sexta-feira, 31 de maio de 2013

DIREITO A PRIVACIDADE - FOTOS INTIMAS - PUBLICAÇÃO NA INTERNET



PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro: 2013.0000041660

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0004313- 48.2009.8.26.0047, da Comarca de Assis, em que são apelantes _____ e ______, é apelado ______.

ACORDAM, em 6ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento em parte ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores EDUARDO SÁ PINTO SANDEVILLE (Presidente sem voto), PAULO ALCIDES E FRANCISCO LOUREIRO.

São Paulo, 31 de janeiro de 2013.

Percival Nogueira

RELATOR

Assinatura Eletrônica PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Voto nº 17.321

Apelação Cível nº 0004313-48.2009.8.26.0047

Comarca: Assis

Apelantes: _____

Apelada: ______

PRELIMINAR - CERCEAMENTO AO DIREITO DE DEFESA - Inocorrência - Ausência de necessidade de produção de outras provas - Inteligência do art. 330, inc. I, do CPC - Defesa processual afastada.

INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - Divulgação de fotos da autora em rede mundial de computadores sem sua autorização - Ofensa ao direito de imagem - Uso indevido e não autorizado - Indenização devida - Discussão de ambas as partes quanto ao valor arbitrado a título de danos morais - "Quantum" (R$ 20.000,00) reduzido para R$ 10.000,00, solidariamente, valor que se mostra justo e razoável para os fins almejados (punir e reeducar os infratores, sem sacrificálos em demasia, e compensar a vítima, sem enriquecê-la indevidamente) - Sentença reformada em parte – Recursos parcialmente providos.

Trata-se de recursos de apelação (fls. 296/305 e 332/341) interpostos contra a r. sentença de fls. 281/287, cujo relatório se adota, que julgou procedente a ação de indenização ajuizada por ____ em face de ___ e ___, condenando os réus, solidariamente, ao pagamento da quantia de R$ 20.000,00, a título de indenização a autora, atualizados com correção monetária pelos índices da Tabela do Tribunal de Justiça, e juros de 1% ao mês, a partir da presente data, bem como ao pagamento das custas e honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação.

Preliminarmente, alega a apelante _____, que teve sua defesa cerceada, por não ter sido apreciado seu pedido de prova pericial, consistente em se auferir de qual microcomputador partiu o primeiro e-mail rastreando, se possível, a partir dos e-mails apresentados pela apelada.

Afirma que a prova pericial era imprescindível para se comprovar a sua inocência, uma vez que o pen drive de sua propriedade ficou perdido no interior da Faculdade onde estudava por apenas três dias, mais precisamente de sexta à segunda-feira. Assim o processo deverá ser anulado para que a produção da prova pericial possa ser realizada nos autos, para depois advir novo julgamento.

No mérito, requer a reforma da r. sentença, alegando, em síntese, que o Juiz sentenciante não foi o mesmo que conduziu toda a tramitação do processo, inclusive a audiência de conciliação, instrução e julgamento. Assim, com a troca de Juízes, houve irreparáveis prejuízos para a defesa da apelante, visto que Juízo sentenciante acabou por exacerbar em sua decisão.

Assevera que o fato do co-réu ____ não ter oferecido contestação dentro do prazo legal, causou sérios e irreparáveis prejuízos à sua defesa, sendo que o fato de ter assumido a perda de seu pen drive, somente demonstra seu caráter e sua honestidade, pois, não foi a mesma quem fez sua divulgação pela Internet, visto que as fotografias tiradas pela apelada encontravam-se nele arquivadas.

Se outro o entendimento, pleiteia a redução do valor fixado a título de dano moral por afigurar-se excessivo, devendo ser arbitrado com moderação proporcionalmente ao grau de culpa, as possibilidades econômicas das partes e às suas atividades. PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

O co-apelante ____, alega que não há prova cabal do alegado compromisso entre ele e a apelada, sendo que nos autos só consta a produção de prova testemunhal e não tendo sido comprovado robustamente qualquer participação do mesmo, descabe sua condenação.

Alega que o julgamento do feito exige uma atenção redobrada, pois as provas orais foram colhidas por outro Juiz, sendo que o que veio a conduzir o processo, não às apreciou devidamente.

Argumenta que a apelada disse em depoimento pessoal que o "ajuste" fora para que as fotos fossem tiradas da cintura para cima, porém se deixou ser fotografada de corpo inteiro, fazendo até pose. Assim se houve contrato, também houve quebra por parte da apelada que anuiu com a foto de corpo inteiro.

Se outro o entendimento, também requer a redução da indenização pela metade, por se mostrar excessivo, quer pela alegada ocorrência de culpa reciproca, quer diante da condição econômica e social das partes.

Os recursos foram recebidos (fls. 345) e foram apresentadas contrarrazões (fls. 345/364).

É o relatório.

Primeiramente analiso a preliminar arguida pela apelante _____.

Não houve cerceamento defensório no caso dos autos. A prova pericial postulada pela corré para que fossem apuradas as origens das fotos, na hipótese, era absolutamente desnecessária, diante da inexistência nos autos de provas de que os arquivos foram copiados para outros equipamentos, podendo, assim, ter partido de outras fontes. Lembre-se, ademais, que o destinatário da prova é o próprio magistrado, que deve avaliar de sua pertinência ou não para a formação de seu convencimento.

Rejeitada a defesa processual, passo à análise do mérito.

A imagem é emanação da própria pessoa e, pois, de elementos visíveis que integram a personalidade humana, de caracteres físicos que individualizam a pessoa. A reprodução da imagem, consequentemente, somente pode ser autorizada pela própria pessoa, não competindo indagar se a publicação produziu ou não dano moral.

Segundo, YUSSEF SAID CAHALI, em "Dano Moral" , Editora Revista dos Tribunais, 2ª edição, pag. 541, "a divulgação de imagem de qualquer pessoa somente pode ser feita com a expressa concordância dela, sob pena de caracterização de ato ilícito, passível de indenização por danos morais, independentemente da ocorrência de lucro em favor do infrator. A vítima e prejudicada, na medida em que teve sua imagem e intimidade violadas. O prejuízo é de natureza moral, pois o dano moral não se exaure no conceito restrito de honorabilidade, mas afeta outros valores que envolvem a personalidade do ser humano".

No que se refere ao tema discutido nos presentes autos, convém mencionar, que o direito à imagem é absoluto, o que equivale a afirmar que, salvo razões de interesse público ou para a correta aplicação da justiça, não se admite que se publique, sem consentimento, retrato que reproduza a aparência física do sujeito retratado, sob pena de responder por indenizações (art. 5º, V, da Constituição Federal). PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

A exploração da imagem alheia constitui ato ilícito e fundamenta a indenização, independentemente de prejuízos concretos.

No caso vertente, é incontroversa a divulgação da imagem da autora em rede mundial de computadores sem sua autorização. Observa-se que ao réu ___ é imputado o fato de ter sido o responsável pelo convite e pela aceitação das condições impostas pela autora e a corré ____é imputado o fato de ter ficado com a guarda do dispositivo que armazenou as imagens que foram extraviadas para a internet.

O apelante ____ não contestou os fatos que lhe foram atribuídos, impondo-se a presunção da veracidade do alegado, não se aplicando o disposto no art. 320, I da lei processual, como bem observado pelo Juízo a quo.

Destarte, embora haja a tentativa de justificar a publicação da imagem da autora, tal tese deve ser rechaçada, na medida em que ficou absolutamente claro que "as fotografias tiradas da autora foram arquivadas no 'pen drive' da ré ____, que por sua vez perdeu referido dispositivo eletrônico contendo aqueles arquivos, e que foram divulgados na internet" .

Quanto ao corréu ____, também está presente sua culpa " visto que ao se comprometer com a autora quanto à realização do trabalho, obrigou-se na forma combinada, sendo de sua responsabilidade os cuidados necessários ao integral cumprimento da avença, com a adequada conservação do material".

A autora faz jus à indenização por uso indevido de suas imagens-retrato, ressaltando-se, por oportuno, que em se tratando de indenização decorrente de uso indevido da imagem, não há necessidade da prova do prejuízo, já que o dano moral ocorre in re ipsa. Assim, devido a falta de cautela dos réus a apelada atingiu seu direito à inviolabilidade de imagem, assegurado constitucionalmente pela Carta Magna (art. 5º, X, da Constituição Federal).

E, pelo uso indevido da imagem deve ser indenizada, conforme precedentes desta própria A. 6ª Câmara: ApCív nº 376.863-4/0-00, Comarca: Ribeirão Preto, Rel. Des. Sebastião Carlos Garcia, j. 17.09.2009, v.u.; e outras por mim relatadas: ApCív nº 236.618.4/1-00, Comarca: Catanduva, v.u., julg. 15.12.2005; ApCív nº 377.970.4/6-00, Comarca: Guariba, j. 11.02.2010, m.v.; ApCív nº 381.187.4/7-00, Comarca: Guariba, j. 21.05.2009, v.u. Confira-se jurisprudência nessa direção:

" RESPONSABILIDADE CIVIL - Indenização por danos morais - Uso indevido de imagem - Publicação de fotografia em revista dedicada ao público masculino com conteúdo predominantemente erótico (Revista Sexy), sem autorização expressa da autora, que era menor à época da publicação da revista - Autorização para publicação da imagem que se fazia mister de modo expresso - Patente a violação da imagem, direito assegurado constitucionalmente, que impõe a obrigação de indenizar - Dano moral configurado - Verba fixada adequadamente - Sentença de procedência mantida" (ApCiv nº 994.03.110204-8 - Comarca: São Paulo - 2ª Câmara de Direito Privado - Rel. Des. Neves Amorim, j. 22.01.2011 - v.u.);

" INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. Veiculação de fotografias da apelada nua. Ausência de autorização expressa para a publicação em revista para o público masculino. Devido processo legal observado. Desnecessidade de outras provas. Procedimento inadequado da recorrente afrontou a manifestação da vontade da recorrida. Danos morais caracterizados. Redução da verba reparatória em observância às peculiaridades da demanda. Sucumbência condizente com a complexidade da lide. Apelo desprovido" (ApCív nº 994.09.302.177-6 - Comarca: São Paulo - 4ª Câmara de Direito Privado - Rel. Des. Natan Zelinschi de Arruda - j. 10.02.11, v.u.);
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

" INDENIZAÇÃO - DANO MORAL – Autora fotografada em clube de swing, sem a devida autorização - Dever de indenizar - Com publicação pela editora ré - Dano verificado - Quanto da indenização, contudo, reduzido - Recurso da ré parcialmente acolhido" (ApCív nº 335.416-4/1 - Comarca: São Paulo - 4ª Câmara de Direito Privado - Rel. Des. Jacobina Rabello - j. 10.07.2008 - v.u.).

Diante de tal situação, cabe agora, analisar o quantum arbitrado, apreciando ambos os recursos. O valor da indenização deve ser aferido, caso a caso, segundo as repercussões negativas causadas com a indevida inscrição do nome do prejudicado nos órgãos de proteção ao crédito.

Sabe-se que a estipulação do montante deve ser proporcional a dor causada.

Também deve se ater aos critérios de proporcionalidade e razoabilidade, a fim de não causar enriquecimento sem causa à vítima e, também, não ocasionar a ruína financeira do causador do evento danoso.

Assim, analisada a situação e à míngua de critérios estabelecidos em lei para a fixação do quantum debeatur (a liquidação do dano moral no direito pátrio não é tarifada), no caso concreto, reputo cabível a redução para a quantia equivalente a R$ 10.000,00, solidariamente, valor que se mostra mais justo e razoável para os fins almejados e acima aludidos (punir e reeducar os infratores, sem sacrificá-los em demasia, e compensar a vítima, sem enriquecê-la indevidamente), incidindo a correção monetária a partir do acórdão (Súmula nº 362 do STJ) e os juros de mora, na proporção de 1% (um por cento) ao mês, desde a citação.

Portanto, pelo exposto, meu voto é por se dar parcial provimento aos apelos, para, reformando em par te a sentença, reduzir a indenização ao valor solidário de R$ 10.000,00 (dez mil reais), atualizado monetariamente a partir do acórdão e acrescido de juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês desde a citação.

JOSÉ PERCIVAL ALBANO NOGUEIRA JÚNIOR

Relator

(assinatura eletrônica)

Nenhum comentário:

Postar um comentário