COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO E JUSTIÇA E DE CIDADANIA
PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO Nº 171, DE 1993
(Em apenso: PECs n°s 37, de 1995; 91, de 1995; 386, de 1996; 426, de
1996; 301, de 1996; 531, de 1997; 68, de 1999; 133, de 1999; 150, de 1999; 167, de
1999; 169, de 1999; 633, de 1999; 260, de 2000; 321, de 2001; 377, de 2001; 582,
de 2002; 64, de 2003; 179, de 2003; 302, de 2004; 242, de 2004; 272, de 2004;
345, de 2004; 489, de 2005; 48, de 2007; 73, de 2007; 87, de 2007; 85, de 2007;
125, de 2007; 399, de 2009; 57, de 2011; 223, de 2012 e 228, de 2012).
Altera a redação do art. 228 da
Constituição Federal (imputabilidade penal
do maior de dezesseis anos).
AUTORES
: Deputado BENEDITO
DOMINGOS e outros
RELATOR
: Deputado LUIZ COUTO
I - RELATÓRIO
A presente proposta de emenda à Constituição, cujo
primeiro signatário é o ex-Deputado Benedito Domingos, tem por objetivo
alterar o art. 228 do texto constitucional, com o fim de reduzir, de dezoito para
dezesseis anos, a idade mínima ali prevista para aquisição da maioridade
penal.
A alentada justificação que acompanha a proposta
destaca que a conceituação da inimputabilidade penal, no direito brasileiro, tem
como fundamento básico a presunção legal de menoridade e seus efeitos, na
fixação da capacidade para entendimento do ato delituoso. Daí por que o
critério adotado para essa avaliação é o biológico. Ao aferir-se esse grau de
2
entendimento do menor, tem-se como valor maior sua idade, pouco importando
o seu desenvolvimento mental.
Destaca, também, o maior desenvolvimento mental
verificado nos jovens da atualidade em comparação à época da edição do
Código Penal, nos anos quarenta. O acesso à informação, a liberdade de
imprensa, a ausência de censura prévia, a liberação sexual, dentre outros
fatores, aumentaram o discernimento dos jovens para compreender o caráter
de licitude ou ilicitude dos atos que praticam, sendo razoável, segundo a linha
de argumentação desenvolvida na justificação da proposta, que possam ser
responsabilizados por eles.
Observa-se que a justificação, que data de 19 de agosto
de 1993, já registrava, como fato preocupante, o crescente aumento do
número de delitos praticados por menores de dezoito anos.
Apensadas à
PEC nº 171, de 1993, do Deputado
Benedito Domingos
– que altera a redação do artigo 228 da Constituição
Federal (imputabilidade penal do maior de dezesseis anos), para tornar
penalmente inimputáveis os menores de dezesseis anos; nos termos do art.
139, I, do Regimento Interno da Câmara dos Deputados, encontram-se as
PECs n°s 37, de 1995
, do Deputado Telmo Kirst e outros – que altera o
artigo 228 da Constituição Federal, para tornar penalmente inimputáveis
os menores de dezesseis anos;
91, de 1995, do Deputado Aracely de
Paula e outros
– altera o artigo 228 da Constituição Federal; para tornar
os menores de dezesseis anos penalmente inimputáveis;
386, de 1996,
do Deputado Pedrinho Abrão e outros
– modifica o artigo 228 da
Constituição Federal
, para tornar penalmente inimputáveis os menores
de dezoito anos;
426, de 1996, da Deputada Nair Xavier Lobo e outros –
dá nova redação ao artigo 228 da Constituição Federal, para tornar
penalmente inimputáveis os menores de dezesseis anos;
301, de 1996,
do Deputado Jair Bolsonaro e outros
– dá nova redação ao artigo 228 da
Constituição Federal, para tornar penalmente inimputáveis os menores
de dezesseis anos;
531, de 1997, do Deputado Feu Rosa e outros –
altera a redação do artigo 228 da Constituição Federal, para tornar
penalmente inimputáveis os menores de dezesseis anos;
68, de 1999, do
Deputado Luiz Antônio Fleury e outros
– dá nova redação ao artigo 228
da Constituição Federal, para tornar penalmente inimputáveis os
menores de dezesseis anos;
133, de 1999, do Deputado Ricardo Izar e
3
outros
– dá nova redação ao artigo 228 da Constituição Federal, que
trata da inimputabilidade penal, para tornar penalmente inimputáveis os
menores de dezesseis anos;
150, de 1999, do Deputado Marçal Filho e
outros
– dá nova redação ao artigo 228 da Constituição Federal, para
tornar penalmente inimputáveis os menores de dezesseis anos;
167, de
1999
, do Deputado Ronaldo Vasconcelos e outros – altera o artigo 228
da Constituição Federal, para tornar penalmente inimputáveis os
menores de dezesseis anos;
169, de 1999, do Deputado Nelo Rodolfo e
outros
– altera o artigo 228 da Constituição Federal, para tornar
penalmente inimputáveis os menores de quatorze anos;
633, de 1999, do
Deputado Osório Adriano e outros
– altera o artigo 228 da Constituição
Federal, para tornar penalmente inimputáveis os menores de dezesseis
anos;
260, de 2000, do Deputado Pompeo de Mattos e outros – altera o
artigo 228 da Constituição Federal, estabelecendo a maioridade aos
dezoito anos, para tornar penalmente inimputáveis os menores de
dezessete anos;
321, de 2001, do Deputado Alberto Fraga e outros – dá
nova redação ao artigo 228 da Constituição Federal que versa sobre a
menoridade penal, para remeter a lei ordinária;
377, de 2001, do
Deputado Jorge Tadeu Mudalen e outros
– altera o artigo 228 da
Constituição Federal, para tornar penalmente inimputáveis os menores
de dezesseis anos;
582, de 2002, do Deputado Odelmo Leão e outros –
dá nova redação ao artigo 228 da Constituição Federal, para tornar
penalmente inimputáveis os menores de dezesseis anos;
64, de 2003, do
Deputado André Luiz e outros
– acrescenta o Parágrafo Único ao artigo
228 da Constituição Federal, para tornar penalmente inimputáveis os
menores de dezoito anos e maiores de dezesseis anos;
179, de 2003, do
Deputado Wladimir Costa e outros
– dá nova redação ao artigo 228 da
Constituição Federal, para tornar penalmente inimputáveis os menores
de dezesseis anos;
302, de 2004, do Deputado Almir Moura e outros –
dá nova redação ao artigo 228, da Constituição Federal e tornando
relativa a imputabilidade penal dos dezesseis aos dezoito anos, para
tornar penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos;
242, de
2004
, do Deputado Nelson Marquezelli e outros – dá nova redação ao
artigo 228 da Constituição Federal, para tornar penalmente inimputáveis
os menores de quatorze anos;
272, de 2004, do Deputado Pedro Corrêa
e outros
– dá nova redação ao artigo 228 da Constituição Federal, para
tornar penalmente inimputáveis os menores de dezesseis anos;
345, de
2004
, do Deputado Silas Brasileiro e outros – dá nova redação ao artigo
4
228 da Constituição Federal, para tornar penalmente inimputáveis os
menores de doze anos;
489, de 2005, do Deputado Medeiros e outros –
dá nova redação ao artigo 228 da Constituição Federal, para tornar
penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos;
48, de 2007, do
Deputado Rogério Lisboa e outros
– altera o artigo 228 da Constituição
Federal, para tornar penalmente inimputáveis os menores de dezesseis
anos;
73, de 2007, do Deputado Alfredo Kaefer e outros – dá nova
redação ao artigo 228 da Constituição Federal, para tornar penalmente
inimputáveis os menores de dezoito anos;
87, de 2007 do Deputado
Rodrigo de Castro e outros
– considera penalmente imputáveis os
menores de dezoito anos caso que especifica;
85, de 2007, do Deputado
Onyx Lorenzoni e outros
– altera o artigo 228 da Constituição Federal,
para tornar penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos;
125,
de 2007
, do Deputado Fernando de Fabinho e outros – altera o artigo
228 da Constituição Federal, para tornar penalmente inimputáveis as
crianças;
399, de 2009, do Deputado Paulo Roberto e outros – dá nova
redação ao artigo 228 da Constituição Federal tornando relativa a
imputabilidade penal dos 14 aos 18 anos para crimes praticados com
violência ou grave ameaça a integridade das pessoas, para tornar
penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos;
57, de 2011, do
Deputado André Moura e outros
– altera o artigo 228 da Constituição
Federal, para tornar penalmente imputáveis os maiores de dezesseis
anos;
223, de 2012, do deputado Onofre Santo Agostini e outros –
dispõe sobre alteração do artigo 228 da Constituição Federal, propondo a
redução da maioridade penal, para tornar penalmente inimputáveis os
menores de dezesseis anos e a
228, de 2012, da Deputada Keiko Ota e
outros
– altera o artigo 228 da Constituição Federal para reduzir a idade
prevista para imputabilidade penal nas condições que estabelece, para
tornar penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos; que tratam
da mesma matéria.
Dentre diversas opções normativas projetadas nessas
propostas, distinguimos a
PEC nº 260/00, que propõe seja fixada em
dezessete anos
o início da maioridade penal; as PEC`s 223/12; 48/2007;
272/04; 377/01; 582/02 e 179/03
que propõem sejam fixadas em dezesseis
anos
; as PECs nºs 169/99 e 242/04, dos deputados respectivamente, Nelo
Rodolfo e Nelson Marquezelli,
que propõem sua fixação aos quatorze anos;
a de nº.
321/01, que pretende remeter a matéria à lei ordinária retirando do
5
texto constitucional a fixação da maioridade penal e a
PEC 345, de 2004, do
Deputado Silas Brasileiro
, que propõe seja fixada em doze anos o início da
maioridade penal.
A proposta principal tramita na Câmara dos Deputados há
aproximadamente vinte anos. Nesta Comissão de Constituição e Justiça e de
Cidadania (CCJC), foi relatada pelos ex- Deputados José Luiz Clerot, Inaldo
Leitão e Marcelo Itagiba, os quais concluíram pela admissibilidade da matéria.
Todavia, os pareceres respectivos não chegaram a ser apreciados por este
Órgão Colegiado.
Registramos, também, que as PEC's em exame foram
redistribuídas, em 2001, ao Deputado Osmar Serraglio, que realizou um
esclarecedor estudo sobre a matéria.
Tendo em vista a complexidade do tema, em 1999, o
então Presidente desta Comissão, Deputado José Carlos Aleluia, determinou a
realização de duas audiências públicas visando ao debate de ideias, não só
entre os membros da CCJC, mas também entre a sociedade civil organizada e
os representantes do Executivo da área infanto-juvenil.
Sobre as audiências públicas é importante trazer à
colação trechos do parecer apresentado pelo ex-Deputado Inaldo Leitão sobre
tais eventos:
DAS AUDIÊNCIAS PÚBLICAS
A primeira audiência pública foi realizada no dia 10
de novembro de 1999, tendo como convidados o jurista
Miguel Reale Júnior, a representante da UNICEF Arabela
Rota, o desembargador Alyrio Cavallieri, a Secretária
Nacional de Justiça Elizabeth Sussekind, o representante
da OAB Nabor Bulhões, o Secretário de Justiça do
Estado de Minas Gerais Luiz Tadeu Leite, o ex-Ministro e
Prefeito da cidade de Pato Branco Alceni Guerra e o
representante da ABROMQ, Deputado Emerson Kapaz.
Todas as manifestações feitas pelos palestrantes,
sem exceção, foram no sentido de se rejeitar a matéria.
Isto quanto ao mérito. O argumento central: o falido
sistema penitenciário nacional, brutalizador, desumano e
incapaz de ressocializar o apenado.
Citando dados do Ministério da Justiça, o jurista
6
Miguel Reale Júnior lembrou que há no Brasil cerca de 20
milhões de menores entre 12 e 17 anos. Destes, 22 mil
estão submetidos às medidas sócio-educativas. A maior
parte dos atos infracionais, sustentou Reale Júnior, são
praticados por adolescente de 16 e 17 anos. Isso, no
entanto, não significaria que existia uma avalanche de
atos infracionais praticados por menores em comparação
com os praticados pelos adultos.
"Devemos desfazer o mito de que existe um
aumento (da criminalidade infanto-juvenil)", ressaltou
Reale Júnior, lembrando que, pelo último censo
penitenciário, haveria no Brasil 85 pessoas encarceradas
para cada 100 mil habitantes.
Para o palestrante, a resposta para a redução da
criminalidade infanto-juvenil não está na mudança da Lei,
e sim na efetiva implementação do Estatuto da Criança e
do Adolescente - ECA. "A falta de aplicação do Estatuto
gera uma reincidência que beira os 40%": concluiu o
professor Miguel Reale Júnior.
Quanto a existência de óbice para a alteração do
texto do art. 228 da Constituição Federal - considerada
por uma corrente de juristas como
clausula pétrea - o
palestrante assinalou, verbis:
"Concordo integralmente com a tese de que os
direitos e garantias individuais não se limitam àqueles que
estão estabelecidos no art. 5º. Lembro, por exemplo, o
direito à anualidade que consta do Capítulo do Direito
Tributário. Não há, a meu ver, uma limitação espacial com
relação aos direitos e garantias individuais.
Entendo, por outro lado, que não se estabelece no
art. 228 um direito e garantia individual fundamental que
deva ser preservado como cláusula pétrea. Acredito que
não exista no direito pétreo a inimputabilidade. Ou seja,
não há nada que justifique que se deva considerar como
imutável, como fundamental, além da estrutura do Estado
Democrático, porque foi isso que a Constituição
pretendeu fazer ao estabelecer as cláusulas pétreas. Isto
é, além da proibição de abolição da Federação, da
autonomia e da independência dos Poderes, o voto
direto, secreto, universal e periódico e, ao mesmo tempo,
falando dos direitos e garantias individuais enquanto
estruturas fundamentais para a preservação do Estado
7
Democrático. Não vejo, portanto, que no art. 228 esteja
contido um principio fundamental, um direito fundamental
que deva ser basilar para a manutenção do Estado
Democrático.
Por esta razão não entendo que o
preceito que está estabelecido no art. 228 venha a se
constituir numa cláusula pétrea.”
Portador da posição oficial da Ordem dos
Advogados do Brasil, o jurista e advogado Antônio Nabor
Areia Bulhões manifestou-se pela rejeição de proposta
desta natureza por diversas ordens de objeções, de
natureza de inconveniência e de natureza jurídica, pondose
a matéria de alguma forma em âmbito até de
admissibilidade.
Autor do voto acolhido à unanimidade no Conselho
Pleno da OAB, Nabor Bulhões considerou um equívoco
pretender fazer crer que a solução para o problema da
delinqüência juvenil passaria necessariamente pela
responsabilização penal dos adolescentes (a partir dos
dezesseis anos).
Para ele, as propostas são fruto de equívocos
emergentes de movimentos radicais de política criminal -
a exemplo da corrente de Lei e Ordem (Law and Order)
–
responsáveis pela difusão de crença errônea, arraigada
na consciência de parcela do povo brasileiro, de que
somente o Direito Penal fornece resposta adequada a
prevenção e solução dos desvios sociais.
Bulhões cita análise de Damásio de Jesus para
fulminar a possibilidade de se inserir no Sistema Ordinário
de Justiça Criminal os jovens a partir dos dezesseis anos:
"O Direito Penal Brasileiro mostra-se em fase de
concordata. Incursionando no ramo do terreno da
corrente de ”Lei e Ordem" (Francisco de Assis Toledo,
Crimes Hediondos, Fascículos de Ciência Penais. Porto
Alegre, Sergio A.Fabris, Editor, 5:59
, n.2) está colhendo o
fracasso de seus princípios. Além de não conseguir
baixar a criminalidade a índices razoáveis, geram a
sensação popular da impunidade, a morosidade da
Justiça Criminal e o grave problema penitenciário (sobre
o tema: Alberto Zacharias Torom -Prevenção, retribuição
e criminalidade violenta
, RT, 694:275)"
Sempre tendo como alvo o sistema prisional
brasileiro, Nabor Bulhões reproduz outras menções
dignas de registro, por Damásio de Jesus:
8
César Roberto Bitencourt (Falência da pena de
prisão. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1993): "A pena
privativa de liberdade, como sanção principal e de
aplicação genérica, está falida. Não readapta o
delinqüente”.
Evandro Lins e Silva (De Beccaria a Filippo
Gramática, in Sistema Penal para o terceiro milênio, Rio
de Janeiro, Ed. Revam, 1991, p.33 e 34): "Ela (a prisão)
perverte, corrompe, deforma, avilta, embrutece, é uma
fábrica de reincidência, é uma universidade as avessas,
onde se diploma o profissional do crime. Se não a
pudermos eliminar de uma vez, só devemos conservá-la
para os casos em que ela é indispensável.”
Bulhões cita Manoel Pedra Pimentel para quem
nesse campo "nosso insucesso é total" (Estado de S.
Paulo, Iº/07/77, declaração recordada e mencionada por
Virgilio Domici, "A Criminalidade no Brasil", RJ, Forense,
1984, p.98).
...................................................................................
Em conclusão, Nabor Bulhões revela dados do
último censo penitenciário realizado pelo Ministério da
Justiça (1995), objeto de extensa matéria publicada pela
revista Veja, de 23 de outubro de 1996 (p.50).
Destaquem-se dois pontos da reportagem como síntese
da exaustão do Sistema Penitenciário do País: a
superpopulação carcerária e a incontrolável propagação
do vírus HIV (AIDS), que atinge entre 10 % e 20% dos
presos.
....................................................................................
No dia 18 de dezembro de 1999 foi realizada a
segunda audiência pública
– na verdade, nova rodada da
mesma reunião - com a participação do presidente do
Instituto Brasileiro de Ciências Penais, LICÍNIO LEAL
BARBOSA; do Presidente do Conselho de Segurança da
Região Central Norte, NELSON REMY GILLETT; da
jornalista VALÉRIA VELASCO; da Diretora do Hospital
São Francisco de Goiânia, ELIANA FROTA; do
presidente do Movimento da Paz e Justiça "Ives Ota",
MATAZAKA OTA; do presidente da Associação Paulista
de Defesa dos Direitos e das Liberdades individuais, LUIZ
AFONSO SANTOS e do presidente da ONG Reação,
ULISMIR ZANETTA VICENTE, no Plenário desta
Comissão.
9
....................................................................................
O primeiro a se manifestar foi o Sr. Licinio Leal
Barbosa, que fez um histórico da fixação da idade penal,
desde o primeiro Código Penal Republicano (1890), que
estabelecia a imputabilidade penal aos 14 anos, até a
promulgação do Código Penal, de 1940, que ampliou
essa idade para 18 anos;
O expositor fez referência ao Direito Penal
Comparado, citando vários países que adotam idade
penal em faixa etária inferior a 18 anos: França (13 anos),
Espanha (16 anos), Itália (14 anos), Alemanha (14 anos) ,
Suíça (15 anos) , Portugal (16 anos), Nicarágua (10
anos), Paraguai (15 anos), Venezuela (12 anos), Chile
(16 anos), Cuba (12 anos) e Honduras (12 anos).
Lembrou que o Código Penal Tipo para a América Latina
preconiza a responsabilidade penal aos 14 anos.
O Sr. Licinio Leal Barbosa assinalou que o tema da
imputabilidade penal foi abordado de forma objetiva no
anteprojeto do Código Penal, de 1969, elaborado pela
Comissão Revisora do Anteprojeto Nelson Hungria.
Naquela ocasião, o limite da imputabilidade foi mantido
nos 18 anos, mas permitindo-se ser imputável o menor de
16 anos a 18 anos desde que revele suficiente
desenvolvimento psíquico para entender o caráter ilícito
do fato e governar a própria conduta.
...............................................................................
Foi realizada nova audiência pública, em 24 de novembro
de 2001
– ata publicada no DCN de 04.12.2001, pp. 61779 a 61781 -, ocasião
em que se manifestaram como convidados: Aurelino Ivo Dias, advogado
goiano; Ivana Farina, Representante do Conselho Nacional de Procuradores-
Gerais de Justiça; Alberto Marino Júnior, Desembargador do Estado de São
Paulo; Marco Antônio Marques da Silva, Diretor de Assuntos Legislativos da
Associação dos Magistrados Brasileiros - AMB; Eugênio Terra, Representante
da Associação Brasileira de Magistrados e Promotores da Infância e da
Juventude; Gercino Gerson Gomes Neto, Promotor da Infância e da Juventude
em Florianópolis.
Em síntese, Aurelino Ivo Dias opinou pela admissibilidade
das PECs sustentando que, ao estabelecer o art. 5º, inciso XLVIII, da
Constituição Federal, a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de
acordo com a idade, é porque admite a mudança da idade; Ivana Farina alertou
10
que a Constituição de 1988 se centrou na proteção integral ao adolescente, e
não como infrator; Alberto Marino Júnior advertiu que não discutiria aspectos de
admissibilidade, mas, no mérito, garantiu que os menores de 16 a 18 anos
costumam assumir a autoria dos delitos, para esmaecerem a responsabilidade
dos demais integrantes da quadrilha; Marco Antônio fez uma correspondência
entre o art. 228, o Estado Democrático e a dignidade da pessoa humana, como
ícones da Constituição cidadã; Eugênio Terra discorreu sobre a tendência
mundial em elevar a idade mínima, na esteira da Convenção Internacional dos
Direitos da Criança; e, por último, Gercino Gerson reafirmou a doutrina da
proteção integral e as normas do Direito Internacional adotadas pelo Brasil.
A proposição foi a nós distribuída, na presente legislatura,
advertindo que cabe a esta Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania
pronunciar-se tão somente sobre a admissibilidade da matéria, consoante o que
dispõe o
art. 32, IV, “b”, do Regimento Interno, combinado com os artigos 201 a
203, todos do Regimento Interno.
É o relatório.
II
- VOTO DO RELATOR
Na forma regimental, cabe examinar, preliminarmente, se
a PEC nº 171, de 1993, principal, e as PECs
n°s 37, de 1995; 91, de 1995;
386, de 1996; 426, de 1996; 301, de 1996; 531, de 1997; 68, de 1999;
133, de 1999; 150, de 1999; 167, de 1999; 169, de 1999; 633, de 1999;
260, de 2000; 321, de 2001; 377, de 2001; 582, de 2002; 64, de 2003;
179, de 2003; 302, de 2004; 242, de 2004; 272, de 2004; 345, de 2004;
489, de 2005; 48, de 2007; 73, de 2007; 87, de 2007; 85, de 2007; 125,
de 2007; 399, de 2009; 57, de 2011; 223, de 2012 e 228, de 2012,
apensadas, foram apresentadas pela terça parte, no mínimo, do número de
Deputados (art. 60, I, da C.F.), o que, segundo se infere dos levantamentos
realizados pela Secretaria-Geral da Mesa, está atendido.
Por outro lado, não poderá a Constituição ser emendada
na vigência de intervenção federal, de estado de defesa ou de estado de sítio
(art. 60, § 1º, da CF), circunstâncias que, no momento, não ocorrem, eis que o
País se encontra em situação de plena normalidade político-institucional.
11
Há que considerar, ainda, que não será objeto de
deliberação a proposta de emenda à Constituição tendente a abolir (art. 60, §
1º, da CF) a forma federativa de Estado (inciso I), o voto direto, secreto,
universal e periódico (inciso II), a separação dos Poderes (inciso III), ou os
direitos e garantias individuais (inciso IV).
As propostas em apreço não agridem o denominado
núcleo duro
da Constituição Federal, exceto no que toca aos direitos e
garantias individuais, como demonstraremos adiante.
Com efeito, a opção da inimputabilidade penal ao menor
de dezoito anos feita pelo legislador constituinte originário significa o
comprometimento com a valorização da infância e da adolescência, por
reconhecer que são fases especiais do desenvolvimento do ser humano,
portanto, relacionada à dignidade da criança e do adolescente.
O texto constitucional brasileiro seguiu a tendência
internacional consagrada no art. 1º da
Convenção sobre os Direitos da Criança,
adotada pela Resolução nº 44/25 (XLIV), da Assembleia-Geral da Organização
das Nações Unidas, em 20 de novembro de 1989 e ratificada pelo Brasil por
meio do Decreto nº 99.710, de 21 de setembro de 1990, que estabelece ser
criança todo ser humano com menos de 18 anos de idade, com direito a uma
proteção especial a seu desenvolvimento físico, mental, espiritual e social,
através de uma forma de vida saudável e normal e em condições de liberdade
e dignidade.
Vê-se, pois, que, indubitavelmente, a fixação da idade
mínima de dezoito para a imputabilidade penal está intimamente ligada ao
princípio da dignidade da pessoa humana, que é um dos fundamentos do
Estado democrático de direito, conforme prevê o inciso III do art. 1º da Carta
Magna.
O princípio fundamental consagrado pelo texto
constitucional da dignidade da pessoa humana apresenta-se em dupla
concepção: em primeiro lugar, consagra um direito individual protetivo, seja em
relação ao próprio Estado ou em relação aos demais indivíduos; em segundo
lugar, estabelece verdadeiro dever jurídico de tratamento igualitário dos
próprios semelhantes.
Nesse diapasão, convém assinalar que os direitos e
garantias fundamentais não estão limitados àqueles arrolados nos incisos I a
LXXVIII do art. 5º do Diploma Excelso. Daí por que o § 2º do art. 5º explicita
12
que há outros direitos materialmente fundamentais, que não se localizam na
Constituição Federal, decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados,
bem como dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil
seja parte.
A existência de tratado internacional sobre esse tema, do
qual o Brasil seja signatário, impede também a alteração do texto
constitucional. É o que ocorre com o
Pacto de São José da Costa Rica, do qual
o Brasil é signatário e que foi transformado em legislação nacional pelo Decreto
nº 678, de 6 de novembro de 1992, o qual promulga a
Convenção Americana
sobre Direitos Humanos
, de 22 de novembro de 1989. O texto desse tratado
internacional sobre direitos humanos veda a redução da maioridade penal.
Assim, podemos afirmar que a inimputabilidade penal dos
menores de dezoitos anos contida no art. 228 da Constituição Federal encerra
hipótese de garantia individual fora do rol exemplificativo do art. 5º, visto que,
como salientado, está vinculada ao princípio da dignidade da pessoa humana.
Ademais, é um direito fundamental oriundo da Convenção Americana sobre
Direitos Humanos, da qual o Brasil faz parte.
Sobre a possibilidade de emenda constitucional para
alterar o art. 228 da Constituição Federal visando à redução da maioridade
penal, assim se manifesta o ilustre constitucionalista Alexandre de Moraes,
Professor Titular de Direito Constitucional da Universidade Presbiteriana
Mackenzie:
“Entende
-se impossível essa hipótese, por tratar-se
a inimputabilidade penal, prevista no art. 228 da
Constituição Federal, de verdadeira garantia individual da
criança e do adolescente em não serem submetidos à
persecução penal em juízo, tampouco poderem ser
responsabilizados criminalmente, com consequente
aplicação de sanção penal. Lembremo-nos, pois, de que
essa verdadeira cláusula de irresponsabilidade penal do
menor de 18 anos enquanto garantia positiva de
liberdade, igualmente transforma-se em garantia negativa
em relação ao Estado, impedindo a persecução penal em
juízo
”. 1
Em síntese conclusiva: é garantia fundamental da pessoa
humana abaixo dos 18 anos, autora de infrações penais, ser julgada,
processada e responsabilizada com base em uma legislação especial,
1
MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação infraconstitucional.
São Paulo: Atlas, 2004, p. 2092.
13
diferenciada da dos adultos, porquanto a matéria encontra-se ao abrigo das
cláusulas pétreas e dos tradados e acordos internacionais assumidos pelo
Brasil.
Ainda, por ausência de cumprimento pelo Estado, de
normas estabelecidas no ECA
– Estatuto da Criança e do Adolescente, nos
seus Artigos 3º e 4º, das políticas públicas e sociais, que devem ser
efetivamente aplicadas a esses menores, é que, não se deve emendar a nossa
Carta Magna, na tentativa de alterar o artigo 228, penalizando os menores de
dezoito anos. Além do que, no Artigo 112 e seus Incisos, do mesmo Estatuto
legal, já prevê, por prática de ato infracional por adolescentes, várias medidas
sócio-educativas, desde advertência; obrigação de reparar o dano; prestação
de serviço à comunidade; liberdade assistida; inserção em regime de
semiliberdade; internação em estabelecimento educacional, ou em qualquer
uma das medidas previstas no art. 101 do ECA. O Estado aplicando
efetivamente essas medidas sócio-educativas, qualquer menor que cometeu
um delito e se internando em estabelecimento educacional, deverá ter plena
recuperação para o convívio social e não cometerá tantos crimes.
Por fim, convém assinalar que a simples redução da idade
de responsabilidade penal, como ora se pretende, não resolveria de forma
alguma o problema da impunidade. O digno doutrinador Francisco Clávio
Saraiva Nunes, em substancioso artigo, revela que, se a idade fosse fator
positivo, os maiores de 18 anos não cometeriam crimes, quando, na verdade,
são protagonistas de mais de 90% deles.
2 Isso demonstra que a redução da
maioridade penal de 18 para 16 anos, por exemplo, não constitui, por si só, um
freio inibitório às condutas delitivas.
Alguns dos renomados juristas brasileiros, acerca da
proposta de redução da maioridade penal, manifestaram-se contrários:
O Ministro do STF, Marco Aurélio de Mello.
“A proposta não resolverá o problema no País. Temo que,
a sociedade movida por argumentos passionais, opte por uma solução, que na
sua interpretação, não contribui para efetivamente reduzir a criminalidade
”.
2
NUNES, Francisco Clávio Saraiva. Redução da maioridade penal: uma pseudo-solução. In:
LEAL, César Barros: Piedade Junior, Heitor (Orgs
.). Idade da responsabilidade penal. Belo
Horizonte: Del Rey, 2003, p. 37.
14
O Ex-Ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos.
“A redução da maioridade penal não diminuiria a
criminalidade e poderia prejudicar o amadurecimento de jovens infratores.
Pena de morte, diminuição da idade penal, prisão perpétua, nada disso
funciona. O que resolve são várias medidas, com a eficiência das polícias, e
uma reforma prisional e no Judici
ário”.
O Ex-deputado Luiz Eduardo Greenhalgh.
“O problema não é o Estatuto
, mas, sim, o seu
cumprimento pelos Governos Estaduais. Santa Catarina é o Estado que melhor
vem cumprindo a Lei 8.069/90. O índice de reincidência dos menores infratores
está em 6%. No que se refere a redução da maioridade penal, foi taxativo e
garantiu que qualquer proposta nesse sentido é inconstitucional.”
Pelas precedentes razões, por ofender a cláusula pétrea
prevista no art. 60, § 4º, IV, da Constituição Federal, bem como por violar o
princípio da dignidade da pessoa humana, insculpido no art. 1º, III, também da
Carta Política, concluímos pela
inadmissibilidade da Proposta de Emenda à
Constituição nº. 171, de 1993, principal, bem como das PECs nºs 37, de 1995;
91, de 1995; 386, de 1996; 426, de 1996; 301, de 1996; 531, de 1997; 68, de
1999; 133, de 1999; 150, de 1999; 167, de 1999; 169, de 1999; 633, de 1999;
260, de 2000; 321, de 2001; 377, de 2001; 582, de 2002; 64, de 2003; 179, de
2003; 302, de 2004; 242, de 2004; 272, de 2004; 345, de 2004; 489, de 2005;
48, de 2007; 73, de 2007; 87, de 2007; 85, de 2007; 125, de 2007; 399, de
2009; 57, de 2011; 223, de 2012 e 228, de 2012 apensadas.
Sala da Comissão, 08 de maio de 2013.
Deputado LUIZ COUTO
Relator
15
2012_2807
Nenhum comentário:
Postar um comentário