1ª Vara
da Fazenda e Autarquias de Belo Horizonte/MG
Gabinete
do Juiz Geraldo Claret de Arantes
PROCESSO
N. 0024.12.129.593-5
IMPETRANTE:
ROBERTA VIEIRA SARAIVA
IMPETRADOS:
DIRETOR DE PREVIDÊNCIA e do PRESIDENTE DO INSTITUTO DE
PREVIDÊNCIA
DOS SERVIDORES PÚBLICOS DO ESTADO DE MINAS GERAIS - IPSEMG
NATUREZA:
MANDADO DE SEGURANÇA
SENTENÇA
Vistos,
etc.,
ROBERTA
VIEIRA SARAIVA, qualificada e devidamente representada nos autos, impetra
mandado
de
segurança contra ato do DIRETOR DE PREVIDÊNCIA e do PRESIDENTE DO INSTITUTO DE
PREVIDÊNCIA
DOS SERVIDORES PÚBLICOS DO ESTADO DE MINAS GERAIS - IPSEMG, no
qual
aduz que:
a) é
beneficiária da pensão por morte do Sr. Querino Saraiva Nobre, falecido em
21/07/2004, quando
ocupava
o cargo de Oficial do Registro Civil das Pessoas Naturais e Interdições e
Tutelas da
Comarca
de Coração de Jesus - MG;
b) com
a morte do ex-servidor, foi requerida junto ao IPSEMG, a devida pensão por
morte. Tal
benefício
previdenciário foi deferido em favorda impetrante, que recebe atualmente o
valor de
R$2.575,71
(dois mil quinhentos e setenta e cinco reais e setenta e um centavos);
c) a
pensão tem sido paga a menor, quando deveria ser calculada pelas regras
constantes do artigo
40,
§7º, I da CR/88.
Requereu,
em sede de liminar, a determinação para que a autoridade coatora pague a pensão
por
morte a
que faz jus na integralidade, no valor de R$ 4.827,90 (quatro mil oitocentos e
vinte e sete
reais e
noventa centavos).
À
inicial foram acostados os documentos de folhas 10 a 23.
Em
decisão de f.35/38foi indeferida a antecipação de tutela.
Devidamente
notificadas,, as autoridades apontadas como coatoras prestaram informações às
f.43/49
e 50/57. alegando, em síntese, a ausência de direito à paridade para as pensões
cujo fato
gerador
tenha ocorrido a partir da vigência da Emenda Constitucional nº 41/2003.
Às f.
89/97 o Ministério Público emitiu parecer, opinando pela denegação da
segurança.
É o
relatório. DECIDO.
Ab
initio, é cediço que a ação mandamental é um dos remédios constitucionais mais
importantes do
nosso
ordenamento jurídico, que tem por escopo a correção de ato ou omissão,
manifestamente
ilegal,
de autoridade pública que viole direito líquido e certo da pessoa física ou
jurídica.
Tal
entendimento pode ser extraído do art. 5º, LXIX, de nossa Magna Carta: “conceder-se-á
mandado
de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por
"habeas-corpus" ou
"habeas-data",
quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública
ou
agente
de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público.”
Pleiteia
a autora o recebimento da totalidade da pensão por morte a que faz jus, tendo
em vista que
o valor
pago pelo IPSEMG está desatualizado.
Conforme
se depreende dos documentos colacionados, o valor que o instituidor da pensão
receberia,
se vivo
estivesse, não corresponde ao importe efetivamente pago à pensionista.
Nesse
passo, o valor atualizado dos vencimentos do ex-servidor perfaz o montante de
R$ 4.827,90
(quatro
mil oitocentos e vinte e sete reais e noventa centavos).
Breve
consideração sobre o regime contratual dos servidores públicos, à luz da
Constituição Federal
de
1988:
Segundo
o artigo 37 da Constituição Federal, os servidores públicos da administração
publica direta
ou
indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e
dos Municípios são
investidos
no cargo mediante a aprovação em concurso de provas e títulos, mediante as
condições
estabelecidas
previamente no edital do certame.
O
edital é a lei que regula a aprovação para a investidura no cargo, portanto, e
a investidura agrega
ao
servidor direitos e deveres que existem na época do fato, ou seja, da
contratação de uma pessoa
física
com o Estado, para a prestação de serviços certos e determinados, mediante
contraprestação
previamente
estabelecida.
O(a)
cidadão(ã), ao escolher os rumos de sua vida profissional, exercendo a
liberdade assegurada
na
Constituição Federal, leva em conta as diversas particularidades dos caminhos
que a sociedade
livre e
democrática se lhe oferece, como a atividade empresarial, o emprego na esfera
privada e a
carreira
publica.
Pesadas
as características, as vantagens e desvantagens de cada atividade laborativa,
levará em
conta a
remuneração, os benefícios sociais e trabalhistas, o lucro derivado do capital,
iniciativa e
risco,
as possibilidades de aposentadoria e seguro social, as condições de pensão para
os
dependentes,
através da seguridade social privada, publica ou complementar, e todas as
demais
implicações
que cada área da atividade laborativa humana oferece.
Ao
optar por concorrer, segundo as normas do edital de regência do certame para a
admissão ao
serviço
publico, o cidadão terá analisado e comparado as vantagens e desvantagens, as
condições,
encargos,
termos, remuneração e regime de aposentadoria e pensão da administração
publica, nos
termos
do artigo 37 da Constituição Publica, e aceita se submeter às regras vigentes
na época da
investidura
no cargo.
Após a
promulgação da Constituição Federal de 1988, entretanto, parte da doutrina e da
jurisprudência
pátrias passou a desprezar o artigo 5º, inciso XXXVI da Carta Magna, ao criar
uma
figura
inexistente no texto da norma constitucional, denominando-a de expectativa de
direito, para
derrogar
a norma constitucional que trata do direito adquirido, este protegido expressa
e claramente
pela
citada norma constitucional.
A
construção jurisprudencial e doutrinaria, data vênia, vem desconsiderando a segurança
juridica, em
nome do
medieval fato do príncipe, ou seja, a conveniência de cada administração
publica, que se
sobrepões
à garantia dos direitos individuais, também garantido pela Constituição
Federal.
A
expectativa de direito se dá quando alguém se submete a um certame publico para
investidura no
cargo,
do qual saíra vencedor ou não, segundo as regras do edital. Trata-se de mera
expectavia.
Todavia,
uma vez aprovado no concurso publico a que se submeteu, e investido no cargo,
não há
mais a
expectativa de direito, e sim direito adquirido, mediante condição e termo,
segundo as
condições
do contrato celebrado agregando-se imediatamente todos os direitos e obrigações
vigentes
na época da investidura.
Não há
como se continuar a admitir que, pelo fato do príncipe, o direito adquirido
mediante condição
e termo
à época da investudura, os direitos do servidor publico sejam modificados para
pior,
confiscando
seus direitos garantidos expressamente pela Constituição Federal.
Assim é
que à data do certame publico, se o regime de aposentadoria e de pensão do
servidor prevê
que,
mediante a condição e o termo (contribuição e idade ou morte, por exemplo)
atingidos através
do
direito adquirido na investidura, prevê as condições para os benefícios, são
tais condições que
regerão
o contrato entre o Estado e o cidadão, não podendo o Estado, a seu livre
convencimento e
suposta
conveniência, alterar e confiscar os direitos do servidor, como vem acontecendo
cada vez
mai
agressivamente no pais, especialmente em relação aos direitos à aposentadoria e
à pensão,
repita-se,
adquiridos nos termos e condições da época da investidura.
Não
pode haver revisão unilateral - por parte do Estado – para atingir direito
individual adquirido
mediante
certame publico, quanto mais para confiscar propriedade privada (o direito à
aposentadoria
e
pensão), o que absurdamente vem acontecendo no país, com a maior naturalidade,
como se
vivêssemos
em um estado feudal.
A
Constituição Federal vem sendo violada sistematicamente em detrimento dos
direitos individuais,
em
favor do Estado opressor e confiscante, com o beneplácito e aval dos Poderes
Constituídos.
Assim,
há que se repelir a construção bizarra da chamada “expectativa de direito”,
inexistente na
norma
constitucional, para se garantir o direito adquirido mediante condição e termo,
este sim,
garantido
pela Constituição Federal.
Assim,
é de se declarar, como se declara no caso concreto, que a aposentadoria e a
pensão de
servidores
públicos regem-se exclusivamente pelas normas da época da investidura,
atingidos as
condições
e termos da época e das leis de regencia da época, vetado, por imperativo
constitucional,
o
confisco estatal dos direitos patrimoniais dos servidores de quaisquer dos
Poderes da União.
No
presente caso, o direito da autora à percepção do benefício previdenciário deve
ser analisado à
luz do
art. 40, § 7º, inciso I, da Constituição Federal, com a nova redação que lhe
deu a Emenda
Constitucional
n. 41, de 2003, in verbis:
Art.
40. (omissis)
§ 7º.
Lei disporá sobre a concessão do benefício de pensão por morte, que será igual:
I - ao
valor da totalidade dos proventos do servidor falecido, até o limite máximo
estabelecido para os
benefícios
do regime geral de previdência social de que trata o art. 201, acrescido de
setenta por
cento
da parcela excedente a este limite, caso aposentado à data do óbito (...).
Pela
leitura do excerto acima,verifica-se que o benefício da pensão da impetrante
não foi
devidamente
atualizado, porquanto o § 7º do art. 40 tem aplicabilidade imediata, visto que
não exige
a
elaboração de leis para complementar seu alcance e sentido, uma vez que já se
apresenta
suficientemente
explícito na definição do interesse por ele regulado.
O
constitucionalista Alexandre de Moraes, em sua obra, Direito Constitucional,
expõe, citando José
Afonso
da Silva, a seguinte definição de normas constitucionais de eficácia plena:
Aquelas
que, desde a entrada em vigor da Constituição, produzem, ou têm possibilidade
de produzir,
todos
os efeitos essenciais, relativamente aos interesses, comportamentos e
situações, que o
legislador
constituinte, direta e indiretamente, quis regular.
Cumpre
esclarecer que com a vigência da Emenda Constitucional nº 41, considerável
parcela da
jurisprudência
não aplica mais a paridade para o cálculo do benefício da pensão, levando-se em
conta
que o novo critério de reajustamento a ser aplicado é o previsto no §8º do
artigo 40, ou seja, ''é
assegurado
o reajustamento dos benefícios para preservar-lhes, em caráter permanente, o
valor real,
conforme
critérios estabelecidos em lei''.
Lado
outro, a despeito do posicionamento majoritário, entendo que a referida emenda
não está em
consonância
com os preceitos da Constituição 1988.
É
notório que nos últimos tempos a Constituição Federal vem sendo alvo de
sucessivas modificações
sob as
mais dispares justificativas e ao labor das conveniências conjunturais.
Tal
desiderato vem se perpetrando mediante emendas à Constituição, que retratam
verdadeira
violência
aos direitos do cidadão e um desrespeito inominável à vontade do legislador
constituinte
originário.
A seu
turno, a Emenda de número 41 acabou por subtrair direitos adquiridos, inerentes
à
irredutibilidade
dos proventos, vencimentos dos servidores públicos e subsídios dos agentes
políticos
aposentados
ou não, direitos protegidos por cláusulas pétreas das quais o legislador
constituinte
derivado
anda a fazer tábula rasa.
Nesse
ínterim, a proposta de emenda tendente a abolir os direitos e garantias
individuais está
expressamente
vedada pelo art. 60 da CF, in verbis:
Art.
60.-
(...)
§ 4º -
Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
I - a
forma federativa de Estado;
II - o
voto direto, secreto, universal e periódico;
III - a
separação dos Poderes;
IV - os
direitos e garantias individuais.(grifei)
No caso
em apreço constata-se que referida emenda acabou por atentar contra o núcleo
intangível
dos
direitos fundamentais, consignados no art. 40, §8º da Constituição.
Tal
dispositivo conferia a garantia ao servidor de que os proventos de
aposentadoria e pensões
seriam
revistos na mesma proporção e na mesma data, sempre que se modificasse a
remuneração
dos
servidores em atividade.
Como já
asseverado acima, é assente que todo cidadão, ao fazer suas escolhas
profissionais
avaliam
as condições daquele momento, planejando minimamente como e com o que serão
amparados
na velhice, bem como as condições em que serão deixados seus filhos, cônjuge e
demais
parentes em caso de eventual morte.
Não se
pode olvidar que ao ingressar nos quadros da Administração Pública, os
servidores pautamse
nos
vencimentos assegurados segundo os ditames constitucionais, bem como na certeza
do
quantum
receberão quando da aposentadoria ou do que será deixado aos dependentes.
É
inaceitável qualquer mudança passível a reverter o status quo ante do
indivíduo, pegando-o
desprevenido
ao descobrir que de um dia para outro perdeu o direito que acreditava ter.
Trata-se
não somente de uma violação ao princípio da segurança jurídica, mas em
flagrante
desrespeito
à dignidade da pessoa humana.
As
alterações ao alvedrio dos caprichos do príncipe deixaram de ser aceitas desde
o fim da |Idade
Média,
estando em total descompasso com o atual Estado Democrático de Direito, o qual
traz
consigo
a necessidade de um mínimo de segurança jurídica, com sua manutenção abrangida
pelo
princípio
da confiança, não só contra medidas retroativas, mas também com as de cunho de
retrocesso.
Ora,
perpetrando-se este comportamento não existirá mais segurança em relação a
absolutamente
nada,
tendo em vista que a qualquer momento serão alteradas as regras do jogo e, por
conseguinte,
as
pessoas participantes serão lançadas a própria sorte.
Com
efeito, devem ser resguardadas as garantias existentes no momento da referida
escolha,
afigurando
desarrazoado qualquer “fato do príncipe” que desconstitua um direito adquirido.
Manifestando-se
a esse respeito, assim deliberou o Plenário do Colendo Supremo Tribunal
Federal,
no
julgamento da ADI nº 2.075 MC/RJ (D. J. de 27.6.2003, Seção 1, pág. 28):
“A
garantia constitucional da irredutibilidade do estipêndio funcional traduz
conquista jurídico-social
outorgada,
pela Constituição da República, a todos os servidores públicos (CF, art. 37,
XV), em
ordem a
dispensar-lhes especial proteção de caráter financeiro contra eventuais ações
arbitrárias do
Estado.
Essa qualificada tutela de ordem jurídica impede que o Poder Público adote
medidas que
importem,
especialmente quando implementadas no plano infraconstitucional, em diminuição
do valor
nominal
concernente ao estipêndio devido aos agentes públicos.
Segundo
a abalizada cátedra de JOSÉ AFONSO DA SILVA, a garantia atinente à
irredutibilidade de
vencimentos
“significa que nem o padrão, nem os adicionais ou outras vantagens fixas
poderão ser
reduzidos”.
Noutro
norte, mesmo que não se admita a tese da afronta às garantias fundamentais,
verifica-se que
ainda
sim afigura-se líquido e certo o direito da impetrante.
É que,
no caso concreto dos autos, há que ser exercido o controle difuso da
constitucionalidade da
EC
41/2003.
Ensina
Alexandre de Morais:
"O respeito ao devido processo legislativo na elaboração
das espécies normativas é um dogma
corolário à observância do princípio da legalidade, consagrado
constitucionalmente, uma vez que
ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa,
senão em virtude de espécie
normativa devidamente elaborada pelo Poder competente, segundo
as normas de processo
legislativo constitucional. O desrespeito às normas de processo
legislativo constitucionalmente
previstas acarretará a inconstitucionalidade formal da lei ou
ato normativo produzido, possibilitando
pleno controle repressivo de constitucionalidade por parte do
Poder Judiciário, tanto pelo método
difuso quanto pelo método concentrado"
Isso
porque, com o julgamento da Ação Penal 470, conhecida como o “caso mensalão”,
em trâmite
no
Supremo Tribunal Federal, suscitou-se a problemática da compra de votos no
Congresso
Nacional.
Em meio
ao contexto, também foi lançado ao espectro dos holofotes o questionamento
acerca da
validade
da votação da Emenda Constitucional 41 de 2003, que ensejou a malfadada “Reforma
da
Previdência”.
O
Ministro relator da referida Ação Penal 470, Joaquim Barbosa, em voto
historico, sustentou com
veemência
que houve compra de apoio político e de votos no Congresso Nacional entre 2003
e
2004,
num esquema organizado pelo PT para ampliar a base de apoio ao governo da
época, no
parlamento
nacional.
Nesse
diapasão, consignou o eminente ministro que a votação da Emenda 41 de 2003 foi
fruto da
aprovação
dos parlamentares que se venderam, culminando na redução de direitos
previdenciários
de
servidores e a privatização de parte do sistema público de seguridade.
A tese
do eminente Ministro Joaquim Barbosa foi seguida pela maioria dos demais
Ministros do E.
STF, ou
seja, de que a EC 41/2003 foi fruto não da vontade popular representada pelos
parlamentares,
mas da compra de tais votos, mediante paga em dinheiro para a aprovação no
parlamento
da referida emenda constitucional que, por sua vez, destrói o sistema de
garantias
fundamentais
do estado democrático de direito.
Pela
via se consequência, a jurisdição emanada do Ministro Joaquim Barbosa e e
demais ministros,
por maioria,
declaram que o pagamento em dinheiro resultou na aprovação da EC 41/2003, a
maculando
de forma irreversível, tornando-a invalida ex tunc, ante o vicio de decoro.
Neste
prisma, não sobejam dúvidas de que a atividade constituinte derivada padece de vício
de
decoro
parlamentar, revestindo a emenda em exame da inconstitucionalidade absoluta..
Impende
destacar, por oportuno, que as normas do processo legislativo constitucional,
prevista nos
artigos
59 a 69 da Constituição possuem eficácia plena e imediata, vinculando a
atividade do
legislador
na elaboração das diversas espécies normativas.
No caso
em espeque trata-se do chamado “vício de decoro parlamentar”, vedado
expressamente no
art. 55, §1º da CF, in verbis:
Art.
55.
§ 1º -
É incompatível com o decoro parlamentar, além dos casos definidos no regimento
interno, o
abuso
das prerrogativas asseguradas a membro do Congresso Nacional ou a percepção de
vantagens
indevidas.”
A
inconstitucionalidade advinda do vício de decoro resulta diretamente da mácula
que teria envolvido
o voto
que constitui, em suma, o sagrado valor de representação popular conferida pelo
povo que se
faz
assim representar pelo parlamentar corrompido, ferindo o que consta do artigo
1º, inciso I da
Constituição
Federal, que estabelece como ilar do Esado Democrático de Direito a soberania
popular,
neste caso, violada dramaticamente pela venda de votos no parlamento que a
representaria.
Advirta-se
que a inobservância dos esquemas rituais rigidamente impostos pela Carta Magna
da
República
gera a invalidade formal dos atos legislativos editados pelo Poder Legislativo
e permite
que
sobre essa eminente atividade jurídica do parlamento possa instaurar-se o
controle jurisdicional.
A
Resolução 20/1993, o Código de Etica e Decoro Parlamentar estabelece as regras
do decoro
parlamentar,
especialmente em seus artigos 4º, inciso III e 5º, incisos II e III, o que é
exatamente o
caso
dos autos, ou seja, o recebimento de dinheiro por parlamentares em troca da
violação da
soberania
popular, alterando a livre consciência de votos.
Qualquer
juiz ou tribunal possui competência para exercer o controle difuso ou
incidental da
constitucionalidade
ao apreciar, incidentalmente, de ofício ou mediante provocação da parte questão
relacionada
com a constitucionalidade ou inconstitucionalidade da lei ou do ato normativo.
Assim,
dado o múnus fiscalizador desse juízo monocrático, o controle difuso da
constitucionalidade
da
Emenda Constitucional 41/03 é plenamente cabível em face do nosso ordenamento
jurídico.
O Poder
Judiciário tem competência para a apreciação acerca da higidez no processo
legislativo,
tanto
no que tange à ilegalidade quanto à inconstitucionalidade dos procedimentos
referentes àquele,
não se
cogitando qualquer violação ao princípio da harmonia entre os Poderes.
A par
dos limites impostos ao Poder Constituinte derivado, o Supremo Tribunal
Federal, no
julgamento
da ADI nº 466/DF, em que foi Relator o eminente Ministro Celso de Mello (RTJ
136/26),
fez a
seguinte advertência:
“O
Congresso Nacional, no exercício de sua atividade constituinte derivada e no
desempenho de sua
função
reformadora, está juridicamente subordinado à decisão do poder constituinte
originário que, a
par de
restrições de ordem circunstancial, inibitórias do poder reformador (CF, art.
60, § 1º),
identificou,
em nosso sistema constitucional, um núcleo temático intangível e imune à ação
revisora
da
instituição parlamentar. As limitações materiais explicitas, definidas no § 4º
do art. 60 da
Constituição
da República, incidem diretamente sobre o poder de reforma conferido ao Poder
Legislativo
da União, inibindo-lhe o exercício nos pontos ali discriminados. A
irreformabilidade desse
núcleo
temático, acaso desrespeitada, pode legitimar o controle normativo abstrato, e
mesmo a
fiscalização
jurisdicional concreta, de constitucionalidade”.(grifei)
No
Direito Penal, é da jurisprudência o uso da teoria dos “frutos da arvore
envenenada”, ou “fruits of
the
poisonous tree”, para refugar provas que advenham de métodos ilicitos em sua
coleta. Ou seja, o
que
deriva do ilícito, também o é. Tal tese é recepcionada fartamente pela
jurisprudencia brasileira, e
nada
obsta que, subsidiariamente e complementarmente, tal teoria seja utilizada
para, no caso em
julgamento,
seja declarado que a EC41/2003 é fruto da arvore envenenada pela corrupção da
livre
vontade
dos parlamentares, ferindo a soberania polular, em troca de dinheiro. Feitas as
devidas
considerações,
manifesto é o direito da autora em receber integralmente a pensão por morte,
não
devendo
prevalecer os ditames insertos na Emenda Constitucional 41 de 2003, eis que a
mesma é
declarada,
no caso concreto, em exercício do controle difuso da constitucionalidade,
inconstitucional,
assim
como todas as normas que alterem os direitos adquiridos em investidura de
cargos públicos,
alcançados
as condições e termos existentes na época da investidura.
CONCLUSÃO
Ante
todo o exposto, CONCEDO a segurança, e exercendo o controledifuso da constitucionalidade,
no caso
concreto, declarando inconstitucional, por vicio de decoro a EC 41/2003 e todas
as
alterações,
constitucionais ou não, que confisquem direitos adquiridos pelo servidor
publico,
mediante
condição e termo da épocada investidura, e para condenar as autoridades
coatoras a
procederem
o pagamento, à autora, da pensão no valor integral, correspondente hoje a R$
4.801,64
(quatro
mil, oitocentos e um reais e sessenta e quatro centavos), com efeito ex tunc,
ou seja, do fato
gerador
do beneficio, com as correções devidas e com juros de meio por cento ao mês,
desde a data
de cada
pagamento confiscado;
Custas,
na forma da lei.
Sem
condenação em honorários, porquanto incabível em sede de mandado de segurança,
nos termo
da
Súmula 105 do Superior Tribunal de Justiça e 512 do Supremo Tribunal Federal.
Publique-se.
Registre-se. Intimem-se.
Belo
Horizonte, 03 de outubro de 2012.
GERALDO
CLARET DE ARANTES
JUIZ DE DIREITO
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