovou nesta quarta-feira projeto que revê o Código de Processo Civil. O novo texto, que ainda precisa ser apreciado na Câmara antes de seguir para sanção presidencial, acaba com alguns tipos de recurso; determina o cumprimento imediato das decisões de primeira instância; estimula a conciliação; e institui uma fila de processos nos tribunais, que poderá ser acompanhada pelos interessados. Os advogados perdem exclusividade em algumas funções, mas ganham outras.



De autoria do senador José Sarney (PMDB-AP), o projeto foi apreciado em plenário no fim da noite. São 1.007 artigos, com potencial para alterar substancialmente a rotina no Judiciário. Processos sobre indenizações, contratos, despejos e cobranças não começarão mais com a convocação do réu para apresentar sua contestação. O primeiro passo será uma audiência de conciliação. Advogados e outros profissionais, como psicólogos, poderão atuar na busca de solução.



Cria-se nas varas a ordem cronológica de processos. Quando não houver mais provas a produzir, a causa entra numa fila, que poderá ser acompanhada pelos interessados. Trata-se de um critério de transparência. Isso não significa, contudo, que a ordem de chegada determinará a prazo do julgamento, pois cada ação passa por estágios distintos.



Dois tipos de recurso - o agravo retido e o embargo infringente - são extintos. Já os recursos de apelação deixam de ter efeito suspensivo. Significa que, julgado o caso na primeira instância, a execução é imediata, apesar do recurso.



- A suspensão (da execução) só vai ocorrer por decisão do relator do caso na instância superior, se entender que é necessária - explica Luiz Henrique Volpe Camargo, da equipe que auxiliou o senador Valter Pereira (PMDB-MS), relator do caso, a elaborar o texto votado ontem.



Camargo cita outras mudanças, como a que cria um "incidente de resolução de demandas repetidas". Em outras palavras, processos recorrentes sobre um mesmo assunto podem ser suspensos e uma só decisão valer para todos. Essa prerrogativa é dos Tribunais de Justiça, com possibilidade de recurso ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e ao Supremo Tribunal Federal (STF).



- Um exemplo de causa a ser resolvida são os expurgos inflacionários de planos econômicos antigos - afirma Volpe.



Questão que gerou polêmica, os honorários advocatícios em ações contra a Fazenda Pública serão pagos conforme o valor da causa. Quanto maior o montante discutido, menor o percentual a ser pago ao profissional. Até 200 salários mínimos, por exemplo, a faixa variará de 10% a 20%. Acima de 50 mil salários, 1%.



Fábio Fabrini

FOLHA DE SÃO PAULO - CONSUMIDOR - R$7 BILHÕES - ENERGIA ELÉTRICA - RESSARCIMENTO

FOLHA DE S. PAULO - MERCADO




Consumidor não terá ressarcimento na luz





O consumidor brasileiro pagou R$ 7 bilhões a mais do que deveria para as distribuidoras de energia, de 2002 a 2009, e não poderá ter esse valor ressarcido.

A diretoria da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) desautorizou o pagamento desse passivo em reunião que terminou às 23h da terça-feira.



A distorção foi motivada por um erro no método do cálculo dos reajustes de energia, detectado pela própria agência e pelo TCU (Tribunal de Contas da União), que estimou o tamanho do montante. A Folha revelou a falha em outubro de 2009.



Depois disso, a Aneel aceitou retocar os contratos a partir de 2010, por meio de aditivos. Os reajustes aplicados neste ano foram feitos com a metodologia correta.



A agência, no entanto, afirmou que não há "amparo jurídico" para pagamentos retroativos e que a medida provocaria "instabilidade regulatória ao setor elétrico", segundo nota divulgada.



O erro existe desde a assinatura dos contratos de concessão, em meados dos anos 1990, mas passou a ter mais peso e a ser contabilizado a partir de 2002.



A expansão de mercado das distribuidoras não era levado em conta no cálculo do reajuste. A empresa passava a arrecadar mais que o necessário para pagar encargos, já que na maioria dos casos a fatia de clientes havia crescido, mas o dinheiro não era repartido com o consumidor.



A Aneel já havia dado sinais de que não autorizaria ressarcimento. O discurso é que os reajustes foram calculados de acordo com os contratos de concessão e com a regulamentação do setor. As regras foram cumpridas, logo não há erro, diz a agência.



A CPI das Tarifas de Energia, criada no Congresso para apurar os erros nos reajustes, chegou a pedir, em seu relatório final, que o Ministério Público apurasse se o diretor-geral da Aneel, Nelson Hubner, cometeu crime contra a administração pública.



A comissão chegou a sugerir à Aneel que o ressarcimento fosse feito por meio de descontos nas contas de luz. Os parlamentares concluíram que o antigo método de reajuste remunerava ilegalmente as concessionárias e que havia um desequilíbrio claro em favor das empresas de distribuição.



IMPUGNAÇÃO

A Justiça é agora a esperança dos consumidores. Marcelo Ribeiro, coordenador do Grupo de Trabalho de Energia do MPF, que tentou negociar um acordo para evitar avalanche de ações no país, lamentou a decisão.



"Vamos observar o argumento para saber se vamos tentar impugná-lo por via administrativa ou judicial."



Para a coordenadora institucional da Proteste, Maria Inês Dolci, nada muda. A entidade aguarda ressarcimento por via judicial.



SOFIA FERNANDES

DE BRASÍLIA



AGNALDO BRITO

DE SÃO PAULO

JORNAL VALOR ECONÔMICO: STF - SIGILO FISCAL - AUTORIZAÇÃO VEDADA

VALOR ECONÔMICO - LEGISLAÇÃO & TRIBUTOS




Quebra de sigilo sem autorização é vedada





Uma reviravolta no Supremo Tribunal Federal (STF), ontem à noite, mudou o entendimento da Corte sobre a constitucionalidade da quebra de sigilo bancário pelo Fisco sem autorização judicial. Por cinco votos a quatro, ao julgar o recurso extraordinário da GVA Indústria e Comércio contra a União, o Supremo foi contrário à quebra de sigilo sem decisão judicial que autorize a prática. Em novembro, ao julgar pedido de liminar no processo - que definiu o que valeria enquanto o mérito do recurso não fosse definitivamente analisado -, os ministros haviam liberado o acesso do Fisco às informações bancárias da empresa.



A decisão foi surpreendente porque, dessa vez, o ministro Joaquim Barbosa não participou do julgamento e o ministro Gilmar Mendes mudou seu voto. Ao julgar o recurso, posicionou-se favoravelmente aos contribuintes.



O princípio da dignidade humana e a necessidade de assegurar a privacidade foram os principais argumentos do ministro relator, Marco Aurélio, a favor da empresa. Ele declarou que a vida em sociedade pressupõe segurança e estabilidade, e não a surpresa. Para garantir isso, segundo ele, é preciso respeitar a inviolabilidade das informações do cidadão. O ministro Gilmar Mendes foi um dos que acompanhou a argumentação do relator.



Os dados eventualmente acessados pelo Fisco entre o julgamento da liminar e o do mérito não poderão ser usados pela Receita, segundo o advogado Plínio Marafon, do Braga & Marafon. Em relação aos demais contribuintes, segundo o tributarista, agora a alegação de quebra de sigilo por não haver autorização judicial ganha mais força com a decisão do Supremo. "Como não se trata de repercussão geral, os tribunais podem até deixar processos sobre o tema subirem para o Supremo, mas o mais comum será considerar a decisão da Corte. Assim, o Fisco terá que cancelar quaisquer autos originados por meio de quebra de sigilo sem autorização judicial", explica.



Porém, como faltou um ministro e ainda há uma vaga aberta na Corte, se outro recurso extraordinário sobre o tema chegar ao Supremo, pode haver uma nova reviravolta. "Essa é mais uma das saias justas que resultam da falta de um ministro na Corte", diz o advogado Saul Touinho Leal, do Pinheiro Neto Advogados. "Situação parecida ocorreu no julgamento da Lei da Ficha Limpa, recentemente", lembra Leal. O advogado afirma que o entendimento de ontem só poderá ter efeito vinculante se o Supremo aprovar uma súmula nesse sentido, ou se vier a julgar a quebra de sigilo em uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin).



Laura Ignacio - De São Paulo

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

DA LIBERDADE DOS ANTIGOS COMPARADA À DOS MODERNOS - BENJAMIN CONSTANT

DA LIBERDADE DOS ANTIGOS
COMPARADA À DOS MODERNOS*
BENJAMIN CONSTANT
Senhores,
Proponho-me submeter a vosso julgamento algumas distinções, ainda bastante novas, entre duas formas de liberdade, cujas diferenças até hoje não foram percebidas ou que, pelo menos, foram muito pouco observadas. Uma é a liberdade cujo exercício era tão caro aos povos antigos; a outra, aquela cujo uso é particularmente útil para as nações modernas. Esta análise será interessante, salvo engano, sob um duplo aspecto. Primeiro, a confusão destas duas espécies de liberdade foi, entre nós, durante épocas por demais conhecidas de nossa revolução, a causa de muitos males.
A França viu-se molestada por experiências inúteis cujos autores, irritados pelo pouco êxito que alcançaram, tentaram forçá-la a usufruir de um bem que ela não
desejava e contestaram-lhe o bem que ela queria. Em segundo lugar, levados por nossa feliz revolução (eu a chamo feliz, apesar de seus excessos; porque atento para seus resultados) a desfrutar os benefícios de um governo representativo, é interessante e útil saber por que este governo, o único sob o qual podemos hoje encontrar alguma liberdade e tranqüilidade, foi inteiramente desconhecido para as nações livres da antiguidade. Sei que pretendem-se descobrir marcas desse governo em alguns povos antigos, na república da Lacedemônia por exemplo, e em nossos ancestrais, os gauleses; mas é um engano. O governo da Lacedemônia era uma aristocracia monacal, de modo nenhum um governo representativo. O poder dos reis era limitado, mas o era pelos Éforos e não por homens investidos de uma missão semelhante à que a eleição confere em nossos dias aos defensores de nossas liberdades. Sem dúvida, os Éforos, depois de terem sido instituídos pelos reis, foram nomeados pelo povo. Mas eram apenas cinco. Sua autoridade era religiosa tanto quanto política; participavam do próprio governo, quer dizer, do poder executivo; por isso, sua prerrogativa, como a de quase todos os magistrados populares nas antigas repúblicas, longe de ser simplesmente uma barreira contra a tirania, tornava-se, as vezes, ela própria uma tirania insuportável. O regime dos gauleses, que se parecia bastante com aquele que um certo partido desejaria nos devolver, era ao mesmo tempo teocrático e guerreiro. Os padres
gozavam de um poder sem limites. A classe militar, ou a nobreza, possuía privilégios insolentes e opressivos. O povo não tinha direitos nem garantias. Em Roma, os tribunos tinham até certo ponto uma missão representativa. Eles eram os porta-vozes dos plebeus que a oligarquia, que é a mesma em todos os séculos, havia submetido, derrubando os reis, a uma escravidão duríssima. No entanto, o povo exercia diretamente uma grande parte dos direitos políticos. Ele se reunia para votar as leis, para julgar os patrícios acusados de delito: só havia, portanto, em Roma, fracos traços do sistema representativo. Este sistema é uma descoberta dos modernos e vós vereis, Senhores, que a condição da espécie humana na antiguidade não permitia que uma instituição desta natureza ali se introduzisse ou instalasse. Os povos antigos não podiam nem sentir a necessidade nem apreciar as vantagens desse sistema. A organização social desses povos os levava a desejar uma liberdade bem diferente da que este sistema nos assegura.É a demonstrar-vos esta verdade que a leitura
desta noite será consagrada. Perguntai-vos primeiro, Senhores, o que em nossos dias um inglês, um francês, um habitante dos Estados Unidos da América entendem pela palavra liberdade. É para cada um o direito de não se submeter senão às leis, de não poder ser preso, nem detido, nem condenado, nem maltratado de nenhuma maneira, pelo efeito da vontade arbitrária de um ou de vários indivíduos. É para cada um o direito de dizer sua opinião,de escolher seu trabalho e de exercê-lo; de dispor de sua propriedade, até de abusar dela; de ir e vir, sem necessitar de permissão e sem ter que prestar conta de seus motivos ou de seus passos. É para cada um o direito de reunir-se a outros indivíduos, seja para discutir sobre seus interesses, seja para professar o culto que ele e seus associados preferem, seja simplesmente para preencher seus dias e suas horas de maneira mais condizente com suas inclinações, com suas fantasias. Enfim, é o direito, para cada um, de influir sobre a administração do governo, seja pela nomeação de todos ou de certos funcionários, seja por representações,petições, reivindicações, às quais a autoridade é mais ou menos obrigada a levar em consideração. Comparai agora a esta a liberdade dos antigos. Esta última consistia em exercer coletiva, mas diretamente, várias partes da soberania inteira, em deliberar na praça pública sobre a guerra e a paz, em concluir com os estrangeiros tratados de aliança, em votar as leis, em pronunciar julgamentos, em examinar as contas, os atos, a gestão dos magistrados; em fazê-los comparecer diante de todo um povo, em acusá-los de delitos, em condená-los ou em absolvê-los; mas, ao mesmo tempo que consistia nisso o que os antigos chamavam liberdade, eles admitiam, como compatível com ela, a submissão completa do indivíduo à autoridade do todo. Não encontrareis entre eles quase nenhum dos privilégios que vemos fazer parte da liberdade entre os modernos. Todas as ações privadas estão sujeitas a severa vigilância. Nada é concedido à independência individual, nem mesmo no que se refere à religião. A faculdade de escolher seu culto, faculdade que consideramos como um de nossos mais preciosos direitos, teria parecido um crime e um sacrilégio para os antigos. Nas coisas que nos parecem mais insignificantes, a autoridade do corpo social interpunha-se e restringia a vontade dos indivíduos. Em Esparta, Terpandro não pode acrescentar uma corda à sua lira sem ofender os Éforos. Mesmo nas relações domésticas a autoridade intervinha.
O jovem lacedemônio não pode livremente visitar sua jovem esposa. Em Roma, os censores vigiam até no interior das famílias. As leis regulamentavam os costumes e, como tudo dependia dos costumes, não havia nada que as leis não regulamentassem.
Assim, entre os antigos, o indivíduo, quase sempre soberano nas questões públicas, é escravo em todos seus assuntos privados. Como cidadão, ele decide sobre a paz e a guerra; como particular, permanece limitado, observado, reprimido em todos seus movimentos; como porção do corpo coletivo, ele interroga, destituí, condena, despoja, exila, atinge mortalmente seus magistrados ou seus superiores; como sujeito ao corpo coletivo, ele pode, por sua vez, ser privado de sua posição, despojado de suas honrarias, banido, condenado, pela vontade arbitrária do todo ao qual pertence. Entre os modernos, ao contrário, o indivíduo, independente na vida privada, mesmo nos Estados mais livres, só é soberano em aparência. Sua soberania é restrita, quase sempre interrompida; e, se, em épocas determinadas, mas raras, durante as quais ainda é
cercado de precauções e impedimentos, ele exerce essa soberania, é sempre para abdicar a ela. Devo aqui, Senhores, deter-me um instante para prevenir uma objeção que me poderia ser feita. Há na antiguidade uma república na qual a escravização da
existência individual ao corpo coletivo não é tão completa como acabo de descrevê-la. Esta república é a mais célebre de todas; podeis deduzir que desejo falar de Atenas. Voltarei a este ponto mais tarde e, admitindo a verdade do fato, expor-vos-ei a causa. Veremos por que, de todos os Estados antigos, Atenas é o que mais se pareceu com os modernos. Em qualquer outro lugar a jurisdição social era ilimitada. Os antigos, como diz Condorcet não tinham nenhuma noção dos direitos individuais. Os homens não eram, por assim dizer, mais que máquinas das quais a lei regulava as molas o dirigia
as engrenagens. A mesma submissão caracterizava os belos séculos da república romana; o indivíduo estava, de certa forma, perdido na nação, o cidadão, na cidade.
Vamos agora retornar à origem dessa diferença essencial entre os antigos e nós.
Todas as repúblicas antigas eram fechadas em limites estreitos. A mais populosa, a mais poderosa, a mais importante delas não era igual em extensão ao menor dos Estados modernos. Como conseqüência inevitável de sua pouca extensão, o espírito dessas repúblicas era belicoso; cada povo incomodava continuamente seus vizinhos ou era incomodado por eles. Impelidos assim pela necessidade uns contra os outros,
esses povos combatiam-se ou ameaçavam-se sem cessar. Os que não desejavam ser conquistadores não podiam depor armas sob pena do serem conquistados. Todos compravam a segurança, a independência, a existência inteira ao preço da guerra. Ela era o interesse constante, a ocupação quase habitual dos Estados livres da antiguidade. Finalmente, e como resultado necessário dessa maneira de ser, todos os Estados tinham escravos.As profissões mecânicas e mesmo, em algumas nações, as profissões industriais eram confiadas a mãos acorrentadas. O mundo moderno oferece-nos um espetáculo totalmente oposto. Os menores estados atualmente são incomparavelmente mais vastos que Esparta ou Roma durante cinco séculos. Mesmo a divisão da Europa em vários Estados e, graças ao progresso do saber, mais aparente do que real. Enquanto antigamente cada povo formava uma família isolada, inimiga nata das outras famílias, uma massa de homens existe agora sob diferentes nomes, sob diversos modos de organização social, mas essencialmente homogênea. Ela é suficientemente
forte para não temer hordas bárbaras. É suficientemente esclarecida para não querer fazer a guerra. Sua tendência é a paz. Essa diferença acarreta uma outra. A guerra é
anterior ao comércio; pois a guerra e o comércio nada mais são do que dois meios diferentes de atingir o mesmo fim: o de possuir o que se deseja. O comércio não
é mais que uma homenagem prestada à força do possuidor pelo aspirante à posse. É uma tentativa de obter por acordo aquilo que não se deseja mais conquistar pela violência. Um homem que fosse sempre o mais forte nunca teria a idéia do comércio. É a experiência - provando que a guerra, isto é, o emprego da força contra a força de outrem, o expõe a resistências e malogros diversos - que o leva a recorrer ao comércio,
ou seja, a um meio mais brando e mais seguro de interessar o adversário em consentir no que convém à sua causa. A guerra é o impulso, o comércio é o cálculo.
Mas, por isso mesmo, devo haver um momento em que o comércio substitui a guerra. Nós chegamos a esse momento. Não quero dizer que não tenha havido povos
comerciantes entre os antigos. Mas esses povos de certa maneira oram exceção à regra geral. As limitações do uma leitura não me permitem apontar-vos todos os
obstáculos que se opunham então ao progresso do comércio; aliás vós os conheceis tanto quanto eu; falarei apenas do um deles. O desconhecimento da bússola
obrigava os marinheiros da antiguidade a não perder de vista as costas; Atravessar as colunas de Hércules, ou seja, passar o estreito de Gibraltar, era considerado o
mais ousado dos empreendimentos. Os fenícios e os cartagineses, os mais hábeis dos navegadores, só ousaram muito mais tarde e seu exemplo permaneceu longo tempo sem ser imitado. Em Atenas, da qual talaremos mais tarde, o juro marítimo era aproximadamente de sessenta por cento; o juro habitual era apenas de doze por cento, tanto a idéia de navegação distante implicava em idéia de perigo. Além disso, se pudesse entregar-me a uma digressão, que infelizmente seria longa demais, eu vos
demonstraria, Senhores, pelo detalhe dos costumes, dos hábitos, do modo de traficar dos povos comerciantes da antiguidade com os outros povos, que esse comércio era,
por assim dizer, impregnado do espírito da época, da atmosfera de guerra e de hostilidade que os cercava. O comércio era então um acidente feliz: é hoje a condição
normal, o fim único, a tendência universal, a verdadeira vida das nações. Aliás, elas querem o descanso; com o descanso, a fartura; e, como fonte da fartura, a indústria. A guerra é cada dia um meio menos eficaz de realizar seus desejos. Suas chances não oferecem mais, nem aos indivíduos, nem às nações, benefícios que igualem os resultados do trabalho pacífico o dos negócios regulares. Para os antigos, uma guerra feliz acrescentava escravos, tributos, terras, à riqueza pública ou particular. Para os modernos, uma guerra feliz custa infalivelmente mais do que vale.
Enfim, graças ao comércio, à religião, aos progressos intelectuais e morais da espécie humana, não há mais escravos nas nações européias. Homens livres devem exercer todas as profissões, atender a todas as necessidades da sociedade. Pode-se prever facilmente, Senhores, o resultado necessário dessas diferenças. Primeiro, a extensão de um país diminui muito a importância política que toca, distributivamente, a cada indivíduo. O republicano mais obscuro do Roma e de Esparta era uma autoridade. Não acontece o mesmo com o simples cidadão da Grã-Bretanha ou dos Estados Unidos. Sua influência pessoal é um elemento imperceptível da vontade social que imprime ao governo sua direção. Em segundo lugar, a abolição da escravatura privou a população livre de todo o lazer que o trabalho dos escravos lhe permitia. Sem a população escrava de Atenas, vinte mil atenienses não teriam podido deliberar cada dia na praça pública. Em terceiro lugar, o comércio não deixa, como a guerra, intervalos de inatividade na vida do homem. O exercício continuo dos direitos políticos, a discussão diária dos negócios de Estado, as discussões, os conciliábulos, todo o cortejo e movimento das facções, a agitação necessárias, recheio indispensável, se ouso empregar esta expressão na vida dos povos livres da antiguidade, que se teriam entediado, sem esse recurso, sob o peso de uma ociosidade dolorosa, acarretariam apenas perturbações e cansaço às nações modernas, onde cada indivíduo, ocupado por suas especulações, por seus empreendimentos, pelos resultados que obtém ou espera, quer ser desviado disso o menos possível. Finalmente, o comércio inspira aos homens um forte amor pela independência individual. O comércio atende a suas necessidades, satisfaz seus desejos, sem a intervenção da autoridade. Esta intervenção é quase sempre, e não sei por que digo quase, esta intervenção é sempre incômoda. Todas as vezes que o poder coletivo quer intrometer-se nas especulações particulares, ele atrapalha os especuladores. Todas as vezes que os governos pretendem realizar negócios, eles o fazem menos bem e com menos vantagens do que nós. Disse, Senhores, que vos falaria de Atenas, cujo exemplo poderia opor-se a algumas de minhas assertivas,mas que, ao contrário, vai confirmar todas elas. Atenas, como já reconheci, era a mais comerciante de todas as repúblicas gregas; assim sendo,concedia a seus cidadãos muito mais liberdade individual do que Roma ou Esparta. Se pudesse entrar em detalhes históricos, eu vos faria ver que o comércio tinha feito desaparecer, entre os atenienses, varias das diferenças que distinguem os povos antigos dos povos modernos. O espírito dos comerciantes de Atenas era semelhante ao dos comerciantes de nossos dias. Xenofonte nos diz que,durante a guerra do Peloponeso, eles tiravam seus capitais do continente da Ática e os enviavam para as ilhas do Arquipélago. O comércio havia criado entre eles a circulação. Encontramos em Isócrates sinais do uso das letras de câmbio. Observai, pois, quanto seus costumes  pareciam-se com os nossos. Em suas relações com as mulheres, vereis (cito ainda Xenofonte) os esposos, satisfeitos quando a paz e uma amizade discreta reina entre o casal, fechar os olhos ao irresistível poder das paixões, perdoar a primeira fraqueza e esquecer a segunda. Em suas relações com os estrangeiros, vê-losemos estender os privilégios a todo aquele que, transportando-se com a família para seu território,instala um trabalho ou uma fábrica; por fim, ficaremos impressionados com seu amor excessivo pela independência individual. Na Lacedemônia, diz um filósofo, os cidadãos acorrem quando um magistrado os chama; mas um ateniense não se conformaria que o considerassem dependente de um magistrado.No entanto, como várias outras circunstâncias que determinavam o caráter das nações antigas existiam também em Atenas; como havia uma população escrava e como o território era muito limitado, encontramos ai  vestígios da liberdade dos antigos. O povo faz as leis, examina a conduta dos magistrados, intima Péricles a prestar contas, condena generais à morte. Ao mesmo tempo, o ostracismo, ato legal e louvado por todos os legisladores da época, o ostracismo, que nos parece uma revoltante iniqüidade, prova que o indivíduo era ainda subordinado à supremacia do corpo social em Atenas, mais do que em qualquer Estado social livre da Europa do nossos dias. Conclui-se do que acabo de expor que não podemos mais desfrutar da liberdade dos antigos a qual se compunha da participação ativa e constante do poder coletivo. Nossa liberdade deve compor-se do exercício pacifico da independência privada. A participação que, na antiguidade, cada um tinha na soberania nacional não era, como em nossos dias, uma suposição abstrata. A vontade de cada um tinha uma influência real; o exercício dessa vontade era um prazer forte e repetido.Em conseqüência, os antigos estavam dispostos a fazer muitos sacrifícios pela conservação de seus direitos políticos e de sua parte na administração do Estado.Cada um, sentindo com orgulho o que valia seu voto,
experimentava uma enorme compensação na consciência de sua importância social. Essa compensação já não existe para nós. Perdido na multidão, o indivíduo quase nunca percebe a influência que exerce. Sua vontade não marca o conjunto; nada prova, a seus olhos, sua cooperação. O exercício dos direitos políticos somente nos proporciona pequena parte das satisfações que os antigos nela encontravam e, ao mesmo tempo, os progressos da civilização, a tendência comercial da época, a
comunicação entre os povos multiplicaram e variaram ao infinito as formas de felicidade particular. Concluí-se que devemos ser bem mais apegados que os antigos à nossa independência individual. Pois os antigos, quando sacrificavam essa  independência aos direitos políticos, sacrificavam menos para obter mais;enquanto que, fazendo o mesmo sacrifício, nós daríamos mais para obter menos.
O objetivo dos antigos era a partilha do poder social entre todos os cidadãos de uma mesma pátria. Era isso o que eles denominavam liberdade. O objetivo dos modernos é a segurança dos privilégios privados; e eles chamam liberdade as garantias concedidas pelas instituições a esses privilégios. Eu disse no inicio que, por não terem percebido essas diferenças, homens bem intencionados tinham causado grandes males durante nossa longa e tempestuosa revolução. De forma nenhuma desejo dirigir-lhes críticas demasiado severas: mesmo o erro deles era desculpável. Não se consegue ler as belas páginas da antiguidade, não se revivem as ações desses grandes homens sem experimentar uma emoção muito especial que nada do que é moderno nos faz sentir. Os velhos elementos de uma natureza, anterior à nossa por assim dizer, parecem despertar dentro de nós face a essas lembranças. É difícil não sentirmos nostalgia desses tempos em que as faculdades do homem desenvolviam-se numa direção traçada antecipadamente, mas em um destino tão amplo, tão forte pela sua própria força e com tanto sentimento de energia e de dignidade; e, quando nos carregamos a essas reminiscências, é impossível não desejarmos imitar o que invejamos. Essa impressão  era profunda, principalmente quando vivíamos sob governos abusivos que sem serem fortes, eram vexatórios, absurdos nos princípios,miseráveis na ação; governos que tinham por móvel, o arbitrário; por meta, o aviltamento da espécie humana e que, ainda hoje, certos homens ousam louvar como se pudéssemos jamais esquecer que fomos testemunhas e vítimas de sua obstinação, de sua impotência e de sua derrocada. O objetivo de nossos reformadores foi nobre e generoso. Quem de nós não sentiu o coração bater de esperança no começo da estrada que eles pensavam abrir? E ai daqueles que ainda hoje não sentem a necessidade de declarar que reconhecer alguns erros cometidos por nossos primeiros guias não significa denegrir sua memória, nem negar opiniões que os amigos da humanidade professaram de geração em geração! Mas esses homens tinham ido buscar várias de suas teorias nas obras de dois filósofos, que eles próprios não tinham se dado conta das modificações transmitidas por dois mil anos às tendências do gênero humano. Examinarei, pois, o sistema do mais ilustre desses filósofos, J. J. Rousseau, e mostrarei que, transportando para os tempos modernos um volume de poder social, de soberania coletiva que pertencia a outros séculos, este gênio sublime, que era animado pelo amor mais puro à liberdade, forneceu, todavia, desastrosos pretextos a mais de um tipo de tirania. Evidentemente, salientando o que considero como um engano importante a revelar, serei ponderado em minha refutação e respeitoso em minha crítica. Evitarei, é claro, juntar-me aos  detratores de um grande homem. Quando o acaso me faz aparentemente concordar com eles em um único ponto, desconfio de mim mesmo; e, para consolar-me de parecer, por um instante, de sua opinião, sobre uma única e parcial questão, preciso desautorizar e descolorir quanto posso a esses supostos auxiliares. No entanto, o interesse pela verdade deve superar considerações que tornam tão poderosos o brilho
de um talento prodigioso e a autoridade de uma imensa reputação. Aliás, não é a Rousseau, como veremos, que se deve principalmente atribuir o erro que vou combater: ele pertence muito mais a um, de seus sucessores, menos eloqüente, mas não menos austero; e mil vezes mais exagerado. Este, o abade de Mably, pode ser onsiderado o representante do sistema que, conforme as máximas
da liberdade antiga, quer que os cidadãos sejam completamente dominados para que a nação seja soberana, e que o indivíduo seja escravo para que o povo seja livre.
O abade de Mably, como Rousseau e como muitos outros, tinha, conforme os antigos, tomado a autoridade do corpo social pela liberdade e todos os meios pareciam-lhe bons para estender a ação dessa autoridade sobre a parte recalcitrante da existência humana, da qual ele deplorava a independência. A queixa que ele expressa em todas as suas obras é que a lei só possa atingir as ações. Ele teria desejado que ela atingisse os pensamentos, as impressões mais passageiras, que ela perseguisse o homem sem trégua e sem deixar-lhe nenhum refúgio onde pudesse escapar a seu poder. Mal percebia, em qualquer povo, uma medida vexatória, já pensava ter feito uma descoberta e a
propunha como modelo; ele detestava a liberdade individual como se detesta um inimigo pessoal; e, quando encontrava na história uma nação que estivesse
completamente privada dela, embora tampouco tivesse ela liberdade política alguma, não podia deixar de admirá-la. Extasiava-se com os egípcios porque, dizia ele, tudo era organizado entre eles pela lei, desde o repouso até as necessidades; tudo era submetido ao poder do legislador; todos os momentos do dia eram preenchidos por algum dever. Mesmo o amor estava sujeito a essa intervenção respeitada e era a lei que, lternadamente, abria e fechava o leito nupcial. Esparta, que reunia formas republicanas à submissão dos indivíduos, despertava no espírito desse filósofo um entusiasmo mais forte ainda. Esse grande convento parecia o ideal da perfeita república. Tinha por Atenas um profundo desprezo e teria dito com prazer sobre essa nação, a primeira da Grécia, o que um fidalgo acadêmico dizia sobre a Academia francesa: "Que despotismo espantoso! Todo mundo faz aí o que quer". Devo acrescentar que esse fidalgo falava da Academia como ela era há trinta anos.
Montesqui eu, dotado de espírito observador, porque tinha a cabeça menos ardente, não caiu inteiramente nos mesmos erros. Impressionou-se com as diferenças que referi, mas não distinguiu a verdadeira causa delas.
"Os políticos gregos, diz ele, que viviam sob o governo popular, não reconheciam outra força que não fosse a da virtude. Os de hoje só nos falam de manufaturas, de comércio, de finanças, de riquezas e até de luxo”.
Ele atribui essa diferença à república e à monarquia; é preciso atribuí-la ao espírito oposto dos tempos antigos e dos tempos modernos. Cidadãos das repúblicas, vassalos das monarquias, todos querem privilégios e ninguém pode, no estado atual das sociedades, deixar de querer isso. O povo mais afeito à liberdade em nossos dias antes da emancipação da França, era também o povo mais afeito a todos os
prazeres da vida; e queria sua liberdade principalmente porque via nela a garantia dos prazeres que venerava. Antigamente, onde havia liberdade, podia-se suportar as
privações; agora, onde há privação, é preciso a escravidão para que alguém se resigne a ela. Seria mais fácil hoje fazer um povo de espartanos do que educar espartanos para a liberdade. Os homens que foram levados pela onda dos acontecimentos a liderar nossa revolução estavam, em conseqüência da educação que haviam recebido, imbuídos das opiniões antiquadas e absurdas que os filósofos de que falei haviam posto em realce. A metafísica de Rousseau, no interior da qual apareciam de repente, como relâmpagos, verdades sublimes e passagens de uma eloqüência arrebatadora; a austeridade de Mably, sua intolerância, seu ódio a todas as paixões humanas, sua ânsia de escravizá-las todas, seus princípios exagerados sobre a competência da lei, a diferença entre o que ele recomendava e o que existia, a verve com que atacava as riquezas e até a propriedade - todas essas coisas deviam encantar homens exaltados por uma vitória recente e que conquistadores do poder legal, estavam desejosos de estender esse poder em todas as direções. Para eles era uma autoridade preciosa a desses dois escritores que, desinteressadamente e lançando anátema contra o despotismo dos homens, haviam posto em axiomas o texto da lei. Quiseram, pois, exercer a forca pública, segundo tinham aprendido com seus guias, tal como fora exercida antigamente nos Estados livres. Acreditaram que tudo ainda devia ceder frente a vontade coletiva e que todas as restrições aos direitos individuais seriam largamente compensadas pela participação no poder social. Sabeis, Senhores, o que resultou disso. Instituições livres, apoiadas no conhecimento do espírito do século, teriam conseguido subsistir. O edifício renovado dos antigos desmoronou, apesar de esforços e de muitos atos heróicos que merecem admiração. É que o poder social feria em todos os sentidos a
independência individual sem, contudo, destruir-lhe a necessidade. A nação não pensava que uma parte ideal em uma soberania abstrata valesse os sacrifícios que lhe
pediam. Em vão repetiam-lhe com Rousseau: as leis da liberdade são mil vezes mais austeras do que é duro o jugo dos tiranos. Ela não aceitava essas leis austeras e,
em seu descontentamento, pensava às vezes que o jugo dos tiranos seria preferível. A experiência a desenganou. Ela viu que a arbitrariedade dos homens era pior ainda
que as piores leis. Mas as leis também devem ter limites. Se consegui, Senhores, fazer-vos aceitar a opinião que, em minha convicção, esses fatos produzem, reconhecereis comigo a verdade dos princípios seguintes: A independência individual é a primeira das necessidades modernas. Conseqüentemente, não se deve nunca pedir seu sacrifício para estabelecer a liberdade política. Concluí-se daí que nenhuma das numerosas instituições, tão aplaudidas, que, nas  repúblicas antigas, impediam a liberdade individual é aceitável nos tempos modernos. Provar essa verdade, Senhores, parece inútil num primeiro momento. Muitos governos de nosso tempo não parecem inclinados a imitar as repúblicas da antiguidade. No entanto, por menos gosto que tenham pelas instituições republicanas, há certos costumes republicanos pelos quais esses governos sentem certa afeição. E lamentável que sejam precisamente aqueles que permitem banir, exilar, privar. Lembro-me que em 1802 foi introduzido, numa lei sobre os tribunais especiais, um artigo que adotava na França o ostracismo grego, e só Deus sabe quantos eloqüentes oradores falaram-nos da liberdade de Atenas e de todos os sacrifícios que os indivíduos deviam fazer para conservar essa liberdade a fim de que este artigo fosse aceito, o que, contudo, não aconteceu. Da mesma forma, em época bem mais recente, quando autoridades temerosas tentavam timidamente dirigir as eleições a seu modo, um jornal, que não é tachado, no entanto, de republicano, propôs restabelecer a censura romana para afastar os candidatos perigosos.
Creio, pois, não me empenhar em uma digressão inútil se, para apoiar minha afirmação, disser algumas palavras sobre essas instituições tão elogiadas. O ostracismo de Atenas repousava na hipótese de que a sociedade tem toda a autoridade sobre seus membros. Nesta hipótese, ele podia justificar-se; e, num pequeno Estado, onde a influência de um indivíduo, pelo seu crédito, sua clientela, sua glória, balançava muitas vezes o poder da massa, o ostracismo podia ter aparência de utilidade. Mas, para nós, os indivíduos tem
direitos que a sociedade deve respeitar e a influência individual, como já observei, está tão perdida numa quantidade de influências, iguais ou superiores, que toda a opressão, motivada na necessidade de diminuir essa  influência, é inútil e, conseqüentemente, injusta. Ninguém tem o direito de exilar um cidadão se ele não for condenado por um tribunal regular, segundo lei formal que atribui a pena de exílio à ação da qual é culpado. Ninguém tem o direito de arrancar o cidadão de sua pátria, o proprietário de suas terras, o comerciante de seu negócio, o esposo de sua esposa, o pai de seus filhos, o escritor de suas meditações intelectuais, o ancião de seus hábitos. Todo exílio político é um atentado político. Todo exílio, infligido por uma assembléia com base em pretensos motivos de segurança pública, é um crime dessa assembléia contra a própria segurança pública, que não existe senão no respeito às leis, na observância das regras e na manutenção das garantias. A censura romana supunha, como o ostracismo,
um poder ilimitado. Numa república em que todos os cidadãos, mantidos pela pobreza numa simplicidade extrema de costumes, não exerciam nenhuma profissão que desviasse sua atenção dos negócios do Estado e eram, assim, constantemente espectadores e juizes do poder público, a censura podia, por um lado, ter mais influência e, por outro, a arbitrariedade dos censores era contida por uma espécie de vigilância moral exercida contra eles. Mas logo que a extensão da república, a
complicação das relações sociais e os refinamentos da  civilização tiraram dessa instituição o que lhe servia ao mesmo tempo de base e de limite a censura degenerou, mesmo em Roma. Não fora, pois, a censura que criara os bons costumes; era a simplicidade dos costumes que assegurava o poder e a eficácia da censura.Na França, uma instituição tão arbitrária como a censura seria ao mesmo tempo ineficaz e intolerável. No estágio atual da sociedade, os costumes compõem-se de matizes tênues, vagos, imperceptíveis, que se desnaturariam de mil maneiras se tentássemos dar-lhes mais precisão. Somente a opinião pode atingi-los; só ela pode julgá-los porque são da mesma essência. Ela se sublevaria contra toda autoridade positiva que quisesse lhe dar mais rigor. Se o governo de um povo pretendesse, como os censores de Roma, desonrar um cidadão por uma decisão discriminatória, a nação inteira reclamaria
cont a essa sentença, não ratificando as determinações da autoridade. O que acabo de dizer sobre a transplantação da censura para os tempos modernos aplica-se a muitos
outros aspectos da organização social, sobre os quais citam-nos a antiguidade ainda com mais freqüência e com muito mais ênfase: a educação, por exemplo. O que
não dizem sobre a necessidade de permitir ao governo de apoderar-se das novas gerações para educá-las a seu modo, e em quantas citações eruditas não apóiam essa
teoria? Os persas, os egípcios, e a Galia, e a Grécia, e a Itália vêm alternadamente figurar aos nossos olhos! Pois bem, Senhores, não somos nem persas, submissos a um
déspota, nem egípcios, subjugados por sacerdotes, nem gauleses, que podem ser sacrificados por druidas, nem enfim gregos ou romanos, cuja participação na
autoridade social consolava da servidão privada. Somos modernos que queremos desfrutar, cada qual, de nossos direitos; desenvolver nossas faculdades como bem entendermos, sem prejudicar a ninguém; vigiar o desenvolvimento dessas faculdades nas crianças que a natureza confia à nossa afeição, tão esclarecida quanto forte, não necessitando da autoridade a não ser para obter dela os meios gerais de instrução que pode reunir;como os viajantes aceitam dela os longos caminhos, sem serem dirigidos na estrada que desejam seguir. A religião também está exposta às lembranças do passado. Defensores da unidade de doutrina citam-nos as leis dos antigos contra os deuses estrangeiros e apóiam os direitos da igreja católica com o exemplo dos atenienses que sacrificaram Sócrates por ter abalado o politeísmo; e o de Augusto que desejava que se permanecesse fiel ao culto de seus ancestrais, o que fez com que, pouco tempo depois, se entregassem os primeiros cristãos às feras. Devemos desconfiar, Senhores, dessa admiração por certas reminiscências antigas. Se vivemos nos tempos modernos, quero a liberdade que convêm aos tempos modernos; se vivemos sob monarquias, suplico humildemente a essas monarquias de não tornar emprestados às repúblicas antigas meios de oprimir-nos. A liberdade individual, repito, é a verdadeira liberdade moderna. A liberdade política é a sua garantia e é, portanto, indispensável. Mas pedir aos povos de hoje para sacrificar, como os de antigamente, a totalidade de sua liberdade individual à liberdade política é o meio mais seguro de afastá-los da primeira, com a conseqüência de que, feito isso, a segunda não tardará a
lhe ser arrebatada. Vede, Senhores, que minhas observações não tendem absolutamente a diminuir a importância da liberdade política. Não extraio dos fatos que vos expus as
conseqüências que certos homens deles extraem. Porque os antigos foram livres e porque não podemos mais ser livres como os antigos, eles concluem que estamos
destinados a ser escravos. Gostariam de constituir o novo estágio social com um pequeno número de elementos que dizem ser os únicos apropriados à situação atual.
Esses elementos são preconceito para atormentar os homens, egoísmo para corrompê-los, frivolidade para aturdi-los, prazeres grosseiros para degradá-los, despotismo para conduzi-los; e também conhecimentos positivos e ciências exatas para melhor servir ao
despotismo. Seria estranho que esse fosse o resultado de quarenta séculos durante os quais o espírito humano conquistou tantos recursos morais e físicos; não posso
admitir isso. Retiro das diferenças que nos distinguem da antiguidade conseqüências bem opostas. Não é a segurança que é preciso enfraquecer, é a regalia que é preciso aumentar. Não é à liberdade política que desejo renunciar; é a liberdade civil que reclamo junto com outras formas de liberdade política. Os governos não têm hoje, como não tinham antigamente, o direito de atribuir-se um poder ilegítimo. Mas os governos que brotam de fonte legítima têm ainda menos do que os de antanho o direito de exercer sobre os indivíduos uma supremacia arbitraria. Possuímos ainda hoje os direitos que tivemos sempre, os direitos eternos de aceitar as leis, de deliberar sobre nossos interesses, de ser parte integrante do corpo social do qual somos membros. Mas os governos têm novos deveres. Os progressos da civilização, as transformações operadas através dos séculos pedem à autoridade mais respeito pelos hábitos,
pelos afetos, pela independência dos indivíduos. Ela deve dirigir esses assuntos com mão mais prudente e mais leve. Essa contenção da autoridade, que se mantém
em seus estritos deveres, atém-se também a seus interesses bem entendidos; pois se a liberdade que convém aos modernos é diferente da que convinha aos antigos, o despotismo que era possível entre estes não é mais possível entre os modernos. Do fato de que estamos muitas vezes mais descuidados com a liberdade política
do que eles podiam estar, e, em nossa condição costumeira, menos apaixonados por ela, pode-se concluir que negligenciamos demais às vezes, e sempre sem motivos, as garantias que ela nos assegura; mas ao mesmo tempo, como buscamos muito mais a liberdade individual do que os antigos, nós a defenderemos, se for atacada, com muito mais ímpeto e persistência; e possuímos para a defesa meios que os antigos não
possuíam. O comércio torna a ação da arbitrariedade sobre nossa existência mais vexatória do que antigamente, porque, sendo nossas especulações mais variadas, o arbítrio deve multiplicar-se para atingi-las; mas o comércio também torna a ação da arbitrariedade mais fácil de enganar, porque ele modifica a natureza da propriedade, que se torna, por esta modificação, quase inapreensível. O comércio dá à propriedade uma qualidade nova: a circulação; sem circulação, a propriedade não é mais que usufruto; a autoridade pode sempre influir no usufruto, pois pode impedir o gozo dele; mas a
circulação põe um obstáculo invisível e invencível a essa ação do poder social. Os efeitos do comércio estendem-se ainda mais longe; não somente ele emancipa os indivíduos, mas,criando o crédito, torna a autoridade dependente. O dinheiro, diz um autor francês, é a arma mais perigosa do despotismo; mas é ao mesmo tempo seu freio mais poderoso; o crédito está submetido à opinião; a força é inútil, o dinheiro esconde-se ou foge; todas as operações do Estado ficam suspensas. O crédito não tinha a mesma influência entre os antigos; seus governos eram mais fortes que os particulares; em nossos dias estes são mais fortes que os poderes políticos; a riqueza é uma força mais disponível em todos os momentos, mais aplicável a todos os interesses e, em conseqüência,muito mais real e mais bem obedecida; o poder ameaça,a riqueza recompensa; escapa-se ao poder enganando-o;para obter os favores da riqueza, é preciso servi-la. Em conseqüência das mesmas causas, a existência individual é menos englobada na existência política. Os indivíduos transportam para longe seus tesouros; levam com eles todos os bens da vida privada;o comércio aproximou as nações e lhes deu hábitos e costumes mais ou menos semelhantes; os chefes podem ser inimigos; os povos são compatriotas.Que o poder se resigne, pois, a isso; precisamos
da liberdade e a teremos; mas, como a liberdade que precisamos é diferente da dos antigos, essa liberdade necessita uma organização diferente da que poderia
convir à liberdade antiga. Nesta, quanto mais tempo e forças o homem consagrava ao exercício de seus direitos políticos, mais ele se considerava livre; na espécie de
liberdade a qual somos suscetíveis, quanto mais o exercício de nossos direitos políticos nos deixar tempo para nossos interesses privados, mais a liberdade nos
será preciosa. Daí vem, Senhores, a necessidade do sistema representativo. O sistema representativo não é mais que uma organização com a ajuda da qual uma nação confia
a alguns indivíduos o que ela  não pode ou não quer fazer. Os pobres fazem eles mesmos seus negócios; os homens ricos contratam administradores. É a história das nações antigas e das nações modernas. O sistema representativo é uma procuração dada a um certo número de homens pela massa do povo que deseja ter seus interesses
defendidos e não tem, no entanto, tempo para defendêlos sozinho. Mas, salvo se forem insensatos, os homens ricos que têm administradores examinam, com atenção e
severidade, se esses administradores cumprem seu dever, se não são negligentes, corruptos ou incapazes; e, para julgar a gestão de seus mandatários, os constituintes que são prudentes mantém-se a par dos negócios cuja administrado lhes confiam. Assim também os povos que, para desfrutar da liberdade que lhes é útil, decorrem ao sistema representativo, devem exercer uma vigilância ativa e constante sobre seus rpresentantes e reservar-se o direito de, em momentos que não sejam demasiado distanciados, afastá-los, caso tenham traído suas promessas, assim como o de revogar os poderes dos quais eles tenham eventualmente abusado. Eis por que, tendo em vista qu a liberdade moderna difere da antiga, conclui-se que ela está ameaçada também por um perigo de espécie diferente. O perigo da liberdade antiga estava em que, atentos unicamente à necessidade de garantir a participação no poder social, os homens não se preocupassem com os direitos e garantias individuais. O perigo da liberdade moderna está em que,absorvidos pelo gozo da independência privada e na busca de interesses particulares, renunciemos demasiado facilmente a nosso direito de participar do poder político. Os depositários da autoridade não deixam de exortar-nos a isso. Estão sempre dispostos a poupar-nos de toda espécie de cuidados, exceto os de obedecer e de
pagar! Eles nos dirão; "Qual é, no fundo, o objetivo de todos os vossos esforços, o motivo de vosso trabalho, o objeto de vossas esperanças? Não é a felicidade? Pois
bem, essa felicidade, aceitai e nós nos encarregaremos dela." Não, Senhores, não aceitemos. Por mais tocante que seja um interesse tão delicado, rogai à autoridade
de permanecer em seus limites. Que ela se limite a ser justa; nós nos encarregaremos de ser felizes. Poderíamos ser felizes através de regalias, se essas regalias fossem separadas das garantias? Ou encontraríamos essas garantias se renunciássemos à
liberdade política? Renunciar a ela, Senhores, seria uma loucura semelhante a do homem que, sob pretexto de habitar no primeiro andar, pretendesse construir sobre a
areia um edifício sem fundações. De resto, Senhores, será mesmo verdade que a
felicidade, de qualquer espécie que ela possa ser, seja o único objetivo do gênero humano? Nesse caso, nossa meta seria muito estreita e nosso destino muito pouco
nobre. Não haveria nenhum de nós que - se quisesse rebaixar-se, restringir suas faculdades morais, aviltar seus desejos, renunciar à atividade, à glória, às emoções
generosas profundas - conseguisse embrutecer-se e ser feliz. Não, Senhores - e eu invoco como prova a parte melhor de nossa natureza, a nobre inquietude que nos
persegue e nos atormenta, a  paixão em alargar nossas luzes e desenvolver nossas faculdades -, não é só à felicidade, é ao aperfeiçoamento que nosso destino nos
chama; e a liberdade política é o mais poderoso, o mais enérgico modo de aperfeiçoamento que o céu nos concedeu. A liberdade política, submetendo a todos os
cidadãos, sem exceção, o exame e o estudo de seus interesses mais sagrados, engrandece o espírito, enobrece os pensamentos, estabelece entre eles uma
espécie de igualdade intelectual que faz a glória e o poder de um povo. Assim, vede como uma nação cresce com a primeira instituição que lhe devolve o exercício regular
da liberdade política. Vede nossos cidadãos de todas as classes, de todas as profissões, saindo do círculo de seus trabalhos habituais, de sua indústria privada, encontrarse de repente do nível das funções importantes que a constituição lhes confia, escolher com discernimento, resistir com energia, confundir a astúcia, desafiar a
ameaça, resistir nobremente à sedução. Vede o patriotismo puro, profundo e sincero triunfando em nossas cidades, animando até nossos povoados, atravessando nossas oficinas, reanimando nossos campos, impregnando do sentimento de nossos direitos e da necessidade de garantias o espírito justo e reto do agricultor útil e do negociante hábil, que, conhecedores através da história dos males que sofreram, e não menos
esclarecidos sobre os remédios que esses males exigem, abrangem com o olhar a França inteira e, distribuidores do reconhecimento nacional, recompensam pelos votos,
há trinta anos, a fidelidade aos princípios, na pessoa do mais ilustre dos defensores da liberdade. Longe, pois, Senhores, de renunciar a alguma das duas espécies de liberdade de que vos falei, é preciso aprender a combiná-las. As instituições, como diz o célebre autor da história das repúblicas na Idade Média, devem realizar os destinos do gênero humano; elas cumprem tanto mais esse objetivo quanto mais elevam o maior número possíveis de cidadãos à mais alta dignidade moral. A obra do legislador não é completa quando apenas tornou o povo tranqüilo. Mesmo quando esse povo está contente, ainda resta muita coisa a fazer. É preciso que as instituições terminem a educação moral dos
cidadãos. Respeitando seus direitos individuais, protegendo sua independência, não perturbando suas ocupações, devem, no entanto, consagrar a influência deles sobre a coisa pública, chamá-los a participar do exercício do poder, através de decisões e de votos, garantir-lhes o direito de controle e de vigilância pela manifestação de suas opiniões e, preparando-os desse modo, pela prática, para essas funções elevadas, darlhes ao mesmo tempo o desejo e a faculdade de executá-las.
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FONTE Revista Filosofia Política no. 2, 1985