segunda-feira, 2 de abril de 2012

PROCESSO DE SELEÇÃO - PESQUISA SOBRE A CONDUTA PESSOAL DO CANDIDATO

A C Ó R D Ã O

2ª Turma

GMRLP/aon/jl

RECURSO DE REVISTA. NULIDADE DO ACÓRDÃO POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL (violação aos artigos 5º, XXXV, 515,§ 1º, do CPC e 832 da CLT). Há de se mostrar omissa a decisão, mesmo após a provocação da manifestação por intermédio de embargos declaratórios, para que reste demonstrada a negativa de prestação jurisdicional ensejadora do conhecimento do recurso de revista. Exegese do disposto no art. 535, inciso II, do CPC. O Colegiado examinou e fundamentou, em profundidade e extensão, toda a matéria que lhe foi devolvida, não havendo que se falar em negativa da prestação jurisdicional, mesmo porque o acórdão afastou, expressamente, a aplicação dos dispositivos legais invocados pelo embargante. Recurso de revista não conhecido.

PROCESSO DE SELEÇÃO - PESQUISA SOBRE A CONDUTA PESSOAL DO CANDIDATO (violação aos artigos 1º, III, 3º, IV, 5º, X, da CF/88, 1º, da Lei nº 9.029/1995). Não demonstrada violação à literalidade de preceito constitucional ou de dispositivo de lei federal, não há de se determinar o seguimento do recurso de revista com fundamento na alínea -c- do artigo 896 da Consolidação das Leis do Trabalho. Recurso de revista não conhecido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-38100-27.2003.5.20.0005, em que é Recorrente MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO DA 20ª REGIÃO e Recorrido G. BARBOSA COMERCIAL LTDA.

O Tribunal Regional do Trabalho da 20ª Região, mediante o acórdão de fls. 243/250, rejeitou a preliminar de incompetência absoluta, e, no mérito, ainda por maioria, deu provimento ao apelo para julgar a presente Ação Civil Pública improcedente, invertendo os ônus da sucumbência para propiciar à empresa ré a reversão ao seu patrimônio dos valores relativos às custas processuais e depósito prévio.

Opostos embargos de declaração pelo Ministério Público do Trabalho (fls. 255/261), negou-se provimento ao recurso por meio do acórdão de fls. 266/270.

Inconformado, o Ministério Público do Trabalho interpõe recurso de revista às fls. 274/289. Postula a reforma do decidido quanto aos seguintes temas: 1) nulidade do acórdão recorrido por negativa de prestação jurisdicional, por violação dos artigos 5º, XXXV, da CF/88, 832, da CLT, e 515, § 1º, do CPC; 2) Processo de seleção - pesquisa sobre a conduta pessoal do candidato, por violação aos artigos 1º, III, 3º, IV, 5º, X, da CF/88, 1º, da Lei nº 9.029/1995.

O recurso foi admitido pelo despacho de fls. 291/294.

O recorrido apresentou contrarrazões às fls. 296/306.

É o relatório.

V O T O

Recurso tempestivo (intimação do autor, por meio de sua procuradora, em 26/08/2005 (fls. 272) e recurso de revista protocolizado às fls. 274, em 09/09/2005, considerando-se o prazo em dobro para recorrer, sendo desnecessária a juntada de procuração e o preparo, cabível e adequado, o que autoriza a apreciação dos seus pressupostos específicos de admissibilidade.

1 - DA NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL - NULIDADE DO ACÓRDÃO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO

CONHECIMENTO

O recorrente alegou que o acórdão recorrido deve ser declarado nulo por negativa de prestação jurisdicional, -visto que não se manifestou expressamente sobre tese agitada pelo Ministério Público do Trabalho, qual seja, os incisos dos artigos 1º, 3º e 5º, da Constituição Federal, e citados na exordial...-.

Apontou violação aos artigos 5º, XXXV, da CF/88, 832, da CLT e 515, § 1º, do CPC.

O TRT da 20ª Região decidiu a controvérsia pelos seguintes fundamentos. In verbis (fls. 267/270):

-PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA

DESTA JUSTIÇA DO TRABALHO - DA RELAÇÃO

PRÉ-CONTRATUAL.

Vencido na preliminar transcrevo aqui os fundamentos constantes do voto prevalente do Exmo. Sr. Juiz Relator, do seguinte teor: ' Suscita a recorrente a prefacial em epígrafe, aduzindo que faleceria competência a esta Justiça Especializada para decidir, em sede de Ação Civil Pública, acerca da controvérsia existente quanto ao processo de seleção e recrutamento desenvolvido pela mesma.

Argumenta, com base no art. 114 da Constituição Federal, que a Justiça do Trabalho não apresenta competência para apreciar e julgar matéria anterior à celebração do contrato de trabalho.

O cerne da questão seria aferir se a prática da empresa-ré ao eliminar os candidatos a serem admitidos que tiverem os seus nomes inscritos no SPC ou no SERASA, bem como os que possuem pendências judiciais ou perante a polícia, revelar-se-ia ou não como forma de discriminação.

Com o advento da Emenda Constitucional nº. 45, de 08 de dezembro de 2004, houve uma significativa ampliação da competência da Justiça do Trabalho para apreciar e julgar as relações de trabalho e não apenas os litígios decorrentes das relações de emprego. Reconhece-se a sua competência para julgar toda e qualquer relação de trabalho, caracterizada em razão da natureza pessoal de que se reveste, apresentando-se em um dos pólos da relação o trabalhador, ainda que não exista um contrato de trabalho.

Extrai-se, portanto, que todo conflito decorrente de uma relação de trabalho, quer seja na fase pré-contratual, contratual ou pós-contratual é da competência do judiciário trabalhista.

A exegese que se impõe do novel art. 114 da Constituição Federal é no sentido de que é manifesta a competência da Justiça do Trabalho para ação proposta pelo Ministério Público do Trabalho em defesa da ordem jurídica trabalhista, visando a tutela dos direitos meta individuais, in casu, nos interesses difusos dos cidadãos interessados no acesso aos empregos oferecidos pela empresa.

A despeito de já ter adotado entendimento pela incompetência absoluta da Justiça do Trabalho para dirimir controvérsias decorrentes da fase pré-contratual, consoante acórdão nº. 2415/2003, referente ao RO-01162-2002-002-20-00-9 e outros julgamentos deste Regional, reposiciono-me no sentido de reconhecer a sua competência em razão da matéria para dirimir o caso em apreço.

Rejeito a prefacial em tela'.

M É R I T 0

PRÁTICA DISCRIMINATÓRIA E DANO MORAL COLETIVO - Insurge-se a recorrente contra a decisão de primeiro grau que a condenou na obrigação de não fazer, consistente na abstenção de realizar pesquisa junto a entidades de proteção ao crédito e a órgãos policiais e do Poder Judiciário, com a finalidade de subsidiar processo de seleção para contratação de empregados, sob pena de multa de R$ 10.000,00 por cada consulta realizada e, ainda, a pagar indenização de R$ 200.000,00 a título de dano moral coletivo. Alega que o comportamento adotado pela empresa não se classifica como discriminação, já que não se identifica com as hipóteses previstas no art. 5º da Constituição Federal, tampouco na Lei nº 9.029/95, que trata da diferenciação das pessoas em função de sua condição pessoal. Assevera que o critério utilizado pela empresa leva em consideração a conduta do indivíduo, justificável pela natureza do cargo a ser ocupado, não se caracterizando discriminação de cunho pessoal, esta sim, vedada pelo ordenamento jurídico pátrio. Por fim, sustenta a inexistência de dano moral coletivo, ante a ausência de nexo de causalidade e repercussão na sociedade, contrapondo-se ao valor da indenização sob argumento de ausência de critério seguro para sua fixação.

Considero que toda razão acompanha a recorrente.

Em primeiro lugar, a leitura dos dispositivos legais invocados pelas partes leva a concluir-se que a discriminação vedada pelo legislador é aquela decorrente de condição pessoal (sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade), vale dizer - discriminação por preconceito, e não de conduta pessoal (maneira de procedimento do indivíduo em suas relações interpessoais no seio da sociedade).

Em segundo lugar, é de se observar que qualquer processo seletivo, seja na administração pública ou privada, sustenta-se exatamente na discriminação (separação e escolha), método pelo qual se apura a diferenciação de qualificação (técnica ou científica) para o cargo e de conduta pessoal (vida pregressa), além das condições de saúde dos candidatos, sendo conveniente ressaltar que a variável conduta pessoal não tem, nem precisa ter qualquer correlação lógica com as atividades a serem desenvolvidas. Vale dizer - selecionar significa exatamente apurar diferenças, separar e escolher (discriminar). Logo, em um universo de pessoas ou coisas iguais não pode haver processo seletivo.

A invocação, pelo autor, da norma cristalizada no art. 5º da Constituição Federal, não impressiona, porque o legislador constituinte ao deixar consignado que - todos são iguais perante a lei, garante apenas que a lei terá sempre caráter geral, atingindo de maneira uniforme toda a coletividade. Isso não significa dizer que todos são iguais entre si.

O princípio da igualdade nas relações interpessoais, deve ser interpretado levando-se em conta a situação em que cada um se encontra, conforme pensamento do filósofo grego Aristóteles, adotado por Duguit e divulgado no Brasil pelo inesquecível Rui Barbosa, segundo o qual - 'A regra da igualdade não consiste senão em quinhoar desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam. (...) Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante e não igualdade real'.

A Lei nº 9.029/95, também não se presta para sustentar a pretensão do autor, eis que, assim como o texto constitucional, em seu art. 1º, proíbe tão somente - a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso à relação de trabalho, ou sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade (...), corroborando plenamente o entendimento que a discriminação vedada por lei é aquela decorrente da condição da pessoa e não da conduta da pessoa, enumerando taxativamente as condições pessoais que não podem servir de base discriminatória, isto é, os motivos que não podem ser levados em consideração como diferenciadores em um processo seletivo.

Elucidativa, neste sentido, é a lição de Emmanuel Teófilo Furtado, mestre e doutor em direito, Juiz do Trabalho Titular da 11ª Vara do Trabalho de Fortaleza, in Isonomia à Luz da Constituição e das Leis e o Trabalho da Mulher, Revista LTR, out/2004, p. 1188/1189, do seguinte teor:

'Mas há que se esclarecer que, se por um lado a primeira idéia que vem à baila é a de que o legislador lançou o seu manto protetor sobre todo e qualquer tipo de discriminação, por outro ficou evidente que os tipos de discriminação que não hão de ser tolerados são, de forma enumerativa, e não exemplificativa, as tangentes a sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade.

A expressão qualquer se refere, pois, às formas, meios e métodos por meio dos quais venham a se consumar discriminações envolvendo as razões enumerativas (numerus clausus) estampadas no texto legal, a saber, enfatize-se, discriminações quanto ao sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade, e nada mais'.

A prática adota pela empresa não se identifica com as hipóteses de discriminação preconceituosa enumeradas e vedadas pelo legislador, assim como com elas também não se identificam, no âmbito da administração pública, as exigências inseridas no processo seletivo para o próprio Ministério Público do Trabalho, no qual se observa rígida perquirição sobre a conduta (vida pregressa) do candidato, nos seguintes tópicos:

'(..........)

VIII - DA INSCRIÇÃO DEFINITIVA.

Art. 40 - A inscrição definitiva deverá ser requerida, ao Presidente da Comissão Examinadora, pelo candidato, e entregue às Comissões de Execução e Fiscalização, nos Estados e no Distrito Federal, que a remeterá à Secretaria de Concurso, contendo os seguintes elementos de instrução:

(...........)

V - Declarações acerca da idoneidade do candidato, firmadas por membros do Ministério Público, magistrados, professores universitários, dirigentes de órgãos da administração pública ou de advogados, no total de 3 (três);

VI - Certidões cíveis e criminais dos setores de distribuição dos lugares em que tenha residido nos últimos 5 (cinco) anos, das Justiças Federal, Estadual, Eleitoral e Militar;

VII - Curiculum Vitae do candidato, com indicação de todos os locais de seu domicílio nos últimos cinco anos, mencionando os cargos ou empregos exercidos neste período, com os nomes e endereços das autoridades ou empregadores com os quais manteve vínculo;

VIII - Certidão negativa da OAB, esclarecendo que o candidato nunca foi punido pela entidade (se o candidato for ou tiver sido inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil);

IX - Declaração do órgão público a que esteja vinculado, se for o caso, registrando que o candidato nunca sofreu punição;

(.........)

Art. 41 - Na conversão em caráter definitivo da inscrição, o Presidente da Comissão Examinadora poderá promover as diligências que se fizerem necessárias sobre a vida pregressa do candidato, colher elementos informativos junto a quem os possa fornecer e convocar o candidato para ser ouvido, assegurando-se a tudo tramitação reservada, correndo por conta do candidato as despesas de viagem, de alimentação e de estada.' (grifei) - EDITAL DO XI CONCURSO PARA O MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO.

A própria Constituição Federal de 1988 nos dá exemplos literais de discriminação das pessoas quanto ao cabedal técnico-científico (qualificação) e reputação (conduta social) para acesso ao Supremo Tribunal Federal e Tribunais Superiores, servindo de exemplo a norma do art. 101, que tem a seguinte redação: 'O Supremo Tribunal Federal compõe-se de onze Ministros, escolhidos dentre cidadãos com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada'. (grifei). Aqui, como se vê, de imediato discrimina-se (afasta-se do universo dos possíveis indicados) aqueles cidadãos que não são considerados portadores de notável saber jurídico (qualificação técnico-científica para o cargo) e reputação ilibada (conduta pessoal inatacável).

Obviamente que tais exigências não são preconceituosas e se justificam na dignidade e magnitude dos cargos a serem ocupados. Mas, nem por isso deixam de ser discriminatórias. Do trabalhador comum não se há de exigir notável qualificação técnica ou reputação ilibada, mas, não se pode retirar do empresário o direito de separar e escolher para o seu serviço, dentre os candidatos que se apresentam, aqueles que são portadores das qualificações técnicas necessárias e cuja conduta pessoal não se desvia da normalidade.

Por outro lado, os serviços de proteção ao crédito (SPC e SERASA), assim como os registros policiais e judiciais existem exatamente para serem consultados pelos interessados e as consultas formuladas não representam invasão da intimidade ou da vida privada.

Intimidade ou vida privada são enunciados do pensamento que traduzem a mesma realidade, isto é, o caráter do que é íntimo, secreto, interior e profundo no próprio ser ou no recesso do seu lar. Portanto, no momento em que qualquer fato pertinente à conduta do cidadão encontra-se legalmente anotado por terceiro em registro do SPC, SERASA, órgão policial ou judicial, deixa tal fato de pertencer à sua intimidade ou vida privada. Se invasão de privacidade ou intimidade houve, foi perpetrada por quem procedeu à anotação e não por aquele que dela tomou conhecimento.

Finalmente, é de se observar que a única coletividade pretensamente prejudicada pela pesquisa empresarial seria a daqueles que, desviando-se da conduta normal exigida pela coletividade maior (sociedade brasileira), deixam de cumprir as suas obrigações contratuais ou cometem algum crime. Nesse passo, não há falar em cometimento de dano moral à coletividade dos trabalhadores, quando a empresa em seu processo seletivo afasta aqueles de conduta duvidosa, a menos que se entenda serem os trabalhadores brasileiros descumpridores de suas obrigações ou que estejam normalmente envolvidos em inquéritos policiais ou processos judiciais.

Data vênia, parece-me desproposital que o D. Ministério Público pretenda ver a empresa condenada no pagamento de indenização por dano moral decorrente de alegada ofensa à coletividade dos maus pagadores, que não cuida de manter-se dentro dos parâmetros da vida em sociedade.

A inadimplência onera os preços dos produtos, sendo certo que em toda compra parcelada (crediário) ou mesmo nos empréstimos bancários, acrescenta-se ao valor real, além dos juros e taxas, também um percentual variável a título de risco de inadimplência. Conclui-se, portanto, que toda a coletividade termina onerada pelo inadimplente, sendo certo que, sob esse aspecto, não se lhe há de dar tratamento igualitário.

Quem assume dívidas além de sua capacidade de pagamento e, por isso mesmo, descumpre o contrato e tem o seu nome inscrito no rol dos maus pagadores pelos serviços de proteção ao crédito SPC ou SERASA (esta controlada pelo próprio Banco Central) não pode sentir-se ultrajado ou invadido em sua intimidade nem pretender indenização por dano moral (diga-se moral da qual não cuidou devidamente), quando tal fato é levado em consideração em um processo seletivo.

Vencido na preliminar conheço do recurso e, no mérito dou-lhe provimento para julgar a presente Ação Civil Pública improcedente, invertendo os ônus da sucumbência para propiciar à empresa ré a reversão ao seu patrimônio dos valores relativos às custas processuais e depósito prévio.- (sem destaques no original)

Dessa decisão, o Ministério Público do Trabalho opôs embargos de declaração (fls. 255/261), onde se requereu, sob o título -DA MATÉRIA A SER PREQUESTIONADA-, a manifestação do Tribunal Regional a respeito dos artigos 1º, III, 3º, IV, 5º, X, da CF/88 e 1º, da Lei nº 9.029/95.

O TRT da 20ª Região negou provimento aos embargos de declaração pelos seguintes fundamentos. In verbis (fls. 266/270):

-Pretende o Embargante ver expressamente prequestionada violação dos artigos 1º, inciso III, 3º, inciso IV, 5º, inciso X, da Constituição Federal, e 1º da Lei nº 9.029/95. Requer ainda que esta Corte declare expressamente quais os incisos dos artigos 1º, 3º e 5º da Constituição Federal fundamentam sua decisão.

Alega que, ao dizer que a proibição de discriminação não atinge os aspectos relativos à conduta pessoal, a decisão viola a Constituição da República e a lei, considerando legítimas discriminações decorrentes de opção político-partidária, político-ideológica e orientação sexual, por exemplo, não relacionadas à condição pessoal.

No que se refere aos mecanismos utilizados pela Administração Pública na seleção de pessoal para desempenho de funções na administração, observa que a pesquisa é feita em prol do interesse público e não na defesa do interesse privado do empregador, violando a decisão o art. 5º, inciso X, da Constituição Federal.

Aduz que, ao dizer que o legislador enumerou taxativamente os motivos que não podem ser levados em consideração como diferenciadores em um processo seletivo, violou o inciso IV do art. 3º da Constituição Federal, que veda quaisquer formas de discriminação. Sustenta que se trata de matéria relativa, não podendo ser previstas todas as formas de discriminação, sob pena de violação ao inciso III do art. 1º da Carta Política, que fala do princípio da dignidade da pessoa humana.

Não prevalecem os argumentos do Embargante.

Inicialmente é imperativo destacar que o prequestionamento, tal como pacificamente aceito pela Jurisprudência dos nossos Tribunais, inclusive do TST, não se constitui mais uma hipótese de cabimento de Embargos de Declaração, mas está diretamente relacionado àquelas previstas nos artigos 535 do CPC e 897-A da CLT, conforme se observa da Súmula nº 297 do C. TST, citada pelo Embargante na sua fundamentação. In litteris: '(...)2. Incumbe à parte interessada, desde que a matéria haja sido invocada no recurso principal (grifos do relator), opor embargos declaratórios objetivando o pronunciamento sobre o tema, sob pena de preclusão. (...)'

Já existe, inclusive, posicionamento desta Corte acerca desse assunto, na novel Súmula nº 4, que assim dispõe:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - PREQUESTIONAMENTO - OMISSÃO - PROVIMENTO.

A procedência aos embargos declaratórios, visando ao prequestionamento, condiciona-se à existência de omissão no julgado impugnado.

Há que se verificar, portanto, se houve omissão do julgado na análise dos fundamentos evocados pelas partes, condição para acolhimento dos embargos, ainda que para fins de prequestionamento.

No tocante aos dispositivos legais citados na exordial, cumpre frisar que não está o Juiz a eles adstrito, no julgamento da pretensão posta em Juízo. A análise dos artigos 840, parágrafo 1º, da CLT e 126 do CPC leva à conclusão de que às partes incumbe narrar os fatos nos quais amparam sua pretensão, enquanto ao órgão julgador compete proceder à incidência da norma abstrata sobre a situação fática enfocada nos autos, como dispões os brocardos jurídicos da mihi factum, dabo tibi jus (dá-me o fato, dar-te-ei o direito) e jura novit curia (o Juiz conhece o direito).

Assim, se pronunciando o Juiz sobre as alegações trazidas pela parte, não está obrigado a se manifestar sobre cada um dos dispositivos legais invocados, não havendo que se falar em omissão o não enquadramento em qualquer deles. Neste sentido têm decidido nossos Tribunais, conforme arestos ora transcritos:

EMENTA: RECURSO DE REVISTA - NULIDADE DO ACÓRDÃO REGIONAL - ALTERAÇÃO DA CAUSA DE PEDIR E DO PEDIDO - VIOLAÇÃO LITERAL DE DISPOSITIVOS LEGAIS E CONSTITUCIONAIS NÃO CONSTATADA - Da análise conjugada dos artigos 840, parágrafo 1º, da CLT e 126 do CPC, extrai-se que às partes incumbe narrar os fatos nos quais amparam sua pretensão, enquanto ao órgão julgador compete proceder à incidência da norma abstrata sobre a situação fática enfocada nos autos (da mihi factum, dabo tibi jus). Segue-se, portanto, que o juiz não está vinculado aos fundamentos legais indicados pelo demandante, sendo-lhe permitido decidir com base em diploma normativo não invocado na petição inicial, sem que isto caracterize afronta à literalidade dos artigos 264, parágrafo único, e 321 do CPC e 5º, inciso LV, da CF/1988. Recurso não conhecido. (TST - RR 416228 - 1ª T. - Rel. Juiz Conv. Altino Pedrozo dos Santos - DJU 14.05.2004).

PROCESSUAL CIVIL - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - INEXISTÊNCIA DE OMISSÃO - IMPROVIMENTO - 1. Inocorrência de omissão no V. Acórdão, ao reconhecer o direito do Terceiro Embargante de ver o seu bem constrito liberado da penhora quando não for parte no processo, e nem responder de qualquer forma pela dívida. 2. O Juiz ou o Tribunal, devem considerar os fatos e os fundamentos jurídicos do pedido, e não os dispositivos legais invocados pelas partes; tampouco estão adstritos a examinar todos os argumentos jurídicos, ou a invocação desta ou daquela regra ou princípio jurídico - Jura novit cúria e narra mihi factum dabotibi jus. 3. Pressuposto de admissibilidade dos Embargos de Declaração é a existência de obscuridade ou contradição no acórdão, ou omissão de algum ponto sobre o qual deveria o Tribunal pronunciar-se; quando isso não se configura, não há como se acolher o recurso, ainda quando se o tenha feito desafiar, para fins de prequestionamento. Precedentes jurisprudenciais. Embargos de Declaração improvidos. (TRF 5ª R. - REO-AC 164978 - (99.05.15378-0/01) - PE - Rel. Des. Fed. Geraldo Apoliano - DJU 04.03.2005 - p. 775).

In casu, verifica-se que a decisão embargada examinou, detidamente, todos os argumentos apresentados pelas partes, tanto nas razões recursais quanto nas contra-razões, apenas não se curvando ao enquadramento legal pretendido pelo autor. Observa-se ainda que não foi apontado, nos embargos de declaração, nenhum ponto sobre o qual esta Corte teria deixado de se manifestação. Pelo contrário, foi invocado o prequestionamento como uma hipótese a mais de cabimento do apelo além daquelas previstas nos artigos 535 do CPC e 897-A da CLT, questão já superada nos argumentos acima expostos.

Não há, por outro lado, que se adentrar no mérito da questão e se identificar quais condutas estariam ou não vedadas pelo ordenamento jurídico, especialmente os artigos 1º, inciso III, 3º, inciso IV, 5º, inciso X, da Constituição Federal, já que a decisão está circunscrita a um caso concreto, a um comportamento determinado, e como tal foi analisado e decidido. Cumpre destacar que a decisão embargada está fundamentada na ausência de impedimento legal ao procedimento adotado pela ré, não se enquadrando sua conduta nos dispositivos legais mencionados pelo autor, quer da Lei nº 9.029/95 quer da Constituição Federal, estando, por conseqüência, amparada na norma contida no art. 5º, inciso II, da Constituição Federal, segundo o qual 'ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei'.

Não se configurando, pois, a existência de omissão na decisão embargada no tocante à análise das questões trazidas a esta Corte, impossibilitado o acolhimento dos Embargos de Declaração, ainda que para fins de prequestionamento.

Isto posto, conheço dos Embargos de Declaração e nego-lhe provimento.- (sem destaques no original)

Destarte, não vislumbro violação ao artigo 832, da CLT, na medida em que o TRT da 20ª Região, ainda que tenha salientado não ser obrigado a se manifestar sobre todos os dispositivos legais mencionados pelas partes, de fato pronunciou-se especificamente sobre os artigos 1º, III, 3º, IV, 5º, X, e 1º da Lei nº 9029/95, afastando-os por considerar que a conduta do réu estava assegurada pelo artigo 5º, II, da CF/88.

Além disso, ainda que omisso o acórdão regional, o que de fato não ocorreu, à hipótese dos autos se aplicaria o item III da Súmula nº 297 desta Corte, segundo a qual -Considera-se prequestionada a questão jurídica invocada no recurso principal sobre a qual se omite o Tribunal de pronunciar tese, não obstante opostos embargos de declaração.-.

Assinalo, outrossim, que segundo entendimento emanado da Orientação Jurisprudencial de nº 115 da SBDI-1 desta Corte, -O conhecimento do recurso de revista ou de embargos, quanto à preliminar de nulidade por negativa de prestação jurisdicional, supõe indicação de violação do art. 832 da CLT, do art. 458 do CPC ou do art. 93, IX, da CF/1988-, não se ajustando ao fim colimado a alegação de afronta aos artigos 5º, XXXV, da CF/88, e 515, § 1º, do CPC.

Não conheço.

2 - PROCESSO DE SELEÇÃO - PESQUISA SOBRE A CONDUTA PESSOAL DO CANDIDATO

CONHECIMENTO

O recorrente alegou que o acórdão recorrido violou os artigos 1º, III, 3º, IV, 5º, X, da CF/88, 1º, da Lei nº 9.029/1995, sustentando, em síntese, que a conduta da reclamada é discriminatória e fere os dispositivos legais em destaque.

O artigo 1º, III, da CF/88, insere-se como um dos -fundamentos- da República Federativa do Brasil, relacionado à -dignidade da pessoa humana-, matéria esta totalmente estranha à controvérsia dos autos, que aborda pedido de obrigação de não fazer, abstenção de prática supostamente discriminatória, cumulado com indenização por dano moral coletivo.

Além disso, referido preceito tem caráter eminentemente genérico, inaplicável à hipótese vertente.

No mesmo sentido, não se reconhece a alegada violação direta e literal ao artigo 3º, IV, da CF/88, que também de forma genérica estabelece os -objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil-, dentre os quais -promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.-.

O artigo 5º, X, da CF/88 dispõe que -são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;-.

Se os cadastros de pesquisas analisados pela reclamada são públicos, de acesso irrestrito à toda a coletividade, não há como admitir que a conduta da empresa tenha violado a -intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas-.

O artigo 1º da Lei nº 9029/95 dispõe, in verbis:

-Art. 1º Fica proibida a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso a relação de emprego, ou sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade, ressalvadas, neste caso, as hipóteses de proteção ao menor previstas no inciso XXXIII do art. 7º da Constituição Federal.

Referido dispositivo, contudo, trata especificamente de práticas discriminatórias relacionadas a -motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade-, não tendo qualquer pertinência com a prática da reclamada em realizar prévia consulta sobre a conduta dos candidatos às vagas de trabalho disponibilizadas pela empresa.

Se não há qualquer vedação legal à própria existência de serviços de proteção ao crédito (SPC e SERASA), de registros policiais e judiciais, menos ainda poderia ocorrer quanto à possibilidade de algum interessado pesquisar tais dados, a fim de melhor avaliar os riscos a serem enfrentados caso decida realizar o negócio jurídico que tem em mente, e, mais especificamente, à contratação de empregados.

Como bem salientado pelo acórdão recorrido, -não se pode retirar do empresário o direito de separar e escolher para o seu serviço, dentre os candidatos que se apresentam, aqueles que são portadores das qualificações técnicas necessárias e cuja conduta pessoal não se desvia da normalidade-.

Se a Administração Pública, em praticamente todos os processos seletivos que realiza, exige dos candidatos, além do conhecimento técnico de cada área, inúmeros comprovantes de boa conduta e reputação, não há como vedar ao particular, no caso o empregador, o acesso a cadastros públicos como mais mecanismo de melhor selecionar candidatos às suas vagas de emprego, mesmo porque todos estes cadastros detém natureza pública, de acesso irrestrito a qualquer interessado, salvo as exceções legais.

Não conheço.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, não conhecer do recurso de revista.

Brasília, 08 de fevereiro de 2012.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

Renato de Lacerda Paiva

Ministro Relator


fls.

PROCESSO Nº TST-RR-38100-27.2003.5.20.0005



Firmado por assinatura digital em 09/02/2012 pelo sistema AssineJus da Justiça do Trabalho, conforme MP 2.200-2/2001, que instituiu a Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira.

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